O novo Sol nasceu e, como um ato de amor, a Terra sussurrou mais uma vez sua sabedoria neste Inti Raymi, o solstício de inverno. A escutamos em milhares de vozes, de companheiros, flores, pássaros, ondas, vento, chuva, luz, junto a todos os povos que celebram este novo ciclo.
O Inti Raymi é uma celebração solar e é uma oportunidade de receber a luz, bem como contemplar sua ausência com sobriedade. O solstício de inverno nos convida a mergulhar no coração fértil e escuro, onde toda a luz se gesta. Esta é a hora da descida ao mais íntimo, onde habita a voz de Pachamama.
“No princípio era o Verbo”, dizem alguns, mas os andinos sabem que, antes da palavra, foi o Raio: aquele que divide o céu e fecunda a terra. E hoje, esse mesmo raio procura você… para lembrá-lo de quem você é.

Você já sentiu aquele calor que nasce no peito quando o primeiro raio do amanhecer acaricia seu rosto? É o momento em que aquele que brilha no céu e aquele que arde em nosso peito se reconhecem.
Como nos tempos de Pachacútec, quando o Inca ordenou que o mundo celebrasse este casamento sagrado:
– O Sol de Fora que amadurece os milharais;
– O Sol de Dentro que germina nossa essência.
Na certeza de que, ao dançar em Ayllu, algo em nosso peito se reordenará para sempre. Para ouvir a voz de Pachamama, silenciamos não apenas o ruído do mundo, mas principalmente o da personalidade dispersa. Assim como o amante precisa de tempo e presença para encontrar sua amada, é necessário despojar-se do vício da vertigem interna para entrar em comunhão com Ela.

A devoção não é um ato pontual nem uma emoção passageira. É um ritmo de vida presente em cada respiração, em cada passo que damos sobre a Terra. É a Magia Planetária que nasce do compromisso diário com a consciência desperta, o serviço e o cuidado.
Dentre os muitos momentos que marcaram o maravilhoso Inti Raymi da Nación Pachamama, de 20 a 22 de junho, na Ilha do Mel (PR), uma imagem particularmente tocou os corações: a oferenda andina (pago) sendo conduzida com uma mama e maestra e, no seu colo, o filho, que não por acaso se chama Salvador.

A força do feminino que está em toda a Vida, lembrava-nos com aquela imagem, as demandas do novo tempo, assentadas em valores femininos de cuidado, fertilidade, acolhimento e amor incondicional. O pequeno Salvador, com sua inocência e um caminhar aberto a todas as possibilidades, soprava que o masculino que nos guia há milhares de anos deve aprender com o princípio feminino para sustentar a vida no planeta, que nunca esteve tão ameaçada como agora.
Ao abraçar estas energias complementares, não se trata de fazer muito, mas de fazer com sentido grupal. Porque a Mistika Viva é serviço: serviço à vida, ao equilíbrio, a todos os seres que são nossos companheiros nesta travessia, de todos os reinos. Este serviço nasce dentro de nós; encontramo-nos no templo interior onde Ela nos espera.

Porém, estamos prontos para deixar que o Tayta Inti e nosso Sol interior se fundam em um único canto?
Aqui, nossa alma fragmentada se recompõe ao ritmo dos huaynos e das oferendas, nessa operação mágica chamada Animu Waqyay: o chamado que cura, que integra, que devolve o que foi perdido.
Cada Inti Raymi é único, não é apenas memória. É o fogo que acende o Sonqo Miski (o Coração Doce) e a porta que se abre para que a Graça inunde nosso ser: uma Oda de Luz a la Madre.
O Bom Viver não é um objetivo individual, mas uma forma de habitar a comunidade universal. Este novo ciclo pede-nos isso: reordenar as nossas prioridades e voltar a treinar a nossa atenção. Temos de aprender a parar, a contemplar, a não fazer.
Se não vivemos no cotidiano de forma concreta o amor que dizemos ter pela Pachamama, de que serve nosso discurso espiritual?
O convite agora é beber da influência do solstício, entrando em silêncio meditativo e procurando dentro de nós quais obstáculos precisamos vencer para dar um salto em direção ao mundo que queremos e sonhamos, com propósito e sentido, ancorado no plano de luz e amor.

Neste novo ciclo, te convidamos a orar não apenas com palavras, mas com atos cotidianos de disposição para que a vida te toque, te leve, te guie. Que cada dia comece com uma pergunta sagrada: como posso hoje devolver à Terra o amor que recebo?
Vamos juntos servir, criar milhares de iniciativas para o Dia de Pachamama, 1° de agosto, com confiança e alegria! Confia, coração! Aquele que se entrega a Ela sem reservas será levado pela mão até o Sagrado Coração da Vida.
E levaremos em nossas mãos e corações o “maná de Luz” e a força renovada para caminhar com alegria imparável. “No solstício, o Sol exterior e o Sol interior se beijam… e desse encontro nasce a Esperança do Mundo.”
Venceremos!
* Ativistas da Nación Pachamama
** Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.