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Política de ‘guerras às drogas’ põe comunidades tradicionais em risco, avaliam pesquisadoras

Estudo demonstra que saída passa por política de redução de danos, atuação do Estado e mais direitos sociais

Reunindo 17 artigos de especialistas de diversas áreas do conhecimento, foi lançada neste ano a edição especial da revista Platô Intersecção: uso da terra, política de drogas e justiça climática.

A publicação destaca a necessidade de uma abordagem interseccional para pensar a política antidrogas vigente no Brasil, considerando, em especial, os impactos nos territórios tradicionais e periféricos e a emergência climática.  

Um dos textos presentes na edição recebe o título de Saúde e redução de danos: impactos da proibição das drogas sobre o bem viver das comunidades tradicionais. Paula Callegario, bióloga e caiçara do município de Paraty (RJ), e Helena Fonseca Rodrigues, psicóloga e mestre em saúde coletiva,  — ambas autoras do estudo — avaliam que a atual política brasileira, além de não resolver o “problema” das drogas, cria mais dificuldades. 

“É um ciclo que não tem escapatória. Enquanto houver essa política de criminalização, as comunidades estarão cada vez mais em situações de risco”, afirma Callegario ao Conversa Bem Viver

Para elas, a alternativa passa por construir uma robusta política de redução de danos, maior cuidado com os territórios por parte do Estado, e garantia de direitos sociais. 

“Ao contrário do que muita gente diz, redução de danos não é incentivar o uso, mas entender que o uso existe e, a partir disso, orientar práticas que tragam menos prejuízos às vidas das pessoas”, defendem

 A Intersecção é fruto de uma colaboração entre a Iniciativa Negra, a Plataforma Brasileira de Política de Drogas e a International Coalition on Drug Policy Reform and Environmental Justice.

Confira a entrevista completa:

Brasil de Fato – Como vocês caracterizam a política de drogas vigente no Brasil e por que precisamos debater esse tema de forma articulada com outros temas?

Helena Fonseca Rodrigues A política de drogas no Brasil, até por recomendação de organismos internacionais, é a política da proibição, é a política da guerra às drogas. Mas estamos há anos assistindo as drogas vencerem essa guerra.

Essa política não tem resolvido os problemas relacionados ao abuso de substâncias e, pelo contrário, acaba os exacerbando e trazendo consequências em diversas esferas e setores da sociedade.

A grande novidade trazida pela revista Intersecção é justamente apresentar como essa política proibitiva traz impactos importantes para o meio ambiente e para as comunidades e povos tradicionais do Brasil.

Por que o proibicionismo traz malefícios para as comunidades tradicionais brasileiras e como essa política impacta na construção do “bem viver”, defendido pelos povos originários?

Paula Callegario – O bem viver, para os povos originários, é viver em consonância com os recursos naturais, com a natureza, com a mãe terra. Para  as comunidades caiçaras, por exemplo, é você poder pescar, ter saúde, ter educação e viver no seu território tendo uma vida digna.

É ter o direito a uma vida que todo mundo deveria ter, com direitos garantidos, saneamento, e sem poluição, porque as comunidades vivem dos recursos da natureza. Eu detesto o termo meio ambiente, porque ele separa, mas a gente não é separado. Somos um ambiente só. É sobre você estar no lugar do ambiente, viver dele, viver bem, com dignidade, cuidado e tranquilidade. Os povos originários falam muito sobre o fato de que, se o ambiente está ruim, nós ficamos doentes também. Não estou falando sobre viver com luxo, mas de viver feliz.  

Vivemos uma política proibicionista de drogas, mas que joga a população para trabalhar com as drogas. Porque os direitos são negados. As comunidades caiçaras são expulsas dos seus territórios e vão para áreas periféricas porque têm os seus direitos negados. Muitas pessoas não têm ensino fundamental e médio completos. Faltam atendimento médico e saneamento também. O que tem é um turismo em massa e especulação imobiliária, que trazem o tráfico de drogas para as comunidades. 

