Em 2024, os conflitos no campo no Brasil chegaram a mais de 2 mil ocorrências. No Goiás, foram contabilizados 63. Desses, 52 eram referentes à conflitos por terra. O levantamento é do relatório anual de Conflitos no Campo realizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), divulgado neste ano. A pesquisa analisou três eixos de conflitos: terra, água e trabalhista, além de computar o número de violências e resistências dentro das regiões do Brasil.
Esses conflitos espelham uma realidade antiga em Goiás, explica o coordenador da CPT em Goiás, Gerailton Ferreira. “Nos últimos anos esse foi um sinal e um símbolo bem claro para entendermos como é o processo aqui em Goiás especificamente. É a ação que acontece. As famílias estão lá há décadas, são descendentes e acontece a ação [de despejo].”
De acordo com dados da CPT Goiás, a partir da pesquisa nacional de conflitos no campo, o principal incitador são fazendeiros, com 40,81% responsáveis pelas ações. O governo estadual ocupa o segundo lugar no ranking, representando 22,44% das ocorrências. Mais de 4 mil famílias da região foram afetadas com as operações no ano passado. Entre elas, os moradores da fazenda Antinha de Baixo, que sofreu com derrubadas de casas em agosto.

Cerca de 55% das famílias em Goiás foram vítimas de expropriação ou ameaçadas com as ações. A medida, na maioria dos casos, vinha acompanhada de destruições de casas, roçados e de pertences, alcançando 40,40% das famílias atingidas por algum tipo de violência no campo no ano de 2024. Segundo o documento, as violências são perpetradas pela combinação de agentes privados e o estado.
“O ano de 2024 em Goiás aponta, mais uma vez, a prevalência de uma combinação entre agentes privados do agronegócio e do Estado para a consolidação de um modelo agrário excludente no Brasil”, diz o levantamento.
Ainda de acordo com a entidade, os conflitos continuam recorrentes nas mesmas áreas desde 2023 e se caracterizam pela presença dos povos do campo amparados por alguma política agrária de estado iniciada, porém não concluída.
“Sabemos que existem pessoas que trabalham muito no intuito de simular a terra com o poder. Entendem que quem tem a terra, tem o poder. E quanto mais terra, maior é o sinal de representação de um poder. Diante de tudo isso, tem tamanho conflito por terra no Brasil e em Goiás”, argumenta. Ele avalia também que por trás das ações de expropriação há a suspeita de interesses particulares.
“Há uma suspeita muito grande, que estamos avaliando e para aprofundar até o entendimento e compreender um pouco melhor. Há um interesse do poder sobre, inclusive, as terras em que olhamos a olho nu e achamos que elas não são tão valorosas, mas são as terras raras que o mercado internacional está investindo alto, pagando caro. Diante disso, quem está de posse dessas áreas começa a enxergar economicamente um grande mercado. Principalmente essas regiões que estão as comunidades”, defende.
O Brasil de Fato DF entrou em contato com o governo do estado do Goiás para comentar sobre os índices de conflitos no campo, mas até o fechamento desta reportagem não houve retorno. O espaço está aberto para manifestação.
Caso de Antinha de Baixo será debatido em audiência pública nesta quinta (16)
A desocupação forçada em Antinha de Baixo foi suspensa por decisão judicial o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin no dia 5 de setembro. No início de setembro, o Ministério Público Federal (MPF) considerou procedente a reclamação dos moradores da comunidade para que as decisões sobre aquela área sejam tratadas no âmbito da Justiça Federal e não mais pelo estado de Goiás. A comunidade é localizada em Santo Antônio do Descoberto (GO).
A audiência pública tem como objetivo promover o diálogo entre órgãos públicos, sociedade civil e representantes da comunidade. Foram convidados representantes do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Ministério Público de Goiás, Defensoria Pública de Goiás, além de lideranças comunitárias, advogados, representantes da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e parlamentares estaduais.