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DESEMPREGO

Artigo | Lençóis, papelões e cobertores puídos: uma crônica sobre desigualdade no Rio

Rio de Janeiro é uma “cidade partida”, de partir o coração, tanta a indignação

25.nov.2019 às 10h01
Rio de Janeiro (RJ)
Regina Bruno
"Calçadas-dormitório com gentes enfileiradas, rentes uma a outra para proteger-se da morte"

"Calçadas-dormitório com gentes enfileiradas, rentes uma a outra para proteger-se da morte" - Divulgação

Dia desses, caminhando pelas Laranjeiras, bairro da zona sul do Rio, ouvi um grito: “- Estou com fome! Estou com fome”. Era o vendedor de livros usados, agarrado à grade de ferro do muro da Igreja urrando a sua fome. Seu grito silenciou a buzina dos carros, as sirenes das ambulâncias, a algazarra dos alunos e alunas do Liceu e até mesmo a reza das devotas que às segundas-feiras acendem seus incensos e velas para o anjo da guarda. Se Marx por aqui aportasse certamente não necessitaria ler ‘Os mistérios de Paris’ de Eugene Sue para entender as desventuras de nossa cidade, pensei. Bastaria olhar à sua volta pra vida escancarada de seus habitantes – espelho do país – para descobrir os seus segredos. Ele veria calçadas-dormitório com gentes enfileiradas, rentes uma a outra para proteger-se da morte. Garrafas d’água demarcando espaços e assegurando o lugar de quem momentaneamente precisou sair. O direito à privacidade restrito ao lençol enrolado ao corpo ou à proteção precária de caixas de papelão desmontadas e transformadas em muretas. Avistaria as marquises-dormitório assombrando quem por ali passa mesmo aqueles/as que viram o rosto ou que balbuciam “- Isto não me concerne!” .

Notaria algumas caras novas dividindo espaço das calçadas com os demais: são os boys e os auxiliares dos escritórios da redondeza que, por força das dificuldades e o fim dos hotéis populares encravados próximos a Central, dormem ao relento para ‘economizar’ o dinheiro da condução. “São os ensapatados. Gente sem crostas nos pés”, diz alguém. Antes de dormir, eles guardam seus preciosos sapatos, chichelados, cintos e apetrechos em mochilas transformadas em cofres de proteção e em travesseiros. A gravata serve para proteger os olhos dos holofotes da Presidente Vargas, cada vez mais potentes.

Enxergaria uma “cidade partida”, de partir o coração, tanta a indignação. Uma cidade loteada. Aquele pequeno grupo fica estrategicamente posicionado, ora na porta do banco ora na saída da lanchonete – lugares por onde passam dinheiro e comida. Tornado impossível seguir feliz com seu cheddar e sua coca-cola veneno, promoção Mc das quintas-feiras, ao deparar-se com aquele olhar pidão. Outros se posicionam próximo às farmácias seja buscando aplacar dores imediatas seja para negociar produtos, “- Psiu, moça, compre um pacote de fralda pra minha mãe. Mas só serve a Pampers Premium”. “- Por que? Ela só gosta da Pampers?.“- Ora, porque essa marca eu vendo fácil pra comprar comida”…

Descortinaria uma vida, ela também pontuada por atitudes-basta. Aquele homem parado próximo à entrada de um morro. “-Me dá um quilo de açúcar”. “- Não tenho, responde alguém apressado”. Mas imediatamente diminui o passo, guarda momentaneamente seus problemas e preocupações, entra na padaria próxima, compra o açúcar, retorna e o entrega ao homem ainda parado à entrada do morro “- Obrigado”, diz. “- Hoje eu decidi que não subo de mãos vazias. Só volto pra casa quando conseguir o café, o pão, o leite e o açúcar”. Escutaria um diálogo entrecortado pela insatisfação na qual o “pois devia!” é cada vez mais freqüente. Expressão, talvez, de reivindicações não percebidas nem reconhecidas como tal: “- Não tenho trocado”. “- Pois devia ter!”. Ou a indignação feito raiva pura: “- Me dá um dinheiro!”“- Desculpa, hoje não tenho nada”. “- Me dá, sua puta!!”.

Descobriria que a jornaleira considera a situação uma tragédia e sugere: “essa gente deveria desaparecer e circular durante o dia”. E que o taxista da Uruguaiana os vêem como “uma arraia miúda de vagabundos” mas escuta porque sente na pele quando ele comenta sobre os 13 milhões de desempregados e nova classificação do IBGE, os “desalentados”, ou seja, pessoas que após anos de ouvir “- não há vaga” desistiram de procurar um emprego, um trabalho.

E emocionado, ouviria em meio a tantas dificuldades conversas e sussurros de gentes fazendo graça, falando amenidades e trocando afetos: “- Hoje tu está mais linda, mulher”. “- É os teus olhos, homem!”. “Mais parece a Maria da Paz!”. “E tu se acha o próprio Gianecchini!” “- Coitado do Arrascaela, machucou-se no jogo”.”- Tem pena não, ele ganha milhão!”. “A senhora não veio ontem!, por que?”. “- Fia, era feriado! Também tenho meus direitos!”. Ou comovido notaria que os cães são companhias constantes das gentes. Aconchegam-se no frio. Dormem entrelaçando suas patas às pernas. Cães e pessoas guardiãs uma da outra. Fomes e comidas compartilhadas.

Marx ficaria indignado ao constatar que nada mudou quando o assunto é humilhação. As elites. os “estabelecidos”, os poderosos, os endinheirados, como garantia da desigualdade, continuam impondo uma cruel e eficaz associação entre vestimentas, corpos e o caráter das pessoas, ao procurar transformar o maltrapilho em mal-encarado, o desgrenhado em violento e o desdentado em imprestável. Se revoltaria ao ver recém nascidos, bebês, crianças e gentes miúdas perambulando pelas ruas da cidade e do país e aprenderia um pouco mais sobre relações humanas ao ver, para desespero da mãe, um guri distribuir aos passantes as moedas arduamente ganhas e ciosamente guardadas na caixa de doces.

Um mundo marcado por desigualdades e contradições. Uma imensa pobreza gerada pela modernização. O contrate entre a indigência e a riqueza. A banalização da ética.

E nós?

*Regina Bruno é professora do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA-UFRRJ)

 

Editado por: Vivian Virissimo
Tags: fomerio de janeiro
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