O Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV) formou maioria na Assembleia Nacional e conseguiu eleger quase todos os governadores neste domingo (25). Em uma eleição marcada pelo boicote da oposição, a sigla do presidente Nicolás Maduro conseguiu 82% da Assembleia Nacional, com 93% das urnas apuradas. Ao todo eram 285 cadeiras disputadas. Com isso, o governo terá ampla maioria no Legislativo. Já nos estados, o bloco de esquerda conseguiu 23 governadores de 24 disputados.
A expectativa do governo era ter maioria na assembleia para aprovar a reforma constitucional. A meta do governo é discutir o projeto no começo de 2026 e colocar para que a população vote. Esse é o principal objetivo do governo que, com maioria no Legislativo, terá maioria também na Assembleia Constituinte.
De acordo com o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), os principais nomes eleitos pelo PSUV foram o atual presidente da assembleia, Jorge Rodriguez, a primeira-dama, Cília Flores, além do ex-vice-presidente Jorge Arreaza.
Já a oposição conseguiu eleger 14% de deputados, sendo o principal nome o ex-governador de Miranda Henrique Capriles. Ele foi candidato à presidência em 2012 e 2013, tendo perdido as duas. Capriles se tornou uma das principais lideranças da extrema direita e esteve ao lado da ex-deputada María Corina Machado nos últimos anos, mas rachou a ala direitista em 2025. Enquanto a ultraliberal pedia abstenção, o deputado eleito por Miranda afirmou que é preciso participar das eleições para tentar derrotar o chavismo no voto.
O total de deputados eleitos por cada grupo, no entanto, só será divulgado com 100% das urnas apuradas.
Entre os governadores, a vitória chavista foi ainda mais expressiva. Se antes a oposição tinha 4 estados, agora terá apenas 1. A direita venceu apenas em Cojedes, com o candidato José Alberto Galíndez Cordero, que é o atual governador do estado e conseguiu se reeleger.
As “viradas” da esquerda foram em Barinas, com Adán Chávez, irmão do ex-presidente Hugo Chávez, e em Nueva Esparta, com Marisel Velásquez. A maior surpresa ficou com o estado de Zulia, que era governado por Manuel Rosales, ex-candidato presidencial e tradicional nome da direita venezuelana.
A novidade da eleição ficou por conta do Essequibo. O território disputado entre a Venezuela e a Guiana recebeu pela primeira vez uma eleição de deputados e governador para o lado venezuelano. Com isso, foram 24 governadores eleitos de 25 estados -o Distrito Capital não tem governador e só elege deputados. O candidato do PSUV, Neil Villamizar, venceu na região.
O governo, no entanto, não explicou se pretende ocupar o estado ou se a eleição foi apenas simbólica. Os candidatos não puderam realizar campanha no Essequibo, e a votação sequer aconteceu no território. Ao todo, 21 mil eleitores da cidade de Sifontes, no estado Delta Amacuro, escolheram o governador e os 8 deputados que vão representar a Guiana.
A vitória arrasadora do chavismo nessas eleições foi conquistada menos de 1 ano depois da eleição de Nicolás Maduro para um terceiro mandato. O coordenador da campanha do PSUV e presidente da assembleia, Jorge Rodriguez, celebrou o resultado. De acordo com ele, a estratégia de “territorialização” da campanha deu resultado e mostrou a capacidade de mobilização do chavismo.
“Quem mandou nos provocar? Eles provocaram e fomos para a rua, casa por casa, bairro por bairro, cidade por cidade, escutar a voz daquele que sofria, mas também a voz da esperança. A escutar os projetos, as propostas, os futuros e os sonhos construídos. E agora temos o futuro para o aprofundamento da paz, da revolução, da democracia verdadeira, da democracia do povo, que vocês nos ensinaram em cada casa, em cada encontro”, disse.
