A pesquisa Estimativa da participação calórica de alimentos ultraprocessados nos municípios brasileiros, publicada em 27 de junho, pela Revista de Saúde Pública do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) estimou o total de calorias provenientes de alimentos ultraprocessados ingerido pela população brasileira.
A variação mostra uma heterogeneidade entre as 5.570 cidades brasileiras, com um menor percentual (5,7%) de ingestão desse tipo de produto em Aroeiras do Itaim, no Piauí, e o maior (30,5%) em Florianópolis, Santa Catarina. São Paulo capital apresentou uma estimativa de 25,5%.
Os ultraprocessados podem provocar mudanças nos padrões alimentares em escala global, com elevação do risco para doenças crônicas, de acordo com pesquisadores brasileiros.
As estimativas geradas pela pesquisa podem contribuir para o monitoramento do consumo alimentar de ultraprocessados em nível municipal e fortalecer e subsidiar a criação de políticas públicas focadas na promoção da alimentação saudável.
É o que defende o pesquisador e autor do estudo Leandro Teixeira Cacau, doutor em Nutrição em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, em entrevista ao Conversa Bem Viver desta quarta-feira (16).
“São muitas estratégias que podem ser feitas em nível municipal, mais localizado, mas também em nível nacional”, diz. “E aí não basta só frear, tem que ter uma ação contrária, como o incentivo ao consumo de alimentos in natura, inclusive incentivos fiscais, baratear o preço desses alimentos, da comercialização, ampliar locais de aquisição desse tipo de alimento.”
Confira a entrevista na íntegra
O que são os alimentos ultraprocessados? Qual a diferença, por exemplo, da laranja que a gente colhe no pé, do suco de laranja e de uma barrinha de cereal sabor laranja. Onde entram os ultraprocessados nesse processo?
É interessante falar, por exemplo, da classificação nova de alimentos, que é exatamente esse sistema, digamos, que divide os alimentos em grupos de acordo com o propósito do processamento industrial.
Então, como você mencionou, por exemplo, a laranja ou até mesmo o suco de laranja que a gente faz em casa, são alimentos in natura ou minimamente processados, que devem ser a base da nossa alimentação, de acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira. E a gente tem outros processos do processamento industrial, que vai chegar até essa denominação do que é um alimento ultraprocessado.
A gente até poderia falar que são produtos porque eles são formulações industriais que geralmente são prontas para o consumo. Por isso o termo ultraprocessado, que combina uma série de ingredientes, como açúcares, gorduras, sódio, mas também uma série de aditivos alimentares que a gente chama de aditivos cosméticos, como emulsificantes, flavorizantes, realçadores de sabor, edulcorantes e uma infinidade de outros aditivos que a gente não consegue ter em casa. Não está na nossa cozinha, nem na nossa prateleira. E além disso eles possuem quase nada de alimentos in natura ou minimamente processados.
Além disso, de toda essa combinação de ingredientes, nutrientes e aditivos, a gente tem o que há por trás da indústria dos ultraprocessados, que são feitos para serem intensos, irresistíveis, hiperpalatáveis, difícil de comer só um, difícil de comer pouco, enfim. Acho que talvez essa definição engloba o que é um alimento ultraprocessado.
Frente a tudo isso, essa média de 20% de consumo de ultraprocessado na dieta do brasileiro é um número muito alto?
Sim, porque se a gente divide os alimentos entre in natura e minimamente processados, os ingredientes culinários processados, como açúcar, sal e óleo, os alimentos processados, e os ultraprocessados e a gente tem uma média nacional de 20% vindo de alimentos ultraprocessados, podemos sim considerar esse número elevado, principalmente considerando que a projeção é de que esse consumo tende a aumentar.
Cada vez mais, não só no Brasil, mas no mundo como um todo, percebemos que os alimentos ultraprocessados estão tomando conta da alimentação. Então a tendência é de que esse consumo vá aumentando. Esse dado de 20% é correspondente à pesquisa nacional realizada pelo IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] em 2017 e 2018, então provavelmente, se tivéssemos um dado desse ano ou daqui a dois anos, esse número poderia ser um pouco maior.
Dá para dizer que chamou a sua atenção e de todos os pesquisadores e pesquisadoras envolvidas essa heterogeneidade nos números ou vocês já esperavam algo similar?
Chamou, sim, a atenção. A gente já esperava que houvesse uma diferença entre alguns municípios da região Norte e Nordeste em relação a municípios da região Sul. Mas a gente não esperava que fosse tão discrepante assim, que tivesse uma variação tão grande quanto essa.
Se criou um imaginário de que em regiões e comunidades rurais e ribeirinhas, por exemplo, é onde os ultraprocessados estão dominando, enquanto que nas grandes cidades, onde tem mais oferta de alimentos in natura, por terem mais mercados, mais condições financeiras, as pessoas são um pouco mais blindadas. Mas não é exatamente isso. De certa forma a pesquisa desmontou completamente esse argumento, né?
Sim, é bem pertinente esse ponto porque a gente vê muito esse discurso de que a população de baixa renda, por exemplo, consome muito alimento ultraprocessado. Tanto com esse nosso estudo, mas com outros que o próprio Nupen já desenvolveu e tem desenvolvido, é que isso não é uma verdade. E que, na verdade, no Brasil, as pessoas que têm o maior consumo de alimentos ultraprocessados são aquelas de maior poder aquisitivo, que estão em regiões mais urbanizadas, de alta escolaridade, concentradas aqui na região Sul e Sudeste.
Mas claro que temos visto um aumento da população ribeirinha, da população de baixa renda, que está começando a ter essa substituição da alimentação por alimentos ultraprocessados. Então, daqui a alguns anos não sabemos se isso vai se manter ou não, mas tem acontecido.
