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Artigo

A fruição da agricultura

Fruir é contemplar o campo como uma obra viva, com autoria múltipla entre natureza, cultura e trabalho

15.maio.2025 às 18h15
São Paulo (SP)
Afonso Peche Filho
Mãos cheias com o arroz agroecológico produzido pelo MST, durante a Festa da Colheita no Assentamento Filhos de Sepé, em Viamão (RS)

Celebrar a colheita, guardar sementes, respeitar as luas e transmitir saberes são formas de fruir a agricultura como expressão cultural viva - Priscila Ramos

A agricultura, historicamente concebida como atividade produtiva essencial à sobrevivência humana, passou a ser compreendida, nos contextos contemporâneos da agroecologia, da filosofia ambiental e dos direitos culturais, como uma prática que transcende sua funcionalidade utilitária. Nesse sentido, emerge o conceito de fruição da agricultura, que amplia os horizontes da compreensão agrícola ao incorporá-la também como uma experiência sensível, estética, simbólica e ética. Tal perspectiva propõe ressignificar o ato de cultivar a terra, deslocando o foco exclusivo da produtividade e eficiência para incluir também o valor da contemplação, do pertencimento e da alegria de viver em relação com os ciclos naturais e os bens comuns da paisagem produtiva.

No campo da estética, a fruição é entendida como o envolvimento sensível do sujeito com a obra ou com o ambiente, permitindo-se afetar por suas formas, cores, ritmos e significados. A agricultura, quando manejada de forma ecológica e respeitosa, gera paisagens que falam à sensibilidade humana, com suas fileiras ondulantes de culturas, florescimento temporão, sons de insetos e o perfume da terra molhada. Essa dimensão estética da agricultura não é mero ornamento, mas expressão da saúde ecológica do agroecossistema e do cuidado do agricultor. Assim, fruir a agricultura é também contemplar o campo como se contempla uma obra viva, com autoria múltipla entre natureza, cultura e trabalho.

A fruição, contudo, não se limita à estética visual. Inclui o cheiro do composto bem maturado, o sabor do fruto colhido no ponto, o som da água infiltrando nas curvas de nível, a textura da palhada sob os pés, o frescor da sombra em agroflorestas, o prazer de tocar um solo estruturado, o silêncio vivo do ecossistema equilibrado. São experiências multissensoriais e emocionais, frequentemente invisibilizadas pelas lógicas industriais da agricultura convencional, que prioriza rendimento, padronização e velocidade. A fruição recoloca o tempo do agricultor em sincronia com os ritmos naturais e com a escuta atenta do ambiente produtivo.

Na dimensão cultural e simbólica, a fruição da agricultura está profundamente ligada à ancestralidade e ao enraizamento humano nos territórios. O ato de plantar é, em muitos povos originários e camponeses, um gesto sagrado, carregado de ritos, cantos, histórias e significados. Celebrar a colheita, guardar sementes, respeitar as luas e transmitir saberes são formas de fruir a agricultura como expressão cultural viva. Ao romper com esses vínculos, a agricultura moderna baseada na monocultura e na externalização de insumos rompe também com a fruição simbólica e espiritual da terra, tornando o cultivo um processo instrumentalizado e despojado de sentidos humanos profundos.

Do ponto de vista ético, a fruição da agricultura propõe uma reconciliação entre o prazer de produzir e a responsabilidade com a vida. Em vez de explorar o solo até a exaustão ou suprimir a biodiversidade em nome da produtividade, a agricultura fruída respeita os limites do ecossistema e valoriza a interdependência entre os seres vivos. A fruição ética se traduz no manejo regenerativo, no solo coberto, na água conservada, na fauna protegida, na equidade entre trabalhadores e na soberania do agricultor sobre suas sementes. Nessa perspectiva, fruir a agricultura é também se alegrar com o bem-estar coletivo que ela pode proporcionar, ao agricultor, à comunidade, à natureza.

Importante ainda é reconhecer a fruição da agricultura como direito social e cultural, conforme sugerido pelas diretrizes da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e de políticas públicas que reconhecem os bens culturais imateriais. Os territórios agrícolas vivos e biodiversos, as feiras, os saberes tradicionais, os modos de vida rurais e as práticas agroecológicas constituem patrimônio cultural e ecológico fruível por toda a sociedade. Proteger e fomentar essas práticas é garantir que a população possa se reconectar com os sentidos mais amplos da agricultura, não apenas como consumo de alimentos, mas como experiência de pertencimento ao mundo.

A fruição da agricultura também possui uma dimensão política. Ao propor a reconexão afetiva e estética com os ambientes produtivos, ela desafia as estruturas de produção baseadas na alienação do agricultor frente ao seu território, no endividamento, no uso intensivo de máquinas e químicos, e na supressão da diversidade. A fruição se opõe à lógica da mercantilização da terra e do alimento, valorizando práticas locais, autônomas, de pequena escala, e que colocam a vida no centro. Como prática política, a fruição reaproxima agricultores e consumidores, território e alimento, cultura e natureza.

No entanto, a fruição não é romântica nem idealizada. Ela exige condições concretas para existir: segurança fundiária, acesso a recursos, políticas públicas que valorizem a agricultura familiar camponesa, urbana e periurbana, investimento em formação técnica agroecológica, preservação dos bens comuns (água, solo, sementes), e espaços de diálogo entre saberes científicos e tradicionais. A fruição da agricultura é uma construção coletiva, que envolve escolhas sociais, éticas e políticas.

Conclui-se, portanto, que a fruição da agricultura é um conceito-chave para a reimaginação da relação entre humanos e paisagens produtivas. Ao integrar os aspectos sensíveis, simbólicos, éticos e políticos da agricultura, esse conceito convida a sociedade a cultivar não apenas alimentos, mas também sentidos, vínculos, alegrias e responsabilidades. Em tempos de crise ecológica, alimentar e social, fruir a agricultura é um ato de resistência, de beleza e de esperança.

* Afonso Peche Filho é pesquisador Científico do Instituto Agronômico de Campinas (IAC).

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.

Editado por: Martina Medina
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