Boicote da extrema direita
O discurso de Rodríguez faz referência ao boicote pedido pela oposição de extrema direita. A ex-deputada ultraliberal María Corina Machado fez campanha pela abstenção e pediu que as pessoas não saíssem para votar. A sua coalizão, Plataforma Unitária, adotou o lema “Eu já votei em 28 de julho”, em referência à data das eleições presidenciais de 2024.
Eles questionaram a vitória de Nicolás Maduro no ano passado, mas não apresentaram provas ao acusar o processo eleitoral de “fraude”. Os opositores se apegam a uma lacuna deixada pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) que, até hoje, não divulgou os resultados detalhados das mesas eleitorais de 2024.
O presidente Nicolás Maduro também comemorou a vitória do PSUV. Ele parabenizou também os candidatos da oposição que participaram das eleições e disse que a “vitória espetacular” nos estados mostra o poder de um processo que é chamado pelos chavistas de Revolução Bolivariana.
“Depois de 26 anos de revolução, depois de 32 eleições, de sanções, de bloqueio, fascismo e violência, hoje a revolução bolivariana demonstrou que está mais vigente e forte que nunca. Hoje mostramos o poder do chavismo e do bolivarianismo do século 21. Não é qualquer coisa o que esse povo conseguiu. Resistir, perseverar, criar soluções, inovar, impulsionar um novo projeto”, disse Maduro em discurso depois da eleição.
Abstenção
A oposição de extrema direita conseguiu pautar uma parte significativa do debate público em torno das eleições e contou com o apoio da imprensa opositora nacional e de grande parte das agências de notícias internacionais. O debate em torno da abstenção foi respondido pelo governo, que considerou o número de votantes expressivo. O CNE divulgou que a participação foi de 42,63%, sendo pouco mais de 57,63% de abstenção.
O professor de ciência política da Universidade Central da Venezuela e ex-vice-presidente do CNE, Leonardo Morales, afirma que o CNE cumpriu com toda a responsabilidade e organizou para que as pessoas comparecessem. Para ele, faltou uma campanha para orientar as pessoas em como votar e a abstenção acabou sendo “muito alta”.
“O problema é que, no caso dos países que têm o sistema presidencial, se dá uma atenção maior para a eleição do presidente. Para eleger prefeitos, governadores e deputados, ainda que sejam deputados nacionais, não há tanto entusiasmo quanto a eleição presidencial. O que torna notável a baixa participação eleitoral. Mas há muitos atenuantes que indicam as razões pelas quais a sociedade venezuelana se abstém de participar para eleger governadores e legisladores regionais. Mas essa é a realidade, não podemos inventar outra coisa”, afirmou ao Brasil de Fato.
Uma participação tímida dos eleitores, no entanto, é tradição nas eleições regionais. Em 2012, por exemplo, pouco mais da metade dos eleitores votaram (53.94%). Cinco anos depois, a participação foi maior: 61.05%. Em 2021, a oposição também adotou a estratégia de boicotar as eleições e esse número voltou a cair para 42.26%. Esse dado se repetiu agora.
Morales afirma que essa abstenção acabou sendo determinante no resultado final e é preciso compreender por que houve esse movimento novamente agora. Para ele, a representação do que a sociedade venezuelana pensa hoje não está dividida em uma proporção de 23 estados para o governo e 1 para a oposição, mas que os opositores precisariam ir às urnas para expressar uma visão mais “heterogênea” dentro da sociedade.
“Reflete uma situação muito lamentável. No caso venezuelano, o país não está distribuído entre 23 e 1. A Venezuela está distribuída em uma relação mais heterogênea. Mas bem, a eleição terminou agora e quem analisa os processos eleitorais vão se dedicar a entender o que aconteceu, mas não posso te dar uma resposta contundente a respeito disso”, disse.
O final da eleição estava previsto para às 18h no horário de Caracas, mas foi prorrogado por uma hora para atender as pessoas que ainda estavam nos centros de votação, de acordo com o CNE.