A Universidade La Salle, em parceria com a CPFL Energia e a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, iniciou um amplo projeto de recuperação ambiental no Parque Estadual de Itapuã, em Viamão. Batizada de “Nosso Itapuã”, a iniciativa prevê investimentos de R$ 2,5 milhões ao longo de três anos, com foco no controle de espécies invasoras e na retomada da vegetação nativa.

Ameaça ao equilíbrio do parque
O Itapuã, que ocupa mais de 5,5 mil hectares, é considerado uma das áreas mais importantes para a conservação no Rio Grande do Sul. Localizado entre os biomas Pampa e Mata Atlântica, o parque sofre há décadas com a presença de árvores exóticas que se espalharam pelo território e alteraram o equilíbrio natural.
Levantamentos realizados em uma das áreas internas identificaram cerca de 250 mil indivíduos espalhados por dois mil hectares. A presença dessas árvores impede o crescimento das espécies locais, modifica o solo e prejudica a paisagem.
Para o coordenador técnico do projeto, Rafael Borges, esse impacto ainda é pouco percebido por quem vive na região. “A população local muitas vezes não tem noção de que aquelas árvores estão degradando a biodiversidade, empobrecendo o solo e matando a paisagem original”, afirma.
A importância da restauração
A botânica Mariana Vieira explica que o desafio vai além da simples retirada. Para ela, é preciso reforçar que conservar significa proteger o que é próprio do território. “As pessoas falam muito sobre plantar árvores, mas quase nunca sobre os impactos de espécies exóticas invasoras. O pinus ocupa o espaço de espécies nossas, espécies que são nativas, formam grandes adensamentos de árvores e invadem inclusive áreas originalmente de campo”, observa.
A gestora do parque, Dayse Rocha, reforça que o trabalho cumpre uma função pedagógica e de proteção. “É fundamental mostrar que o parque é uma unidade de conservação”, destaca.
Como funciona o manejo
O projeto iniciou com o mapeamento aéreo das áreas mais críticas, por meio de drones, que permitiram localizar e medir a extensão da invasão. A partir disso, foram definidas áreas prioritárias: o entorno do Centro de Visitantes e o Morro do Araçá.
As árvores adultas são cortadas junto à base com motosserra, enquanto em locais de difícil acesso é feito o anelamento, técnica que remove parte da casca para levar o indivíduo à morte em pé. Plantas jovens são retiradas manualmente, e o material gerado é triturado para uso como composto orgânico. Também ocorre a retirada das camadas de acículas e pinhas acumuladas no solo, que servem como reserva de sementes.
Segundo Borges, a necessidade de continuidade é o ponto central. “O pinus tem o maior potencial de invasão no Brasil e se reproduz de forma acelerada, ocupando rapidamente o espaço e sombreando o solo”, explica.

Recuperação da vegetação nativa
Além da remoção, está em andamento a construção de um viveiro para o cultivo de mudas locais. A coleta de sementes acontece tanto em árvores adultas quanto por meio de coletores instalados em fragmentos florestais. O monitoramento será feito a cada semestre, com avaliação da regeneração natural e plantio em clareiras abertas.
Mesmo com o esforço, o pesquisador Maurício Pereira Almerão lembra que o processo exigirá décadas. “Pela quantidade que existe hoje dentro da área do parque, a gente só conseguiria ter um extermínio, que a gente chama de erradicação depois de um bom tempo. Uns 50 anos, vamos colocar assim”, avalia.
Envolvimento da comunidade
O “Nosso Itapuã” também prevê a contratação de moradores do entorno para atividades como corte de árvores, coleta de sementes e implantação do viveiro. Além de gerar renda, a ação busca criar vínculo entre a população e a unidade de conservação.
Atividades de educação ambiental serão realizadas com escolas e agricultores vizinhos, discutindo os impactos das espécies invasoras e a importância da preservação. Para Almerão, esse vínculo é essencial. “O nosso maior desafio é criar vínculo com o território”, resume.
O nome do projeto foi escolhido justamente para reforçar esse pertencimento. Para Mariana Vieira, trata-se de recuperar a memória da paisagem local. “As pessoas precisam voltar a enxergar a paisagem original”, afirma. Borges complementa dizendo que o esforço deve aproximar a população de seu próprio espaço. “O projeto deve valorizar o espaço onde as pessoas vivem”, completa.
Modelo para outras áreas
Os organizadores acreditam que o trabalho em Itapuã pode servir de exemplo para outras unidades de conservação que enfrentam desafios semelhantes. A expectativa é de que os três anos previstos sejam apenas o início de um processo mais longo, estimado em até 15 anos, para reduzir de forma significativa a presença de espécies invasoras e permitir a recuperação plena da vegetação nativa.