Ouça a Rádio BdF
O Inesc é uma organização não governamental, sem fins lucrativos, não partidária e com sede em Brasília. Há 40 anos atua politicamente junto a organizações parceiras da sociedade civil e movimentos...ver mais

Saída do Brasil do mapa da fome é notícia boa, mas devemos permanecer alertas

"Fome só pode ser debelada com a atuação do Estado"

Nesta semana, o Brasil recebeu uma ótima notícia: o país voltou a sair do Mapa da Fome da ONU. Com efeito, foi lançado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) o relatório “O estado da segurança alimentar e nutricional no mundo em 2025: combater a alta da inflação dos preços dos alimentos para a segurança alimentar e nutricional”, e, nele, no período de 2022 a 2024o país ficou abaixo dos 2,5% de risco de desnutrição, linha de corte utilizada pela FAO para definir a saída do Mapa da Fome. 

A notícia é a melhor possível, mas devemos permanecer alertas, pois ainda existem grupos populacionais em situação de insegurança alimentar severa, como no caso de povos indígenas ou de comunidades em situação de pobreza extrema. 

Esse resultado não é fruto do acaso, muito pelo contrário, é a consequência da ação firme do Estado com participação social.

Como descrevemos em artigo publicado no site do Inesc, são quatro as estratégias necessárias para garantir o direito humano à alimentação adequada:

  • (1) um governo forte e atuante, com capacidade de regular o mercado e implementar políticas públicas de segurança alimentar e nutricional que incluam o enfrentamento das mudanças climáticas, o combate ao racismo e ao patriarcado e políticas de cuidados;
  • (2) uma gestão intersetorial articulada e integrada, reconhecendo que a segurança alimentar e nutricional se conecta à saúde, educação, meio ambiente e clima, geração de emprego e renda, assistência social e cultura, entre outras áreas;
  • (3) a alocação adequada de recursos orçamentários; e,
  • (4) a participação ativa da sociedade civil por meio dos Conselhos e das Conferências de Segurança Alimentar e Nutricional.

Graças a esse esforço, associado à experiência brasileira adquirida em anos anteriores, foi possível diminuir expressivamente a fome no país em apenas dois anos. Com efeito, em 2014, o Brasil saiu do Mapa da Fome pela primeira vez. Nos governos Temer e Bolsonaro, entre os anos 2016 e 2022, em decorrência do desmonte institucional que operaram, e à incapacidade de a gestão Bolsonaro gerir a crise da Covid-19, a insegurança alimentar e nutricional aumentou exponencialmente.

Essa tendência também é revelada pelo relatório da FAO. Para o período de 2022 a 2024, a prevalência de insegurança alimentar severa na população total foi de 3,4%, valor bem inferior ao observado para o período anterior, de 2019-2021, quando tínhamos 7,3% da população em insegurança alimentar severa.

“Fome só pode ser debelada com a atuação do Estado”

A injeção de cerca de R$ 500 bilhões pelo governo federal em programas e ações de promoção da segurança alimentar e nutricional somente no biênio 2023 e 2024 contribuiu para esse resultado alvissareiro. Os recursos se destinaram essencialmente ao Bolsa Família, ao Benefício de Prestação Continuidade, à Alimentação Escolar (PNAE), ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), à Promoção da Agricultura Familiar, a Garantia de Acesso à Água por meio das Cisternas e à Saúde Indígena, entre outras ações.

Os dados evidenciam que a fome só pode ser debelada com a atuação do Estado, em escuta às demandas e necessidades da sociedade no âmbito do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). O Sisan articula as ações dos três níveis de governo e a participação da sociedade civil por meio dos conselhos. 

Os desafios agora são de várias ordens: manter os níveis baixos de insegurança alimentar e nutricional, combater a fome remanescente nos bolsões de pobreza extrema e melhorar a qualidade da alimentação tanto no campo como nas cidades.

Iniciativas alvissareiras estão em curso, lideradas pelo Ministério de Desenvolvimento Social, como a Estratégia Intersetorial de Prevenção e Controle da Obesidade, o Programa Alimenta Cidades, o Programa Cozinha Solidária, o Programa de Agricultura Urbana, o Combate ao Desperdício de Alimentos e a Articulação de Políticas Públicas de Segurança Alimentar e Nutricional para Povos e Comunidades Tradicionais, entre outras. Mas estas iniciativas precisam ganhar escala e, para tanto, necessitam de recursos orçamentários adicionais. É preciso ainda expandir o PAA e aumentar os valores do PNAE além de promover a geração de emprego e renda.

O Brasil está no caminho certo, mas ainda temos chão pela frente, pois o direito humano a alimentação adequada não será plenamente realizado enquanto uma pessoa estiver passando fome.

*Nathalie Beghin é do Colegiado de Gestão do do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

**Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato – DF.

:: Receba notícias do Brasil de Fato DF no seu Whatsapp ::

Veja mais