O vice-governador do estado, Matheus Simões, apresentou, no dia 8 de maio, ao legislativo um pacote de propostas para adesão ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag). Entre os projetos de autoria da gestão de Romeu Zema (Novo) pelo menos dois podem afetar diretamente a Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e têm causado preocupação e revolta na comunidade acadêmica.
Segundo Túlio Lopes, presidente da Associação de Docentes da UEMG (Aduemg), a proposta nada tem a ver com uma federalização, como tem defendido o governo.
“Na verdade, não se trata de uma proposta de federalização e representa mais um ataque à autonomia universitária, que, se aprovado, abre a possibilidade de extinção da UEMG. Não existe hoje a possibilidade objetiva de ‘federalizar’ a universidade”, afirma.
UEMG em risco
A instituição, que tem hoje cerca de 22 mil alunos matriculados em 141 cursos de graduação e 37 de pós-graduação, espalhados nas 22 unidades acadêmicas da universidade, está ameaçada pelo Projeto de Lei 3.733/2025, que visa autorizar a transferência para a União dos bens imóveis de autarquias, como é o caso da UEMG.
Opositores à proposta analisam que o discurso falacioso de que seria possível, a partir do Propag, transformar a universidade em uma instituição federal é uma “cortina de fumaça” para a real intenção: acabar com a universidade do estado, repassando seus bens à União ou os vendendo para pagar o adiantamento de 20% do programa.
“O governo Zema quer oferecer os imóveis da UEMG na negociação ou vendê-los e utilizar o recurso. O que nós observamos nos projetos é a ausência de informações e a utilização do Propag para enfiar um modelo que não tem nada a ver com o programa. Acabar com a universidade estadual não é o objetivo do Propag”, avalia a deputada estadual e presidente da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Beatriz Cerqueira (PT).
Ainda na avaliação de Cerqueira, o que o governo quer é uma autorização genérica para definir as condições de venda como bem entender, uma vez que não enviou à ALMG informações, como a avaliação dos imóveis ou a relação dos imóveis que ele pretende entregar.
Lopes explica ainda que, para atingir esse objetivo, o governo Zema precisaria acabar com a reitoria e a estrutura jurídica-administrativa da universidade, uma autarquia criada pela Constituição Estadual de 1989 e que hoje tem gestão financeira e patrimonial autônoma, conforme estabelece a Constituição Federal (Artigo 207) e a Constituição Estadual (Artigo 199).
“O PL é uma privatização disfarçada. O governo Zema demonstra total descompromisso com o ensino superior público e com a nossa universidade. Não vamos aceitar o fim da gestão da UEMG e a transferência forçada de nossos cursos e estudantes”, protesta o professor.
A UEMG vale muito mais para o povo mineiro
Caso aprovadas, as propostas de lei tendem a gerar uma situação de total insegurança jurídica para toda a comunidade acadêmica, composta ainda por 1,7 mil professores, 600 técnicos e analistas administrativos.
“Não seremos mais UEMG, perderemos nossa autonomia, identidade e pertencimento. Temos uma série de políticas educacionais próprias e construímos, ao longo de mais de três décadas, nossa universidade pública, popular, gratuita e de qualidade” afirma o presidente da Aduemg.
O mesmo vale para os mais de 20 mil estudantes, que participaram de processos seletivos, ingressaram e estão matriculados na UEMG, que é hoje a terceira maior universidade de Minas Gerais, e correm o risco de ter o diploma de uma instituição que pode ser extinta.
O docente pontua ainda que os projetos foram encaminhados de forma autoritária, sem nenhum diálogo ou aviso prévio à comunidade acadêmica, que foi pega totalmente de surpresa pela proposta.
“O governo afirmou que o patrimônio da UEMG vale cerca de R$ 500 milhões. A UEMG é patrimônio do povo trabalhador mineiro e seu ‘valor’ não pode ser mensurado pelo capital especulativo imobiliário”, afirma Túlio Lopes.
É mentira que os servidores podem se tornar federais
Outra falácia difundida pelo vice-governador em entrevista é a possibilidade de que os servidores estaduais passem a ser servidores federais, o que, a princípio, gerou certa esperança naqueles que trabalham na universidade, já que recebem do governo do estado os piores salários do Brasil para docentes, analistas e técnicos universitários, como explica a presidenta da comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da ALMG.
“Os profissionais não podem, constitucionalmente, ser absorvidos pelo governo federal. Eles não se tornam servidores federais, isso no caso dos efetivos. Os contratados ficam sumariamente desempregados, são demitidos “, aponta Beatriz Cerqueira.
Visão com a qual corrobora Lopes. Segundo ele, a tendência a curto prazo é a demissão dos contratados e a cessão de parte dos efetivos a outras instituições ou fundações.
“Não existe a possibilidade objetiva de servidores públicos estaduais passarem a ser servidores públicos federais. A legislação atual não permite essa alteração e qualquer modificação não será feita de forma imediata, na canetada ou em um passe de mágica”, explica o presidente da Aduemg.
Ataques à universidade
Mateus Simões esteve na ALMG acompanhado de secretários do estado. Posteriormente, em nota, o governo de Minas reiterou “seu compromisso com a educação pública e com a valorização do ensino superior no estado”. Porém, para a oposição, essa afirmação só pode se referir ao ensino superior privado, que seria o principal beneficiado com a desintegração ou extinção da UEMG.
“O que isso demonstra? Que o governo nunca se importou com uma universidade pública que serve de forma grandiosa a população nos quatro cantos deste estado”, afirma Cerqueira.
Para ela, a situação fica ainda mais grave porque a legislação determina também que a venda desse patrimônio pode acontecer com um desconto de até 45% do valor avaliado. Por fim, a deputada informa que a Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia deve promover audiência pública sobre o tema na terceira semana de junho.
O outro lado
O Brasil de Fato MG entrou em contato com o governo de Minas para comentar sobre as denúncias, mas não obteve respostas até a publicação desta matéria.