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‘Regular plataformas é urgente e dificílimo’, diz especialista sobre IA e uso de dados

Grandes empresas 'raspam' e utilizam dados da internet, inclusive sensíveis, para treinar IAs generativas

O avanço das inteligências artificiais (IAs) exige atenção e regulamentação urgente, defende a pesquisadora Paula Martini, especialista em tecnologia e sociedade, em entrevista ao BdF Entrevista, da Rádio Brasil de Fato. Com mais de 25 anos de atuação na área, ela alerta para os desafios éticos, políticos e sociais trazidos pela utilização massiva dessas ferramentas.

“Regular essas plataformas é urgente e, ao mesmo tempo, dificílimo de fazer”, afirma Martini, referindo-se à forma como grandes empresas “raspam” e utilizam dados da internet, inclusive sensíveis, para treinar IAs generativas, como o ChatGPT. “Se você subiu a foto do seu filho de cinco anos na rede social, potencialmente, dentro do termo de uso, você já está autorizando que esses dados sejam usados para treinar uma inteligência artificial”, exemplifica. “Tudo que você escreveu, postou, pode ser usado para treinar uma inteligência artificial. Não à toa, a Meta é dona da maior base de dados e informações do planeta”, destaca.

Martini explica que o banco de dados das IAs se formam a partir do cruzamento desses “dados articulados”, gerando algoritmos que individualizam as respostas. “São dados que relacionam quem nós somos com o que gostamos, desejamos”, indica. “As IAs nunca vão responder que não sabem. […] Elas sempre vão responder com muita assertividade e com muita propriedade, ainda que elas estejam alucinando”, pontua. “A IA não tem compromisso com a verdade. […] As IAs são treinadas para não criar atrito. Elas sempre vão entregar o que queremos ouvir”, revela.

Por isso, a especialista reforça, o que entra nos sistemas, e de onde essas informações vêm, importa tanto quanto o que se recebe de volta. Um exemplo dado por Martini envolve a IA da Google, que, ao ser treinada com dados do fórum Reddit, sugeriu o uso de cola branca na pizza como forma de fixar o queijo. “Isso aconteceu. Já saiu do ar, mas chega a ser uma piada no fim das contas. É um exemplo do tipo de resposta que pode vir”, diz. Ela recomenda a checagem de todas as informações concedidas pelas IAs.

Criatividade e repertório na era da IA

No que diz respeito ao trabalho, Martini vê um cenário de transição crítica. “Qualquer transformação específica que surja pode ser uma lapada em um setor de trabalho”, aponta. Ela cita o caso recente da Meta, que passou a oferecer campanhas publicitárias geradas por IA, ameaçando postos em agências de comunicação. “Quanto mais qualificado o profissional estiver para usar essas ferramentas como copiloto, e não como senhor da sua atuação, melhor”, afirma.

Para ela, a criatividade é a chave de resistência frente à padronização provocada pelas respostas automatizadas das IAs. “A criatividade é uma atribuição inata humana. Então, para não nos tornarmos mais obsoletos do que já estamos nos tornando, incentivo que trabalhemos o nosso repertório, a nossa criatividade”, defende.

Para ouvir e assistir

BdF Entrevista vai ao ar de segunda a sexta-feira, sempre às 21h, na Rádio Brasil de Fato98.9 FM na Grande São Paulo. No YouTube do Brasil de Fato o programa é veiculado às 19h.

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