Movimentos populares de 15 cidades colombianas se reuniram em Bogotá neste sábado (27) para a abertura da Cúpula Nacional Popular. Com a temática “Cidade Para Quem?”, as organizações vão debater os desafios e a luta nos diferentes territórios colombianos durante três dias e elaborar um documento com propostas que serão entregues ao governo do país.
O evento foi organizado pelo Congreso de los Pueblos, um dos maiores movimentos colombianos. O grupo propôs às diferentes organizações uma discussão sobre os novos modelos de cidade e alternativas a uma lógica urbana excludente e, a partir disso, construir e disputar uma agenda de luta nacional.
Cerca de 1,5 mil militantes participaram da abertura da cúpula na Universidade Pedagógica Nacional. María Camila Hernández faz parte do coletivo Junta Popular do estado de Valle de Cauca e viajou mais de 400 km até a capital para a Cúpula. De acordo com ela, a articulação de diferentes movimentos populares é fundamental para expressar as diferentes ideias não só das organizações, mas também das pessoas que compõem os grupos organizados.
“Essa Cúpula é importante para unir diferentes movimentos do país. Somos pessoas de vários lugares e é muito importante unir essas vozes porque também mostra que existe um mal-estar comum e que todos temos o mesmo propósito, que é a unidade e a luta organizada. É também crucial para organizar as lutas sociais e isso cria a coletividade para a comunidade e apresenta alternativas ao que queremos agora, especialmente o direito à cidade” disse ao Brasil de Fato.
O evento começou com o que os movimentos chamam de mística, uma manifestação simbólica apresentada por diferentes organizações. Os grupos também fizeram breves discursos sobre os desafios criados por um modelo de cidade neoliberal que “apropria o território” contra a reprodução da vida.

A cúpula foi organizada a partir de encontros nas cidades colombianas. Os organizadores entendem que o processo se deu “de baixo pra cima”, com assembleias nos bairros, universidades e comunidades do país.
Para os movimentos, é importante terminar o evento com um documento contundente, que levante as principais demandas dos diferentes setores da sociedade, apresente propostas e construa uma agenda de mobilizações em todo o país.
Lady Natalia Riascos é diretora do Sindicato Nacional de Trabalhadores e Empregados Universitários da Colômbia (Sintraunicol) em Cali. Ela afirma que a reunião de muitos coletivos ajuda a fazer uma leitura crítica da realidade e a construir saídas possíveis para a “crise das cidades em meio a um modelo neoliberal”.
“Como somos movimentos urbanos, essas discussões acabam sintetizando as nossas lutas. Nos reunimos, fazemos uma análise e construímos um pensamento em torno de como estamos organizados. A Colômbia precisa se organizar ainda mais nesse momento, uma crescente violência nas cidades, não só física, mas simbólica. Milhares de pessoas passam fome e não têm acesso à direitos básicos. Chegar a um consenso em um documento vai ser uma tarefa difícil, mas é necessário”, disse.
Um dos convidados internacionais que participa da cúpula é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Adriana Oliveira é dirigente estadual da organização e valorizou o encontro como um espaço de troca de experiências e de fortalecimento da esquerda em diferentes países.
“Quando a classe trabalhadora se encontra, se fortalece. E quando a gente se fortalece, temos certeza que as mazelas do capitalismo, as violências, que aqui podemos discutir e nos entender sobre o que nos oprime. E saber que a possibilidade de triunfar a partir da nossa organização”, afirmou na abertura da Cúpula.

Cidade para todos
Para integrantes do Congreso de los Pueblos, a estrutura da cúpula fortaleceu um dos diferenciais do evento: a grande presença de jovens e mulheres.
Os militantes e palestrantes que participaram do encontro destacaram que pensar um novo modelo de cidade inclui também uma estrutura urbana que pense nos diferentes grupos sociais.
Alicia Cardiles é dirigente da Associação de Mulheres da Economia Popular de Cartagena. Ela viajou 14 horas de ônibus para chegar a Bogotá com a ideia de trazer as demandas das mulheres negras e as particularidades desse setor não só na política, mas também na economia colombiana.
“Precisamos visibilizar as problemáticas de cada território e formar uma agenda coletiva de baixo pra cima. Pensando cidades com políticas de inclusão com foco nas pessoas. As mulheres negras, por exemplo, são responsáveis por uma economia própria e isso precisa ter um olhar dos governos e serem parte do território enquanto sujeitos importantes para as cidades”, disse ao Brasil de Fato.


Para pensar as cidades é necessário também conhecer os territórios. As organizações apresentaram mapas das cidades com os principais problemas identificados em cada cidade e os desafios dos movimentos em cada espaço.
A violência policial e a repressão aos grupos de esquerda com ameaças e extorsões foram aspectos trazidos como foco dos debates em cada bairro.
O desenvolvimento da exploração ao longo do tempo na cidade foi um dos pontos apresentados por Alfonso Insuasty Rodriguez, professor da Universidade de San Buenaventura Medellín e pesquisador do grupo Kavilando. Ele apresentou o conceito de “Extrativismo humano”, como uma das ferramentas de exploração da sociedade.
“Esse projeto de exploração se consolida no espaço. As cidades da América Latina se tornam um instrumento sociocultural usado para a acumulação de capital, onde as redes solidárias, de encontro, as redes políticas e espirituais são combatidas. Nessas cidades, as relações só têm sentido na medida em que se pode extrair capital, tirar proveito econômico da cidade. Isso se chama extrativismo humano. Então, nós não temos somente o extrativismo minerador, das zonas rurais, que expulsam as populações e os concentram nas grandes cidades”, afirmou.


Calendário
Depois da abertura da cúpula, os debatedores participarão de mesas de trabalho durante o final de semana para condensar as propostas. Na segunda-feira (29), o encontro vai terminar uma marcha que vai até o centro de Bogotá para levar o texto para o governo colombiano.
Os militantes do Congreso de los Pueblos esperam que seja fechado também um calendário de ações até o segundo semestre de 2026 para chancelar a capacidade de mobilização da cúpula.
*Fotos: Rodrigo Chagas