Santa Maria sediou o Congresso da União Estadual dos Estudantes (UEE) do Rio Grande do Sul, que teve como tema “Em defesa da educação, por um Brasil soberano” entre os dias 5 e 7 de setembro. No painel “O papel da comunicação: as big techs e a disputa das redes sociais para um Brasil soberano”, lideranças estudantis, acadêmicos e representante do governo federal discutiram o papel das plataformas digitais e os rumos da regulação no Brasil.
A secretária-geral da União Nacional dos Estudantes (UNE) e jornalista, Camila Moraes, declarou que, atualmente, vivemos em uma sociedade marcada por uma disputa ideológica sobre quem tem o poder de definir a circulação de informações. “As redes sociais têm um papel fundamental na batalha de ideias”, disse, enfatizando que elas exercem um duplo papel: ampliam discursos de ódio e desinformação, mas também são ferramentas de combate.
A percepção de que a comunicação é um campo atravessado por disputas de poder se conecta diretamente com a aprovação do PL 2628/2022, também chamado de ECA Digital, que estabelece que as plataformas adotem medidas para “prevenir e mitigar riscos” ao público infantojuvenil, com foco na proteção contra conteúdos nocivos, como exploração sexual, violência, assédio, bullying, incentivo a vícios, além da promoção de jogos de azar, bebidas alcoólicas e tabaco.
Casos recentes reforçam a urgência da medida. Uma reportagem do The Intercept revelou que a agência Dreams, do Paraná, construiu um ecossistema de influenciadores que somam mais de 30 milhões de inscritos e que faturam milhões de reais por ano. Seu principal produto é uma espécie de reality show encenado por menores de idade. Outro episódio que repercutiu foi o do influenciador Hytalo Santos, que antes de ter suas contas derrubadas acumulava aproximadamente 24 milhões de seguidores, somando Instagram, TikTok e Youtube. Em seus vídeos, adolescentes apareciam em contextos de conotação sexual. Esses conteúdos não só expõem jovens a risco, como geram lucros para plataformas e empresários.
“Nunca na história da humanidade existiram empresas tão poderosas como as big techs. Além das riquezas acumuladas, elas detêm o domínio da informação”, declarou o diretor de Educação Midiática da Presidência da República, David Almansa. Ele avaliou que esse poder de moldar comportamentos e economias é talvez o maior desafio para qualquer projeto de recuperação econômica e de soberania nacional.
Se o ECA Digital trata da proteção de crianças e adolescentes, outro projeto em disputa é o PL 2630/2020, apelidado de “PL das Fake News”, que prevê regras mais rígidas de responsabilização das plataformas no combate à desinformação e à moderação de conteúdos nocivos, exigindo transparência de algoritmos e políticas de impulsionamento.
Para a reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Márcia Barbosa, além da regulamentação das redes existentes, é necessário pensar em plataformas digitais que reflitam a diversidade e os interesses nacionais. “Como país autônomo, precisamos criar nossas próprias redes, com cara de Brasil, com regras de Brasil”, afirmou Barbosa. Ela também enfatiza que as universidades públicas precisam ser parte ativa desse processo, conectando ciência, tecnologia e comunicação ao desenvolvimento nacional e na disputa por soberania digital.
Almansa reforçou o papel do governo federal na formação de um uso crítico e consciente das mídias digitais. Ele lembrou da aprovação das diretrizes nacionais de educação midiática, que determinam que todas as escolas públicas e privadas incorporem conteúdo sobre algoritmos, plataformas digitais e diferentes formas de comunicação em seus currículos.
Para Camila Moraes, o debate ultrapassa a questão da proteção infantojuvenil e toca em um ponto central da soberania nacional e do papel exercido pela comunicação no Brasil. “Avançar esse debate da regularização é também avançar na luta de classes e em um outro modelo de sociedade”, declara.