Essa é uma maneira de colocar em evidência que a reforma agrária é um passo fundamental para garantir a alimentação de qualidade no nosso país. Podemos fazer esses paralelo a partir dessa pesquisa?
Com certeza. Acho que a pauta da reforma agrária é super importante porque dialoga completamente com a alimentação saudável e equilibrada, com consumo de alguns alimentos, especialmente os alimentos in natura e minimamente processados.
Os resultados desse estudo podem com certeza dialogar e podem subsidiar políticas públicas voltadas para promoção da alimentação adequada.
E aí existem diversas iniciativas, como, por exemplo, o programa Bom Prato que tem aqui em São Paulo e busca distribuir alimentação para pessoas em vulnerabilidade social. Esse dado pode ajudar no sentido de não disponibilização de alimentos ultraprocessados dentro desses programas, de aquisição e distribuição de alimentos.
De forma generalizada pelo país inteiro, pessoas de maior poder aquisitivo consomem mais ultraprocessados que os de baixa renda?
Isso é o que os resultados de pesquisas anteriores, que são inclusive desenvolvidas pelo núcleo, têm mostrado. A população de maior renda, maior escolaridade têm maior consumo de alimentos ultraprocessados e isso reflete também neste nosso estudo onde vimos que os municípios com moradores com renda acima de cinco salários mínimos possuem um maior consumo de alimentos ultraprocessados.
Tanto é verdade que muitos, praticamente todos os municípios do estado de Santa Catarina, por exemplo, têm um consumo acima de 19% das calorias vindas de alimentos ultraprocessados. Então isso é verdade, embora em alguns anos isso possa mudar e que a gente possa ver que toda a parcela da população tem aumentado o consumo. Mas ainda assim, é a população de maior renda que tem um maior consumo de ultraprocessado, com certeza.
Talvez tenha a ver com a consciência dessas pessoas? Porque a princípio, o ultraprocessado é o alimento mais barato disponível.
Sim, com certeza. Também é importante pensar como os ultraprocessados chegaram ao Brasil. Eles chegaram especialmente nos centros urbanos, em regiões mais centrais do Brasil e por isso talvez a gente tenha esse elevado consumo nessas regiões.
Então, nas áreas mais organizadas das mais centrais do país, coincidentemente é onde está a maior parcela, talvez, da população com maior poder aquisitivo. Mas isso tem mudado à medida que a indústria vai se infiltrando em outras regiões, em outras áreas.
O fato de que a população de baixa renda consome menos ultraprocessado não significa necessariamente que ela tem uma alimentação de melhor qualidade. Não é porque a pessoa está afastada do ultraprocessado que necessariamente ela está com uma alimentação regular, balanceada, usando todos os nutrientes. Existem outros perigos no caminho que essa população também está vulnerável?
Exatamente. Se pensarmos que a população de baixa renda não está tendo acesso a alimentos ultraprocessados por conta da renda, isso também pode ser verdade para aquisição de outros alimentos como frutas, verduras e cereais integrais que são alimentos com preços mais elevados em algumas regiões.
Segundo estudo que está sendo conduzido, a população de baixa renda tem um consumo de uma alimentação saudável como de alimentos que a gente poderia definir como básicos, com opor exemplo arroz, feijão, farinhas, mandioca, macaxeira e carnes.
Então tem um consumo bem adequado desse grupo de alimentos baixo em ultraprocessados, mas também ainda é baixo em frutas, verduras, castanhas e cereais integrais.
Que caminhos precisamos tomar enquanto sociedade para que a gente consiga frear o avanço desses alimentos ultraprocessados no país?
Gostaria de começar respondendo isso resgatando qual foi o objetivo do nosso estudo.
Sabemos através de pesquisas nacionais que cerca de 20% das calorias da dieta dos brasileiros vêm de alimentos ultraprocessados. Mas esses dados não conseguiam avaliar município por município. Então a gente conseguia ver a média do Brasil como um todo, das regiões, dos estados e chegar até as capitais.
Mas os outros municípios ficavam, digamos que, à mercê, e tinham que utilizar muitas vezes valores regionais ou nacionais que não necessariamente condizem com a realidade local daquele respectivo município.
Então o objetivo do nosso estudo foi trazer esse valor mensurável do consumo de ultraprocessado para todos os 5.570 municípios do Brasil para que os gestores locais possam utilizar essa informação e pensar estratégias que sejam dialogadas com a sua realidade.
O nosso estudo dialoga diretamente com isso porque dentro dessa iniciativa está a garantia de uma alimentação adequada baseada no Guia Alimentar para a População Brasileira, garantia de segurança alimentar e nutricional para população, especialmente a população em vulnerabilidade social dessas cidades.
Então, se a gente sabe que Florianópolis está com mais de 30% de participação de alimentos ultraprocessados, alguma coisa tem que ser feita e um olhar tem que ser lançado sobre isso.
E aí muitas estratégias podem vir a complementar isso, por exemplo, a não comercialização desse tipo de alimento em determinados locais como cantinas escolares. Os próprios municípios também podem aderir ao Sisan (Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional), que podem utilizar recursos do governo federal para promover a alimentação adequada, utilizar esses resultados do nosso estudo para pensar estratégias de diminuir a comercialização e o consumo desse tipo de alimento.
E aí não basta só frear, tem que ter uma ação contrária, como o incentivo ao consumo de alimentos in natura, inclusive incentivos fiscais, baratear o preço desses alimentos, da comercialização, ampliar locais de aquisição desse tipo de alimento, enfim. São muitas estratégias que podem ser feitas em nível municipal, mais localizado, mas também em nível nacional.

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