Os ex-militares Rubens Gomes Carneiro e Antonio Waneir Pinheiro Lima, que atuavam no Centro de Informações do Exército, foram condenados por graves violações aos direitos humanos durante a ditadura militar. A sentença foi emitida pela 1ª Vara Federal de Petrópolis no dia 1º de setembro.
Ambos foram responsáveis pelo sequestro, tortura e desaparecimento forçado de Paulo de Tarso Celestino da Silva, advogado e ex-dirigente da Aliança Libertadora Nacional (ALN). Os crimes ocorreram em 1971, na Casa da Morte, aparelho clandestino da ditadura localizado em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro.
No texto da sentença, o juiz Reili de Oliveira Sampaio afirma que “restou comprovada a atuação dos agentes para a tortura e morte da vítima (entre outras), tendo sido os próprios que a conduziram à casa, realizaram os atos de tortura e deram causa ao seu óbito. A conduta dos réus foi determinante para o resultado danoso, pois sequestraram, torturaram e provocaram a morte da citada vítima”.
Tarso foi capturado pelos militares em julho de 1971. Antes de ser entregue à Casa da Morte, ele foi levado ao Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Na história de brutalidades da Casa da Morte, há registros de uma única sobrevivente: Inês Etienne Romeu, ex-militante e dirigente das organizações Vanguarda Armada Revolucionária – Palmares (VAR-Palmares) e Organização Revolucionária Marxista Política Operária (Polop). O depoimento dela é essencial no caso de Tarso. Ela relata ter escutado as súplicas do advogado, submetido a mais de 30 horas de tortura. Depois disso, ele nunca mais foi visto.
Sem anistia para os torturadores
Com a decisão da Justiça, os réus devem ressarcir à União o valor aproximado de R$ 110 mil, pago à família de Paulo de Tarso como indenização. Os ex-militares também deverão pagar indenização por danos morais coletivos, a ser revertida ao Fundo de Direitos Difusos.
Além da responsabilização dos agentes, a União foi condenada a apresentar um pedido formal de desculpas à população brasileira, com menção ao caso de Paulo de Tarso. O pedido deverá ser divulgado em veículos de grande circulação e em canais oficiais do governo.
Na sentença, o juiz destaca, ainda, que a Lei da Anistia (Lei nº 6.683/79) não pode ser usada para impedir a responsabilização cível de crimes contra a humanidade, considerados imprescritíveis pelo Direito Internacional.
A procuradora da República Vanessa Seguezzi, que ajuizou a ação, afirma que a decisão tem valor simbólico e pedagógico. “É um passo fundamental para que crimes dessa gravidade jamais se repitam”, diz.
Seguezzi acrescenta que a decisão reforça a impossibilidade de se usar a Lei da Anistia para justificar a impunidade de agentes que cometeram crimes graves em nome do Estado.
A sentença responde a uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF). A decisão é passível de recurso.
A Casa da Morte
A Casa da Morte foi utilizada pelo Centro de Informações do Exército (CIE) como aparelho clandestino de tortura durante o período do regime militar e foi localizada por Inês Etienne Romeu, única prisioneira política a sair viva da casa, conforme declarações prestadas ao Conselho Federal da OAB.
O imóvel foi emprestado ao Exército pelo então proprietário Mário Lodders e, segundo o tenente-coronel reformado Paulo Malhães, em depoimento prestado à Comissão da Verdade do Estado do Rio de Janeiro, o local foi criado para pressionar os presos a mudarem de lado, com o objetivo de torná-los informantes infiltrados. Por ali passaram diversos militantes políticos, que permanecem desaparecidos.