Essas comunidades passam a sofrer também com a inserção da polícia na guerra às drogas. E aí você tem, por exemplo, pessoas que têm as suas casas incendiadas por facções. É um ciclo que não tem escapatória. Enquanto houver essa política de criminalização, as comunidades estarão cada vez mais em situações de risco. 

Ao mesmo tempo, somos nós, caiçaras, que protegemos a Mata Atlântica que sobrevive no Sudeste. Não são os grandes empreendimentos. Mas somos nós que somos mortos todas as semanas. 

Como a pesquisa ajuda a relacionar todos esses pontos ao atual cenário de guerra às drogas no Brasil?

Helena Fonseca Rodrigues Um elemento importante é entender que o bem viver, esse modo de vida atravessado por pressões do capital, nos garante a preservação ambiental e da biodiversidade.

Muitas vezes, a mudança climática é imputada ao modo de vida humano na terra, mas precisamos rever isso. Não é o modo de vida de todos os humanos que está contribuindo para a depredação e violência em área de floresta. É a pressão do capital.

Dentro da política de drogas, a gente observa isso da mesma forma. O capital está pressionando, criminalizando, o modo de vida tradicional. É uma teia complexa de pressão do capital, junto ao proibicionismo, que acaba afetando o bem viver dessas comunidades tradicionais. 

Por isso, é necessário um olhar mais ampliado. Quando observamos a região amazônica, a falta de um olhar mais aguçado sobre a proteção das terras desses povos e comunidades tradicionais é o que coloca elas numa situação de vulnerabilidade diante dessas muitas criminalidades que percorrem esses espaços. O tráfico de drogas é mais um elemento. 

Existem relatos de toneladas de pasta base de cocaína enterradas em território indígena,  não porque os indígenas foram enterrar, mas porque é uma área que está sendo pouco vista e pouco cuidada pelo Estado.

Tudo isso contribui para as mudanças climáticas e para a extinção de uma série de biomas e formas de vida.

Quais soluções podemos apontar para superar esse contexto?

Helena Fonseca RodriguesSou militante do SUS, psicóloga que vem da área do cuidado e atenção com as pessoas que sofrem com problemas relacionados ao abuso de substâncias. Nesse campo, a gente tem como prática a redução de danos.

Ao contrário do que muita gente diz, redução de danos não é incentivar o uso, mas entender que o uso existe e, a partir disso, orientar práticas que tragam menos prejuízos à vida das pessoas. 

A  Intersecção traz essa provocação de pensarmos em estratégias ampliadas de redução de danos, não como uma ação individual de cuidado, mas que olhe a redução de danos como uma forma de superar os danos dessa guerra nefasta às drogas.

Paula Callegario – Precisamos acabar com a política de guerra e criminalização. É necessário reconhecer também o uso tradicional de algumas plantas. A coca, por exemplo, é uma planta andina e amazônica, que é usada por porcos originários andinos há milênios. 

O Estado também precisa estar mais presente, combatendo o desmatamento ilegal para aeroportos,  fiscalizando os condomínios, estacionamentos de helicópteros de luxo, etc,  porque esses lugares não são fiscalizados.

Também precisamos ter os nossos direitos garantidos nas comunidades. 

