Ouça a Rádio BdF
Saúde Mental e Militância no Distrito Federal (SMM-DF) é um grupo vinculado ao Instituto de Psicologia da UnB, que visa potencializar a militância no campo da saúde mental; fomentar a abordagem da ...ver mais

Maio se foi, mas o caos na saúde mental do DF continua, assim como a luta

O caos na saúde (e na saúde mental) do DF não é uma crise, mas um projeto

Em maio, comemoramos o Dia da Luta Antimanicomial (no dia 18), aproveitando a data para fortalecer a luta por uma sociedade sem manicômios. Quem acompanha essa coluna sabe que pouco temos a comemorar, e muito temos a lutar. Vivemos um cenário de múltiplos retrocessos que perpassam a saúde mental, mas que estão para além dela. Além disso, se a luta é por uma vida mais humanizada e, portanto, por mais e melhor saúde mental, rompendo com qualquer instrumento de violência, de opressão (como são os manicômios), ela não se resume a um dia ou a um mês. 

Vivemos no Distrito Federal (DF) uma realidade ainda mais temerária. Há um caos na saúde, provocado por opções políticas do Governo Ibaneis-Celina. Na saúde mental, não é diferente. Não cansamos de denunciar aqui e em vários outros locais como é possível, por exemplo, na capital do país, ainda termos o Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), um manicômio público e ilegal (há 25 anos)? 

Aliás, aproveitamos para afirmar que mesmo o plano de fechamento dos leitos do HSVP está sendo prorrogado pela Subsecretaria de Saúde Mental (Susam). Para se ter uma ideia, a primeira versão do plano colocava o fechamento de 20 leitos da enfermaria para fevereiro. Depois, prorrogou-se para abril. Enquanto isso, o pronto-socorro do HSVP continua aberto, numa flagrante violação de leis, e indo na contramão do SUS e da Reforma Psiquiátrica. Desde o final do ano passado, tivemos as mortes de duas mulheres no HSVP, Raquel França de Andrade, no Natal de 2024, e Eva de Oliveira Silva, no dia 22 de abril, em situações muito parecidas e igualmente repudiáveis.

Para piorar, o governador acaba de informar que construirá mais sete Unidade de Pronto Atendimento (UPAs), todas elas geridas pelo Instituo de Gestão Estratégica de Saúde do Distrito Federal (Iges), sendo que um dos principais problemas da gestão da saúde do DF tem sido o Iges e o que ele representa em termos de terceirização da política.

Nisso, ao invés de fortalecer a atenção básica, fortalece uma política sem planejamento, que fragmenta o cuidado e pode fortalecer ainda mais os gargalos assistenciais. Por que não criar mais Unidade Básica de Saúde (UBS),  potencializando o cuidado territorial, a prevenção e a promoção de saúde? Mesmo no nível hospitalar, por que não abrir mais leitos em hospitais gerais, inclusive de saúde mental? Com isso, deixamos nítido que não somos contrários à existência de mais serviços no Sistema Único de Saúde (SUS). A questão é fazer isso sem o devido planejamento e com ações que vão na contramão da própria organização do SUS. 

Ainda mais temerário é o referido anúncio sem o movimento de ampliação do número de servidores, por meio de concursos, muito menos de melhorias nas condições de trabalho daqueles que já estão na ativa. Estamos vendo, aliás, de maneira recorrente, o desespero da população com o caos na saúde, só que se voltando contra trabalhadores da saúde, que estão em situações de trabalho igualmente desesperadoras, cada vez mais precárias. A culpa, portanto, não é das e dos trabalhadores, mas do governo Ibaneis-Celina. Como tentativa de limpar a sua barra, o governo anuncia uma medida populista que não vai no cerne dos problemas da saúde do DF. Pelo contrário, ela pode intensificá-los, reforçando ainda mais o seu projeto de terceirização e privatização.

Sabemos que o problema na saúde do DF e, nela, na saúde mental, não é falta de dinheiro. O orçamento do Distrito Federal para a saúde para 2025 é de aproximadamente R$ 14,5 bilhões, considerando o somatório de recursos próprios e do Fundo Constitucional.

É inadmissível que com todo esse montante nós tenhamos uma Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) tão precária: a segunda pior cobertura de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) de todo o Brasil; só temos um Serviço Residencial Terapêutico (SRT), uma Unidade de Acolhimento (UA); os leitos em hospitais gerais em números insuficientes; e não temos nenhum Centro de Convivência, entre outros problemas.

Certa vez, o grande Darcy Ribeiro falou que a crise da educação no Brasil não era uma crise, mas um projeto. Da mesma forma, o caos na saúde (e na saúde mental) do DF não é uma crise, mas um projeto. Um projeto de precarização e privatização (por meio de processos de terceirização). No meio disso, encontra-se a população do DF: desassistida e desrespeitada.

Por isso, reiteramos que nossa luta continua. O mês de maio se foi, mas o caos na saúde mental do DF continua, assim como a luta por um DF que respeite a sua população, que cuida da sua saúde mental. A luta por um DF e uma sociedade sem manicômios é todo dia!

Pelo fechamento do HSVP!

Por um DF sem manicômios!

:: Leia outros textos desta coluna aqui ::

*Pedro Costa é membro do Grupo Saúde Mental de Militância do Distrito Federal UnB.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

:: Receba notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::

Veja mais