O presidente argentino, Javier Milei, usou boa parte dos sete minutos de seu discurso na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), para elogiar o líder dos Estados Unidos, Donald Trump. Pouco antes, nesta quarta-feira (24), o Tesouro estadunidense anunciou estar concluindo uma linha de financiamento temporária (swap line) com o Banco Central argentino de US$ 20 bilhões (R$ 106 bilhões), e que está disposto a comprar a dívida do país sul-americano, submetido a pressões financeiras.
“O presidente Trump e os Estados Unidos compreendem que esse é o momento de reverter uma dinâmica que estava levando os Estados Unidos a uma catástrofe. Sabemos que uma catástrofe nos Estados Unidos é uma catástrofe global”, disse ele. “Trump evitou uma catástrofe nos Estados Unidos. Freou a imigração ilegal. Em outros países já é tarde demais.”
Milei disse que Trump “leva também adiante uma reestruturação sem precedentes em termos do comércio internacional, uma tarefa de magnitude gigante que faz o coração do sistema econômico global porque estava depredando o coração industrial do país”.
“Havia facções infiltradas de esquerda que atentavam contra qualquer programa de reforma, por mais necessário que fosse. Esse tipo de desafio que tanto o presidente Trump como nós estamos abordando tem um denominador comum que todos os países do mundo, incluindo as organizações supranacionais, devem enfrentar, devem encontrar uma forma de recuperar o interesse pelo futuro e não sucumbir à tentação de apenas atender ao presente.”
A enigmática frase acima pareceu justificar as medidas de arrocho que cortaram programas sociais e levaram mais da metade da população argentina para abaixo da linha da miséria. Analistas apontam tais medidas como das principais causas da baixa popularidade de Milei, que teve um resultado pior do que o esperado nas eleições regionais de Buenos Aires este mês. O resultado indica que o extremista de direita terá dificuldades para conseguir maioria parlamentar nas eleições de 26 de outubro para a segunda metade de seu mandato.
Ajuda dos EUA
Outros motivos apontados são um escândalo de corrupção envolvendo sua irmã, que ocupa o posto de Secretária da Presidência e o gerenciamento ruim da economia argentina. Milei também agradeceu no X o salva-vidas financeiro, que teoricamente lhe permitirá ganhar tempo e estabilizar o mercado antes das eleições legislativas do mês que vem.
“Valorizamos profundamente a amizade com os Estados Unidos e seu compromisso de fortalecer nossa associação”, disse.
A reação inicial dos mercados foi positiva e o peso argentino era negociado em alta de 2,5% nas primeiras transações. Na abertura do mercado de Buenos Aires, o dólar estava cotado a 1.350 pesos a unidade, 2,60% abaixo da cotação de terça-feira. Milei havia se reunido na terça-feira com Trump, e o republicano lhe deu seu apoio político.
A Argentina já tinha anunciado uma isenção dos impostos à exportação de grãos e carnes bovina e de frango para gerar maior oferta de dólares. Com esta medida, anunciada na segunda-feira, o governo Milei aposta em que agricultores e pecuaristas sejam estimulados a vender dólares antes das eleições legislativas nacionais de 26 de outubro.
Para isso, a redução de impostos vai vigorar até 31 de outubro – cinco dias após o pleito-, segundo o decreto publicado na segunda-feira. Em abril, a Argentina assinou um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) de US$ 20 milhões (R$ 113 bilhões, na cotação da época). É o maior devedor do organismo internacional, que em 2018 já tinha outorgado ao país sul-americano US$ 56 bilhões (aproximadamente R$ 216 bilhões, em valores da época).
Críticas à ONU e à esquerda
Assim como Trump no dia anterior, Milei criticou a própria ONU durante seu discurso, afirmando que a entidade “engrossou suas contribuições e reduziu seus resultados. Passamos de organização que pretendia mediar a paz, a uma que pretende decidir não apenas o que deve fazer cada Estado, mas o que deve fazer cada indivíduo.”
Milei sugeriu que a ONU se atenha a preservar a paz internacional, reduzindo sua atuação em todos os outros aspectos. Ele ainda acusou, sem apresentar provas ou dizer ao que estava se referindo, a esquerda global de aumentar a violência política.
Com sete minutos e dois segundos, o segundo discurso do argentino na Assembleia Geral da ONU teve metade da duração de seu primeiro, no ano passado, que atingiu os 14 minutos e quatro segundos. De forma geral, pareceu também bem mais amuado do que a participação de 2024, na qual terminou o pronunciamento com um triunfante palavrão: “Viva a liberdade, c*****”, slogan da campanha eleitoral que o levou à Casa Rosada.