Conversa Bem Viver

Em diferentes horários, de segunda a sexta-feira, o programa é transmitido na Rádio Super de Sorocaba (SP); Rádio Palermo (SP); Rádio Cantareira (SP); Rádio Interativa, de Senador Alexandre Costa (MA); Rádio Comunitária Malhada do Jatobá, de São João do Piauí (PI); Rádio Terra Livre (MST), de Abelardo Luz (SC); Rádio Timbira, de São Luís (MA); Rádio Terra Livre de Hulha Negra (RN), Rádio Camponesa, em Itapeva (SP), Rádio Onda FM, de Novo Cruzeiro (MG), Rádio Pife, de Brasília (DF), Rádio Cidade, de João Pessoa (PB), Rádio Palermo (SP), Rádio Torres Cidade (RS); Rádio Cantareira (SP); Rádio Keraz; Web Rádio Studio F; Rádio Seguros MA; Rádio Iguaçu FM; Rádio Unidade Digital ; Rádio Cidade Classic HIts; Playlisten; Rádio Cidade; Web Rádio Apocalipse; Rádio; Alternativa Sul FM; Alberto dos Anjos; Rádio Voz da Cidade; Rádio Nativa FM; Rádio News 77; Web Rádio Líder Baixio; Rádio Super Nova; Rádio Ribeirinha Libertadora; Uruguaiana FM; Serra Azul FM; Folha 390; Rádio Chapada FM; Rbn; Web Rádio Mombassom; Fogão 24 Horas; Web Rádio Brisa; Rádio Palermo; Rádio Web Estação Mirim; Rádio Líder; Nova Geração; Ana Terra FM; Rádio Metropolitana de Piracicaba; Rádio Alternativa FM; Rádio Web Torres Cidade; Objetiva Cast; DMnews Web Rádio; Criativa Web Rádio; Rádio Notícias; Topmix Digital MS; Rádio Oriental Sul; Mogiana Web; Rádio Atalaia FM Rio; Rádio Vila Mix; Web Rádio Palmeira; Web Rádio Travessia; Rádio Millennium; Rádio EsportesNet; Rádio Altura FM; Web Rádio Cidade; Rádio Viva a Vida; Rádio Regional Vale FM; Rádio Gerasom; Coruja Web; Vale do Tempo; Servo do Rei; Rádio Best Sound; Rádio Lagoa Azul; Rádio Show Livre; Web Rádio Sintonizando os Corações; Rádio Campos Belos; Rádio Mundial; Clic Rádio Porto Alegre; Web Rádio Rosana; Rádio Cidade Light; União FM; Rádio Araras FM; Rádios Educadora e Transamérica; Rádio Jerônimo; Web Rádio Imaculado Coração; Rede Líder Web; Rádio Club; Rede dos Trabalhadores; Angelu’Song; Web Rádio Nacional; Rádio SINTSEPANSA; Luz News; Montanha Rádio; Rede Vida Brasil; Rádio Broto FM; Rádio Campestre; Rádio Profética Gospel; Chip i7 FM; Rádio Breganejo; Rádio Web Live; Ldnews; Rádio Clube Campos Novos; Rádio Terra Viva; Rádio interativa; Cristofm.net; Rádio Master Net; Rádio Barreto Web; Radio RockChat; Rádio Happiness; Mex FM; Voadeira Rádio Web; Lully FM; Web Rádionin; Rádio Interação; Web Rádio Engeforest; Web Rádio Pentecoste; Web Rádio Liverock; Web Rádio Fatos; Rádio Augusto Barbosa Online; Super FM; Rádio Interação Arcoverde; Rádio; Independência Recife; Rádio Cidadania FM; Web Rádio 102; Web Rádio Fonte da Vida; Rádio Web Studio P; São José Web Rádio – Prados (MG); Webrádio Cultura de Santa Maria; Web Rádio Universo Livre; Rádio Villa; Rádio Farol FM; Viva FM; Rádio Interativa de Jequitinhonha; Estilo – WebRádio; Rede Nova Sat FM; Rádio Comunitária Impacto 87,9FM; Web Rádio DNA Brasil; Nova onda FM; Cabn; Leal FM; Rádio Itapetininga; Rádio Vidas; Primeflashits; Rádio Deus Vivo; Rádio Cuieiras FM; Rádio Comunitária Tupancy; Sete News; Moreno Rádio Web; Rádio Web Esperança; Vila Boa FM; Novataweb; Rural FM Web; Bela Vista Web; Rádio Senzala; Rádio Pagu; Rádio Santidade; M’ysa; Criativa FM de Capitólio; Rádio Nordeste da Bahia; Rádio Central; Rádio VHV; Cultura1 Web Rádio; Rádio da Rua; Web Music; Piedade FM; Rádio 94 FM Itararé; Rádio Luna Rio; Mar Azul FM; Rádio Web Piauí; Savic; Web Rádio Link; EG Link; Web Rádio Brasil Sertaneja; Web Rádio Sindviarios/CUT.

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