A recente poda de árvores no Parque Alim Pedro, no bairro IAPI, zona norte de Porto Alegre, abriu um debate que vai além da manutenção das áreas verdes. Para a comunidade, o episódio representa um alerta sobre a forma como os espaços públicos, especialmente as praças e parques de bairro, são cuidados e administrados.
O Alim Pedro é mais do que um conjunto de árvores e gramados. É onde moradores se encontram para caminhar, praticar esportes, descansar, colher frutas ou simplesmente estar em contato com a natureza em meio à cidade. A estudante da área ambiental Sandra Tauní Midã explica que o parque “faz parte de um corredor ecológico interrompido, com a Praça Chopin, reúne esportistas, promove encontros sociais, oxigena a cidade e todo este histórico bairro”. Para ela, o espaço cumpre papel fundamental tanto no equilíbrio ambiental quanto na vida social.

A forma como a poda foi feita, porém, deixou marcas visíveis e emocionais. Os moradores relatam que os galhos mais baixos das árvores frutíferas foram retirados, o que impediu a colheita que faz parte da rotina de quem frequenta o parque. Flávia da Silva Mariani, nascida e criada no IAPI, descreve que “eles tiraram toda a parte baixa das árvores para que nenhuma pessoa consiga colher os frutos e deixaram as copas das árvores frutíferas só para cima”.
O comentário encontra eco na fala de Virgínia Maria Godoy, que acompanhava a frutificação. “A comunidade que frequenta o parque diariamente estava contando os dias para comer os frutos, mas os galhos saudáveis baixos foram todos cortados, ficando as copas muito altas.”
O impacto dessa ação aparentemente simples foi sentido por quem aguardava a colheita das frutas como parte da relação cotidiana com o espaço. “O sentimento da moradora de ter esperado o ano inteiro para comer as frutas e agora não vai conseguir comer… isso mexeu com a comunidade”, resume Mariani, que descreve o que chamou de frustração: “os galhos não estavam atrapalhando. Eles estavam numa altura boa que você podia puxar o galho, arrancar as frutinhas e comer. A gente ia conseguir comer aquelas ameixinhas. Agora não tem como pegar”.

Além da perda do contato direto com as árvores, houve críticas sobre a técnica utilizada. Mariani afirma que galhos floridos foram cortados sem necessidade, e Tauní Midã complementa que “muitos profissionais e estudiosos consultados atestam ter sido algo radical, com uso não de tesouras de poda, mas de motosserras e roçadeiras, muito agressivas para frutíferas em produção”.
Segundo os moradores, a execução foi realizada por trabalhadores de um projeto de ressocialização, sem a devida formação técnica, o que teria ampliado os danos. “São pessoas que não têm a devida instrução. Chegam ali, limpam tudo, sem nenhuma capacitação, sem nenhuma orientação do que tirar e como tirar”, relata Mariani.

Mesmo diante das críticas, os moradores deixam claro que não se opõem às podas, desde que sejam feitas de forma correta e planejada. Mara Silveira, também integrante da comunidade, observa que “referente às podas, só para deixar bem claro, não sou contra, deve-se fazer, mas corretamente. Há períodos propícios para tal. E faz muito tempo que há mutilações de árvores não somente em nosso bairro como nos demais”.
O debate trouxe à tona uma preocupação mais ampla: o risco de descaracterização do parque. Mariani aponta que existe a previsão de um projeto da prefeitura para construir arquibancadas em uma área do Alim Pedro, o que exigiria a derrubada de árvores. Para ela, “se a gente não se mobiliza, coisas piores podem acontecer. A prefeitura tem projeto para, na parte alta do parque, derrubar as árvores para fazer arquibancadas. Se a gente deixar, coisas piores vão acontecer ali”.

A mobilização, nesse sentido, não é apenas uma reação à poda, mas um movimento preventivo para garantir que o espaço continue cumprindo seu papel coletivo. A comunidade busca demonstrar que está atenta e deseja preservar o parque como espaço público de convivência. Para Sandra Midã, essa é uma questão de participação nas decisões sobre a cidade: “na modernidade que funciona, se constrói juntos, decisões que envolvem o coletivo”.
A discussão em torno do Parque Alim Pedro se soma a um debate mais amplo sobre as praças e áreas verdes urbanas, que muitas vezes concentram as tensões entre manutenção, uso comunitário e interesses de projetos de reurbanização. No caso do IAPI, o episódio revela como a comunidade valoriza o espaço e vê nele não apenas um ponto de lazer, mas um patrimônio coletivo que precisa ser preservado.

A reportagem solicitou posicionamento da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) e da Prefeitura de Porto Alegre sobre os procedimentos de poda e eventuais projetos para a área, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição. O espaço permanece aberto.