Na manhã desta quarta-feira (17), a Polícia Federal (PF) deflagrou uma operação para desmontar um esquema criminoso de fraude em licenças ambientais no setor de mineração. A PF executou ordens de prisão contra 17 pessoas e 79 mandados de busca e apreensão, em Belo Horizonte e outras cidades mineiras. Dentre os locais de cumprimento dos mandados estão a Cidade Administrativa, casas de luxo e mineradoras.
Dentre os 14 presos, até o momento, estão o diretor da Agência Nacional de Mineração (ANM), Caio Mário Seabra, além de empresários, funcionários públicos e um delegado. Segundo especialistas, esse tipo de crime está diretamente ligado ao sucateamento da política ambiental brasileira: desde o PL da Devastação até a simplificação do licenciamento ambiental. E, em Minas Gerais, nos últimos anos, o enfraquecimento dos órgãos de controle também foi um fator agravante para esse cenário.
“Temos que cobrar que essa investigação seja qualificada, célere e que os denunciados sejam punidos. Não podemos aceitar esse tipo de organização criminosa no nosso estado e no nosso país. Se não revertermos esse quadro de desmonte da política ambiental brasileira, a farra na mineração vai continuar”, afirma Marcelo Barbosa do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM).
Em nota, a ANM declara que tomou conhecimento, pela imprensa, de operação da PF e que, até o momento, não houve comunicação oficial à Agência sobre eventuais medidas envolvendo servidores ou dirigentes. “A ANM reitera seu compromisso com a legalidade, a transparência e a colaboração com as autoridades, sempre que formalmente demandada, observando o devido processo legal e a continuidade dos serviços regulatórios”, diz no comunicado.
Operação Rejeito
Intitulada de Operação Rejeito, a ação conjunta entre a PF, Controladoria-Geral da União (CGU), Ministério Público Federal (MPF) e Receita Federal, está atrelada a uma investigação aberta ainda em 2020. Segundo a PF, o alvo é um conglomerado com mais de 40 empresas, atuantes na exploração de minério de ferro em regiões críticas do estado, sendo a principal a holding Minerar S/A.
“É importante que tenhamos acesso à íntegra desse processo de investigação, nós queremos saber quem são essas 40 empresas. Já temos acesso a algumas, que são empresas com um histórico de violações aqui no nosso estado”, denuncia Marcelo.
Para Barbosa, apesar da importância da operação, caso não se altere profundamente o modelo de mineração brasileira, sobretudo, nesse caso específico, a forma como tem acontecido os processos de licenciamento e de controle por parte do estado, da atividade mineradora, veremos outros episódios como esse.
“Se não conduzirmos urgentemente o processo para uma legislação mais rígida, do ponto de vista do controle social e popular da atividade mineradora e não revertermos esse quadro de enfraquecimento das instituições fiscais do Estado veremos novos episódios desses acontecendo”, avalia o integrante do MAM.
Atuação criminosa
A organização atuava como uma rede dedicada a conseguir – por meio de corrupção de servidores públicos, fraude em documentos, tráfico de influência e lavagem de dinheiro – autorizações e licenças fraudulentas para explorar minério de ferro de forma irregular. As licenças criminosas eram obtidas em regiões consideradas críticas, tais como locais tombados ou com impacto a áreas de proteção ambiental.
O grupo criminoso corrompeu funcionários da Agência Nacional de Mineração (ANM), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas (FEAM), Secretaria de Estado do Meio Ambiente, entre outros.
A Justiça determinou o afastamento de funcionários públicos da Fundação Estadual de Meio Ambiente (FEAM), do Instituto Estadual de Florestas (IEF) e do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam).
Marcelo Barbosa, representando o MAM, reforça a necessidade de debater a estrutura dos conselhos de política ambiental, ressaltando inclusive a prisão, nesta manhã, de um conselheiro do COPAM.
“Temos denunciado há tempos como esses conselhos têm sido ocupados pelas mineradoras, para sempre decidir em favor dos empreendimentos, desconsiderando qualquer entrave, qualquer questão de direitos territoriais ou impactos socioambientais”, denuncia.
Bloqueio de bens
A Justiça determinou o bloqueio de R$ 1,5 bilhão e estima-se que a organização criminosa mantinha projetos com valor superior a R$ 18 bilhões. Ainda, segundo a PF, ao menos R$ 3 milhões teriam sido pagos a servidores públicos, sendo que alguns são suspeitos de receber mesadas para facilitar os interesses da organização.
“É preciso avançar na construção de um outro modelo de mineração para nosso país, se quisermos que os interesses das mineradoras não prevaleçam sobre os interesses da sociedade”, conclui Barbosa.