“Não estamos alegres,
é certo,
mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?”, Vladimir Maiakovski.
Até onde eu pude perceber, a imagem feita pela fotógrafa Giorgia Prates transmite nas pessoas uma sensação mais do que necessária, urgente na verdade, nesses momentos dolorosos que vivemos.
Fiquei meditando sobre a imagem. Em tempos quando a gente dedica praticamente dois segundos para cada uma, aquela fotografia ainda está rodopiando na minha cabeça há pelo menos uns três dias e noites.
Aqueles olhos de dona Néia abertos, brilhosos, e aquele sorriso desenhado por trás da máscara, enquanto coordena uma cozinha comunitária em dia de estreia, pronta para atender mais de 200 pessoas no bairro.
Antes, eu e Giorgia chegamos a nos questionar se, em pleno alcance dos 100 mil mortos em nosso país, valia a pena estampar na edição online do jornal uma foto que de alguma forma transmite alegria.
Mas alegria neste momento? Não é essa indiferença que criticamos na presidência, em meio a um número de mortos de guerra?
Não. Aquela alegria registrada não era o mesmo contentamento cínico estampado nas rodas de bar. A alegria das elites não é a mesma alegria popular. Não se equipara ao mesmo individualismo do presidente da república que prega: “E daí?” O importante – esta é a mensagem -, é cuidar apenas da famiglia.
O sorriso de Néia, ao contrário, é o sorriso doloroso, mas inteiro de esperança de um povo que não deixa de lutar, que assume seus problemas, que não é acomodado, como tantos gostam de fazer essa classificação. De quem conduz a própria vida.
Aquela senhora e tantas outras se somaram a uma experiência nova chamada União de Moradores/as e Trabalhadores/as do bolsão Formosa, no bairro Novo Mundo, na capital curitibana, na qual cinco associações de moradores estavam dispersas e resolveram tentar a difícil arte da unificação.
Algumas moradias locais estão simplesmente há trinta anos esperando pela escritura da casa, décadas pagando a prestação da Cohab, e nada. Ao mesmo tempo, é impressionante o olhar da gestão municipal que condena qualquer experiência de organização popular.
Uma das lideranças nos relatou que um gestor regional chegou a bufar:
– O que que vocês tão aprontando com essa União de Moradores, hein?
É exemplar como a classe dominante em nosso país enxerga e se assusta com qualquer movimentação dos trabalhadores.
São tempos duros, é certo, mas constatamos que a fotografia com o sorriso de Néia ajudou a todos que a viram a espantar um pouco esses tantos fantasmas que seguem nos rondando. Um sorriso-raiz.