Dezenas de movimentos populares e organizações políticas se reuniram no Centro de Estudos e Ação Social (Ceas), no bairro da Federação, em Salvador, num ato de solidariedade a Solange Moreira e Vanderlei Silva, militantes baianos do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) que foram presos de forma arbitrária no Rio de Janeiro (RJ) no último dia 16. A ação, realizada nessa sexta-feira (23), denuncia a criminalização da luta popular, o aumento da violência no campo e exige a liberdade imediata dos atingidos e fecheiros.
Além do Ceas, estiveram presentes no ato organizações como o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Comissão Pastoral da Terra (CPT-BA), Intervozes, Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais (AATR-BA), Coordenadoria Ecumênica de Serviço (Cese), grupo de pesquisa Geografar, além de professores universitários e intelectuais. Os participantes salientam que a prisão de Solange e Vanderlei é uma prisão política e que visa reprimir a luta dos povos do campo e de comunidades tradicionais por terra, território e direitos.
“Todas essas pessoas são reconhecidas historicamente na região pelo compromisso com a defesa dos territórios tradicionais, das águas, dos direitos humanos e da vida. Trata-se de uma prisão política e de criminalização das comunidades que lutam contra a grilagem de terras e expropriação dos territórios na região Oeste da Bahia”, destaca nota divulgada pelo MAB e diversas organizações políticas que estiveram presentes no ato.
Prisão completa 10 dias
No dia 16 de maio, Solange Moreira Barreto e Silva, camponesa, fecheira, militante do MAB e agente comunitária de saúde, e seu esposo, Vanderlei Moreira e Silva, camponês e fecheiro, estavam viajando a passeio quando foram detidos no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, sem informações sobre acusação contra eles.
Segundo nota do MAB, a Audiência de Custódia dos militantes foi realizada sem que seus representantes legais tivessem acesso aos autos dos processos, o que configura violação de direitos fundamentais à ampla defesa, contraditório e informação. Além disso, o movimento também aponta que outros quatro trabalhadores estão com mandados de prisão em aberto e não sabem a razão das acusações.
Para reportagem do Brasil de Fato, a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, que está acompanhando o caso, informou que “a prisão foi um cumprimento de um mandado de prisão expedido na Bahia, e o juízo da audiência de custódia do Rio manteve a prisão preventiva.” O indicativo é que o caso siga pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), na Vara de Jurisdição Plena da Comarca de Coribe.
Violência no campo
Solange e Vanderlei são moradores da comunidade tradicional de Fundo e Fecho de Pasto de Brejo Verde, em Correntina, no oeste da Bahia. Por meio da nota, o MAB também denuncia que, desde a prisão do casal, a região tem vivido dias de de terror. O rancho do Fecho de Pasto Brejo Verde foi destruído e queimado, policiais militares e civis arrombaram casas sem mandados de busca, ameaçaram familiares dos fecheiros criminalizados e promoveram violência psicológica contra os moradores locais, que estão com medo de circular em sua própria comunidade.
A violência contra povos e comunidades tradicionais em Correntina é histórica. Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), este é o município com mais registros de conflitos na Bahia, tendo 132 ocorrências registradas entre 1985 e 2023. O avanço do agronegócio, ligado diretamente com a grilagem de terras e disputa pela água, está no centro dos conflitos da região.
Em 2017, um levante popular no município marcou as lutas no território. Cerca de mil trabalhadores ocuparam fazendas denunciando a destruição do Cerrado e o consumo desproporcional de água em Correntina. Dias depois, mais de 12 mil pessoas foram às ruas contra a criminalização da luta e em defesa das águas. Diante das mobilizações, o Ministério Público Federal realizou uma audiência pública para debater o uso da água na Bacia do Rio Corrente.