Porque temos tantas cidades inundadas nas chuvas maiores e mais prolongadas? Esta situação não existe apenas no Rio Grande do Sul. Em Santa Catarina a situação mais crítica é a cidade de Blumenau. Foi construída num vale, em solo rochoso (pouco infiltrável) e antecedido por uma serra. A cidade é atravessada pelo Rio Itajaí-Açu, que recebe as águas de 4 rios. Suas margens estão completamente ocupadas. Possui um sistema de proteção ainda incompleto, incluindo alertas à população.
A gigante metrópole de São Paulo, atravessada pelo importante Rio Tietê, tem regiões inundadas até em chuvas menores. Existem algumas medidas preventivas e e de contenção das águas.
Grandes cidades do nordeste e demais regiões do Brasil também inundam.
O que acontece? Os rios e arroios, quando enchem a sua sua calha, extravasam suas águas sobre as áreas laterais, o que chamamos de inundação. Geralmente este problema é agravado porque o sistema de drenagem urbana, destinado a retirar a água das chuvas da cidade, é incompleto e não recebe a manutenção necessária, acrescentando o que chamamos de alagamentos.
Água é vida
E porque as margens dos rios e arroios foram (e ainda são) tão ocupadas? Pelos menos duas razões são claramente identificáveis. Primeiramente vamos abordar o histórico motivo relacionado com a ocupação das regiões e o seu povoamento durante os últimos séculos, especialmente com a vinda de mais imigrantes europeus. Água é vida! Necessária à própria sobrevivência humana e a qualquer processo produtivo. No passado, considerando desde o século 18, obviamente não havia os sistemas de bombeamento das águas que mais recentemente possuímos. Então era necessário estar próximo da água e ocupar estas áreas estratégicas. Ainda há de se considerar que no passado havia mais equilíbrio da natureza, ocorrendo chuvas mais regulares.
O transporte era nos rios
Outro aspecto fundamental. O deslocamento de pessoas, mercadorias e animais era feito através dos rios. Por exemplo, estão bem registradas as conexões entre o porto de Porto Alegre e o porto de São Sebastião do Caí (minha terra natal), servindo inclusive ao então povoamento da serra, em seu início de implantação. De Porto Alegre partiam produtos mais elaborados e retornavam produtos agrícolas. Hoje, em São Sebastião do Caí, há forte ocupação junto ao Rio Caí, incluindo uma grande indústria de conservas, especialmente na margem esquerda. Praticamente todos os anos há necessidade de retirar da inundação pessoas e atividades.
Fortificar o povoamento junto ao rio
O histórico exemplo de Porto alegre é ilustrativo: Em 26 de março (data do hoje aniversário de Porto Alegre) foi desmembrada da “Jurisdição Administrativa Eclesiástica” de Viamão, recebendo o nome de São Francisco do Porto dos Casais. O então Governador da Capitania de São Pedro, José Marcelino de Figueiredo (cujo nome verdadeiro era Manoel Jorge Gomes de Sepúlveda) determinou que era necessário fortificar o povoamento junto ao rio, privilegiado por uma posição geográfica estratégica, com um porto a meio caminho de Rio Pardo, pelo Rio Jacuí, e de Rio Grande, pela Lagoa dos Patos. Ainda determinou que os vereadores de Viamão também se mudassem para as margens dos rio, como ele próprio já tinha feito. Porto Alegre, com o passar do tempo, passou a ter 40% de sua área urbana em regiões alagáveis. Com início na década de 60 foi construído pela União e com responsabilidade de manutenção do Município, um Sistema de Proteção contra Cheias, suficiente para proteger a Cidade e, que, por falta de sua manutenção regular, não impediu a maior inundação da história de Porto Alegre, em maio-24. Insistimos neste tema, para que nunca mais voltemos a sofrer tal catástrofe climática em Porto Alegre.
Como sabemos, hoje não há mais necessidade de morar ou trabalhar próximo aos rios e arroios para ter acesso à água. E as hidrovias estão muito subutilizadas.
Sem alternativa sobraram as margens dos rios
Porém, nas últimas décadas, vamos ter outro fator forte de ocupação das margens das águas correntes. O intenso crescimento das grandes cidades, incluindo o êxodo rural. A necessidade de moradias tornou-se crítica e muitas famílias pobres, sem outra alternativa, tiveram que ocupar estas áreas, bem como encostas de morros facilmente desmoronáveis. Não só pobres, outros desconhecedores de que tratavam-se de áreas de risco não habitáveis, ali se estabeleceram. Ainda outros, sabedores das condições destas áreas, assim mesmo ocuparam, inclusive com pequenas indústrias e comércio. Assim, criaram-se então enormes quantidades de áreas de risco. Como resolver? Prevenir fortemente a ocupação das áreas ainda não ocupadas, exigindo a existência das matas e vegetações ciliares, compondo áreas verdes. Nas áreas de risco ocupadas, temos duas alternativas. Ou reassentá-las em áreas seguras, implantando áreas verdes com árvores e atividades de lazer nos locais desocupados ou então implantar e manter sistemas de proteção contra cheias. E obviamente onde já existirem sistemas implantados, nunca deixar de fazer a manutenção necessária.
Programa permanente para as áreas de risco
Não faltará quem diga: estas alternativas são difíceis e caras. Então vamos fazer as contas: O que custa menos, implantar estas alternativas ou arcar com os incontáveis prejuízos de toda a ordem com as inundações, que lamentavelmente tenderão a ser mais frequentes.
Precisamos de um programa permanente de reassentamento de áreas de risco, incluído numa política permanente de habitação, sustentado pela união, estados e municípios.
Como já abordamos em artigos anteriores, a área do saneamento básico, que inclui as atividades de drenagem urbana e proteção contra inundações, integrado com fortes atividades ambientais, necessita urgentemente ser valorizada e intensificada. Teremos mais saúde, segurança, melhor clima, menos poluição, enfim melhor qualidade de vida.
**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.