“Ouvimos uma claríssima convicção da China de que a gente tem que fortalecer o multilateralismo como forma de resolver os grandes problemas internacionais, mas ouvimos sobre tudo uma convicção inabalável do governo chinês quanto à transição para uma economia de baixo carbono”, disse o presidente da COP 30, o embaixador André Corrêa do Lago, em coletiva nesta sexta-feira (18), na embaixada brasileira em Pequim.
O presidente da COP 30 está encerrando uma visita à China como parte do trabalho de construção da 30ᵃ Conferência das Partes (COP) em Belém do Pará, o órgão mais alto da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, de 10 a 21 de novembro em Belém do Pará.
Ele realizou reuniões com o ministro da Ecologia e Meio Ambiente Huang Runqiu na terça-feira (15), com Su Wei, o principal representante das negociações climáticas da China e o vice-ministro de Relações Exteriores. O embaixador também participou Instituto de Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Sustentável da Universidade Tsinghua.
No encontro com Huang, o ministro afirmou que a China “seguirá firmemente as metas e princípios da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e do Acordo de Paris”. Ele também disse que o país asiático “se esforçará inabalavelmente para atingir o pico de carbono antes de 2030 e a neutralidade de carbono antes de 2060”.
Na coletiva, Corrêa destacou que metade dos carros vendidos na China já são elétricos, e de que os preços dos painéis solares “diminuíram quase 90%”. Segundo a Agência Internacional de Energia, a participação da China em todas as fases de fabricação de painéis solares supera 80% a produção mundial.
Saída dos EUA do Acordo de París é ‘frustrante’
Este ano os EUA voltaram a se retirar do Acordo de Paris (tinham saído em 2017 também sob Trump), um tratado internacional adotado na COP 21 em 2015, na capital francesa, que visou limitar o aquecimento global bem abaixo de 2°C em comparação com os níveis pré-industriais. O acordo também instaurou o mecanismo de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), que são metas de redução de emissões CO2 definias autonomamente por cada país, mas que não são vinculantes. Organizações populares e ambientais criticaram a pouca ambição do tratado à época.
Côrrea lamentou que os EUA abandonaram, o Acordo de Paris, porque o acordo foi desenvolvido, em parte, para que os Estados Unidos assumissem algum compromisso em relação ao combate à crise climática, já que nunca foram signatários do Protocolo de Kyoto.
“Para trazer os Estados Unidos às negociações foi desenvolvido o Acordo de Paris, que tem esses elementos de não obrigatoriedade que permitiram que [o acordo] não precisasse passar pelo Senado americano e que, portanto, os americanos pudessem participar”, explicou o presidente da COP 30.
“Então é evidentemente muito frustrante para a Comunidade Internacional que todo mundo tenha se esforçado a fazer um acordo para que os Estados Unidos pudessem entrar, para logo eles saírem”, lamentou Côrrea.
Financiamento
Uma das dificuldades criadas com a saída do governo estadunidense, segundo o embaixador, é encontrar recursos. Ele contou que a presidência da COP29 (do Azerbaijão), com a atual devem apresentar um mapa do caminho para passar do compromisso de financiamento do clima de US$ 300 bilhões para US$ 1,3 trilhão (R$ 7,5 tri).
Na COP passada em Baku, capital azerbaijana, os países enriquecidos se comprometeram a contribuir anualmente com pelo menos US$ 300 milhões (R$ 1,7 bi) para o combate à crise climática. De onde tirar esses recursos é uma das tarefas da presidência brasileira da COP deste ano. Côrrea conta que há algumas ideias como a taxação do transporte marítimo ou da aviação.

“Realmente a saída dos Estados Unidos torna ainda mais clara a dificuldade que o mundo tem em reunir os recursos necessários para combatermos a mudança do clima”, lamenta.
Em resposta a questionamento de O Globo de se a China poderia ocupar o espaço dos EUA em termos de financiamento, Côrrea lembrou o princípio responsabilidades comuns, mas diferenciadas: “A China e outros países em desenvolvimento podem ocupar muito mais espaço em desenvolvimento de tecnologia entre outras iniciativas, mas todos os países em desenvolvimento concordam que não é justo substituir os países desenvolvidos no fornecimento de recursos financeiros.”
“‘Alguns países desenvolvidos talvez tenham a ideia de que eles possam diminuir a sua contribuição, se outros entrarem, mas, como países em desenvolvimento, estamos convencidos de que os países desenvolvidos primeiro têm que cumprir com as suas obrigações, para depois pensar em outras contribuições”, completou.
Na reunião de terça-feira, o ministro do Meio Ambiente Huang Runqiu, destacou a necessidade de aderir ao princípio de “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” e implementar as obrigações de financiamento dos países desenvolvidos.
COP com maior participação popular?
Questionado pelo Brasil de Fato sobre a denúncia de movimento populares da cooptação da COP pelas corporações responsáveis pela crise climática, o embaixador afirmou que espero que a COP 30 “seja reconhecida como uma etapa extremamente importante para a maior participação dos povos”.
“Nós criamos o Círculo dos Povos, que vai ser presidido pela ministra Sônia Guajajara e vai reunir justamente povos indígenas, povos das florestas, representantes de quilombolas”, disse ele, que explicou que objetivo é que os povos indígenas possam acompanhar os debates com antecedência para influenciar “não só a posição do Brasil mas também convidar povos de outros países para também ter uma influência”.
Os encontros do presidente da COP30 foram com:
- Presidente do AIIB (Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura),
- Jin Liqun; ministro da Ecologia e Meio Ambiente da China,
- Huang Runqiu; enviado Especial para Mudança Climática, Liu Zhenmin;
- Ex-enviado Especial da China para Mudança Climática, Xie Zhenhua;
- Embaixadores em Pequim (Uruguai, Barbados, México, Índia, Alemanha, Canadá, Suécia e Noruega);
- Vice-ministra das Relações Exteriores da China, Hua Chunying;
- Coordenador residente da ONU (Organização das Nações Unidas) na China, Siddharth Chatterjee;
- secretário-geral do CCICED (Conselho Chinês para Cooperação Internacional em Meio Ambiente e Desenvolvimento), Zhao Yingmin;
- governador adjunto do Banco Popular da China, Xuan Changneng;
- representantes das ONGs: Greenpeace, Instituto dos Recursos Mundiais, Instituto de Finanças e Sustentabilidade e do Fundo de Defesa Ambiental.