A última entrevista concedida pelo primeiro militar reconhecido pela Justiça brasileira como torturador, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, acaba de se transformar em livro. Com lançamento marcado para a próxima terça-feira (22), em Porto Alegre, Confissões de um torturador: a última entrevista do coronel Ustra reúne os principais trechos das 2 horas e meia de conversa entre o ex-chefe do DOI-Codi e a jornalista Cleidi Pereira, em 2014.
O evento de lançamento ocorre na sede da Associação Riograndense de Imprensa (Ari), com início às 18h30, quando será realizado um painel sobre o papel do jornalismo durante a ditadura. Participam da discussão o jornalista e diretor do jornal Já, Elmar Bones, e o historiador e presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), Jair Krischke. A mediação é da jornalista Márcia Christofoli, do portal Coletiva.net.

Às 20h, está prevista a sessão de autógrafos no Bar da Ari, junto ao prédio da entidade (Av. Borges de Medeiros, 915, 8º andar, centro de Porto Alegre). Durante o lançamento, Pereira irá formalizar a entrega do áudio original da entrevista para o acervo do MJDH, reconhecido pela Unesco por sua atuação em defesa da memória coletiva.
O prefácio do livro é assinado por Krischke, que destaca a importância da obra diante da ausência de políticas públicas de memória no Brasil. “A inexistência das referidas políticas é suprida, em parte, por livros como este”, afirma. Ele destaca que o Brasil “é um país sem políticas públicas de memória, ao contrário do Uruguai, do Chile e da Argentina, antes do atual presidente”.
Natural de Santa Maria (RS), Ustra comandou o Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo, entre 1970 e 1974. Durante esse período, 502 pessoas foram torturadas e pelo menos 50 foram assassinadas nas dependências do órgão, segundo relatórios do Grupo Tortura Nunca Mais e da Comissão Nacional da Verdade. Ustra morreu impune em 2015.
Na entrevista, concedida quando Pereira era repórter do jornal Zero Hora, o militar admitiu a prática de “interrogatórios contínuos” — técnica de tortura que impede os presos de dormir. “Essa entrevista foi o mais próximo que Ustra chegou de uma confissão”, afirma a autora. “Como jornalista, sentia o dever de contribuir com a preservação da memória sobre um dos mais sombrios períodos da história do nosso país.”
Radicada em Lisboa, Pereira é escritora e pesquisadora. No livro de 189 páginas, publicado pela editora Insular, ela relata os bastidores da entrevista e apresenta depoimentos de sobreviventes. O último capítulo traz os nomes e as biografias das 60 vítimas em que Ustra aparece na cadeia de autoria, segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade.
