Ex-ministro dos Direitos Humanos e integrante eleito do Comitê sobre Desaparecimentos Forçados da Organização das Nações Unidas (ONU), Paulo Vannuchi alerta para o avanço da extrema direita dentro das instituições democráticas. “A ultradireita, o facismo, parou de atacar a democracia só pelos canais do tanque de guerra. Entra dentro, forma um partido como o PL, cria um candidato como o [ex-presidente Jair] Bolsonaro e tenta destruir a democracia por dentro”, relata, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato.
Vannuchi foi eleito na semana passada para integrar o Comitê sobre Desaparecimentos Forçados da ONU. O grupo é composto por dez membros com a função de receber denúncias e investigar casos de desaparecimentos, tanto em casos de regimes autoritários do passado, quanto de casos mais atuais.
Ao comentar o papel dos Estados Unidos nas violações de direitos de imigrantes, Vannuchi denuncia a prática de desaparecimentos dentro do sistema migratório, com pessoas sendo enviadas para prisões em outros estados ou até mesmo outros países. “Os Estados Unidos nasceram com uma declaração de direitos, e até hoje ostentam uma imagem de defensores dos direitos humanos, mas desacatam todas as decisões da ONU”, diz.
Segundo ele, o país se nega a ratificar convenções internacionais sobre desaparecimento forçado, mesmo sendo responsável por graves violações contra migrantes. “Os Estados Unidos, espertamente, estimulam, fazem os países da ONU criar as convenções, mas eles não se submetem”, critica. “Mas a pressão política, moral e ética vai ser feita”, completa.
O ex-ministro aponta ainda que a migração passou a ser um dos temas centrais do comitê da ONU que passa a integrar, e descreve como o endurecimento das fronteiras nos EUA alimenta o tráfico humano e chacinas no trajeto até o país. “Quando começava a chegar a 30 quilômetros da fronteira, no meio do deserto, parada pra lanche. E, na verdade, metralhavam todo mundo”, exemplifica.
Desaparecimentos na ditadura militar
Vannuchi também destaca a importância do julgamento de casos de desaparecidos durante a ditadura militar brasileira. Ele acredita que o Supremo Tribunal Federal (STF) deve rever, ainda este ano, a jurisprudência que blinda torturadores e responsáveis por desaparecimentos. “Os casos de Rubens Paiva, Honestino Guimarães, dos guerrilheiros do Araguaia… eles sabem onde foram exterminados ou enterrados, e não contam até hoje com a conivência de altas autoridades militares”, denuncia.
Segundo ele, a responsabilização pelos crimes cometidos na ditadura e durante os atos golpistas de 8 de janeiro é essencial para garantir a sobrevivência da democracia no Brasil. “O 8 de janeiro também traz esse benefício. Ele mostra que o fato do Brasil não ter criado um muro de contenção pra conter essas bestas feras faria com que elas voltassem, e elas voltaram”, aponta.
Quando tinha 20 anos, militante contra a ditadura, Vannuchi ficou preso por cinco anos, mas antes passou três semanas desaparecido. “Ninguém sabia onde eu estava, minha família desesperada me procurando. Isso aconteceu com Dilma [Rousseff], aconteceu com José Genoino, com milhares de lutadores daquela época”, relembra.
Para ouvir e assistir
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