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Ativista político e social. Autor dos livros ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada contra Lula e o PT’ (2019) e ‘A Saída é pela Esquerda’ (2020).

Governo Lula III – O colapso da frente ampla; E agora?

A saída realista da atual encruzilhada política é pela esquerda

O episódio da votação na semana passada que derrubou os decretos do governo federal do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado, deixou evidente a implosão da chamada “base aliada” de Lula no Congresso.

O placar da votação, 383 votos contra e apenas 98 votos a favor da medida governista é reveladora das dificuldades políticas do presidente Lula e do colapso da política de alianças desenvolvida pelo governo no atual mandato.

Nos últimos meses, nenhuma medida relevante para o povo trabalhador foi aprovada pelo Congresso, sob comando da dupla Alcolumbre e Hugo Motta. Ao contrário, o parlamento abertamente usurpou as atribuições do Executivo e aplica uma agenda regressiva em toda linha, de favorecimento dos mais ricos e do rentismo.

Há um claro sentido político na operação dos partidos do extremo centro neoliberal – União Brasil, PP, Republicanos, PSD, parte do MDB – e da extrema direita bolsonarista, empurrar o governo Lula para aplicar o mais duro ajuste fiscal no lombo dos trabalhadores, das pessoas com menor renda e mais vulneráveis.

Esses partidos, junto da mídia corporativa empresarial, querem radicalizar o arcabouço fiscal do ministro da Fazenda Fernando Haddad. Uma agenda mortífera para as pretensões de reeleição do presidente Lula, defendem uma orgia de cortes no andar de baixo: mais cortes na concessão do BPC-LOAS, excessiva burocratização e critérios impeditivos para concessões de novas aposentadorias no INSS, contingenciamento brutal nas verbas obrigatórias para a Educação e a Saúde.

Enquanto isso, a sangria do país continua… Quase um trilhão de reais seguirá para as mãos dos bilionários e agiotas do mercado financeiro em 2025, com os atuais juros siderais de 15% praticados pelo Banco Central. E no Congresso Nacional, o baile prossegue com a farta distribuição das emendas parlamentares, uma anomalia instituída pelo governo bolsonarista, onde metade do Orçamento Nacional foi capturado pelo parlamento. Nessa montanha de dinheiro para o andar de cima, a palavra cortes não existe no vocabulário.

Encruzilhada

A tentativa política dos articuladores do governo no Congresso de “acender uma vela para Deus e outra para o Diabo” foi para o beleléu, ou flopou – para usar uma expressão mais atual.

Os partidos da direita neoliberal e do extremo centro projetam um novo cenário político – com a proximidade da prisão de Jair Bolsonaro e a crescente queda de popularidade do presidente Lula -, e articulam, fomentam, a candidatura do governador bolsonarista de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Ou seja, são dois movimentos políticos combinados, daí o esfarelamento da “frente ampla”. É uma tendência em curso, que demanda uma nova conduta do governo e da esquerda, mais combativa e menos conciliadora, no tabuleiro da disputa política.

A questão do momento: É possível romper o cerco das direitas e dos ricaços? O governo ainda reúne condições políticas para reorientar as alianças e mudar a agenda econômica, fundamentada no Arcabouço Fiscal? São questões políticas que exigem a adoção de um novo rumo, um giro à esquerda do governo Lula e do Partido dos Trabalhadores (PT), que neste próximo domingo (6) vai eleger os seus dirigentes em todos os níveis.

Se é verdade que a situação demanda sangue frio e cálculo político, uma coisa é certa: ficar insistindo nas mesmas ilusões de alianças com o Centrão e congêneres, é chover no molhado. O relógio do tempo político já corre na direção de 2026.

Portanto, é hora de reagir, de convocar a sociedade, esclarecer que esta derrota não é apenas sobre aumento do IOF. A votação no Congresso mostrou que a justiça tributária será resultado da pressão popular organizada. Mais: a esquerda precisa retomar a iniciativa política com os movimentos sociais nas ruas; o governo estancar a política nefasta de juros, conter qualquer tentativa de cortes nos programas sociais e demitir os ministros sabotadores; Lula precisa falar ao povo diretamente e liderar o enfrentamento aos golpistas neoliberais e da extrema direita.

A saída realista da atual encruzilhada política é pela esquerda.

*Milton Alves é colunista em diversos sites e portais da mídia progressista e de esquerda. Autor dos livros ‘Brasil Sem Máscara – o governo Bolsonaro e a destruição do país [Kotter, 2022] e de ‘Lava Jato, uma conspiração contra o Brasil [Kotter, 2021], entre outras obras.

**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

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