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O que a Cohab faz?

Há anos acompanho a questão da moradia em Curitiba e o que vejo? Um problema cada vez maior

Há anos acompanho a luta por moradia em Curitiba. Testemunhei ocupações começando e terminando em diferentes regiões da cidade. Cansei de ver famílias, crianças e idosos desesperados e, apesar de já ter acompanhado muitas histórias parecidas, nunca vou me acostumar ao ver essas famílias perdendo tudo.

O último caso ocorreu entre abril e maio deste ano. De um lado, tínhamos um terreno no Campo Comprido abandonado há mais de 20 anos e com 30 anos de dívida em imposto predial e territorial urbano. De outro, 200 famílias desabrigadas, que viram ali uma oportunidade de luta por moradia digna e que ocuparam o local no dia 27 de abril de 2024.

Em menos de 15 dias, esse embate de forças terminou com a vitória da propriedade irregular privada e com o despejo forçado de crianças, mulheres e idosos que agora aumentam uma lista obscena da desigualdade social em Curitiba.

Segundo dados atualizados da Companhia de Habitação no Paraná, a cidade tem um déficit habitacional de 90 mil moradias. São mais de 43 mil famílias morando nas 322 favelas da cidade e outras 7.400 morando em um dos 93 loteamentos irregulares da capital.

Em apenas um ano atuando como vereadora, pude entender que muito do que falta é vontade política. Existem caminhos para resolver a péssima situação da habitação em Curitiba, mas os órgãos responsáveis não frequentam o percurso. Não existe disposição nem transparência. As famílias do Campo Comprido que foram despejadas estão na rua porque a política de habitação aqui praticamente não existe.

A Cohab, Companhia de Habitação Popular de Curitiba, tem muito trabalho, mas age como não tivesse. Antes do despejo da última sexta-feira, das mais de 200 famílias da ocupação Resistência Forte, no Campo Comprido, já existiam 58.781 famílias na fila da casa popular em Curitiba. Isso não tem sido suficiente para alarmar quem deveria trabalhar pela moradia popular na cidade, pois eu mesma, enquanto vereadora, cobrei uma atuação da Cohab para ao menos cadastrar essas famílias.

Cheguei a enviar um ofício e pedidos de informação cobrando formalmente uma atuação do órgão antes que as famílias fossem despejadas, mas não adiantou. Fui solenemente ignorada até no dia do despejo, mas continuei pressionando por uma ação da Cohab, que sequer encaminhou agentes para cadastrar as famílias no local. O argumento foi que o procedimento é o cadastro via site. Sim: eles pressupõem que famílias sem moradia têm facilidade de acesso a computador, smartphone e internet.

Apesar da tristeza de ver mais famílias sendo abandonadas, jogadas na rua, estamos na luta. Da mesma forma que estive acompanhando muitas histórias parecidas, em inúmeras situações vividas nas ruas, na linha de frente e do lado das pessoas que precisam de moradia, sigo lutando aqui na Câmara. E vou continuar até o fim, trabalhando pela vida digna de todas as pessoas.

Além de acompanhar a tragédia da habitação na linha de frente, criamos um projeto de lei que institui o Programa de Atenção às Ocupações Urbanas, pedindo a realização periódica de estudos técnicos com diagnósticos reais sobre a situação do município e seus incentivos à regularização fundiária.

Queremos mais transparência e análises detalhadas da situação habitacional de Curitiba, a cada seis meses, incluindo informações sobre as áreas das ocupações, as condições de moradia e dados demográficos, socioeconômicos e de infraestrutura. Incluímos também pedidos de incentivo à regulação fundiária, com parcerias envolvendo órgãos públicos, empresas, movimentos sociais e organizações da sociedade civil. A proposta ainda tem um artigo específico para proibir a reintegração de posse sem que exista uma alternativa de deslocamento das famílias.

Vivemos numa cidade que abandona seus cidadãos mais vulneráveis, sem o menor constrangimento e nenhuma comoção. Mas estamos aqui na linha de frente, dentro e fora da Câmara, fazendo o possível para representar quem precisa e ainda vê negado o acesso a seus direitos mais básicos.

 

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