Na tarde desta terça-feira (12), a Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) da Câmara Municipal de Porto Alegre debateu a situação enfrentada por catadores e catadoras da vila dos Papeleiros. Moradores denunciam apreensão de carrinhos de coleta, demolição de galpões e retirada de materiais já reciclados, em ações realizadas pela prefeitura com apoio da Brigada Militar.
A reunião foi solicitada pelo presidente da comissão, vereador Erik Dênil (PCdoB), e pelo vice-presidente, vereador Pedro Ruas (Psol). O encontro lotou o plenário Ana Terra, onde diversas pessoas relataram casos de violência e dificuldades para manter o trabalho.

Segundo Pedro Ruas, o tema já havia sido discutido anteriormente, mas a situação se agravou. “Convidamos todas as autoridades para esse diálogo, mas lamentamos a ausência e protestamos contra a ausência da Brigada Militar, também convidada, pois são muitas as queixas contra a instituição. Mas, de qualquer forma, agradecemos a presença de um dos desembargadores do Tribunal Militar, o que demonstra interesse com vistas a dirimir conflitos”, afirmou. O parlamentar também destacou a presença de representantes da prefeitura como passo importante para promover o diálogo.
Apesar de existir legislação municipal que garante o direito ao trabalho dos carrinheiros, Ruas afirmou que comunidades como a vila dos Papeleiros vêm sendo alvo de operações policiais sob alegações de tráfico de drogas e furto de fios. “Não temos notícia de que o governo mandou fechar a Duque de Caxias porque alguns podem estar traficando ali”, disse, defendendo que a polícia não pode “massacrar” a população mais pobre. Dênil destacou a importância dos catadores “que além de deixar nossa cidade limpa, fazem disso a sua renda”.
Entre os depoimentos, o de Antônio Carbonero, cadeirante e morador antigo da comunidade, chamou atenção. Conhecido por manter um carrinho biblioteca com livros para uso coletivo, ele contou que perdeu todo o acervo. “Levaram meu carrinho com os livros que eram para a comunidade toda ter o que ler”, lamentou. Carbonero também destacou a história da vila: “Ela existe desde as antigas Docas. O que mudou foi a forma de sobrevivência de cada trabalhador. Hoje são recicladores, ajudam a limpar o ambiente de produtos poluentes”.
Outra moradora relatou que o filho, de 18 anos, cresceu na comunidade e construiu um galpão junto a outros 15 recicladores, mas perdeu tudo após uma ação municipal. “Meu filho está impedido de trabalhar, de produzir, derrubaram o galpão e levaram o fruto do seu trabalho. Eu vou até o fim ao lado dele”, afirmou emocionada.

Ismael Luiz da Silva, da Associação de Ajuda Mútua Ecologia, defendeu que a comunidade seja incluída no Plano Diretor da cidade. “Nós fazemos parte da cidade. Nós existimos e por isso merecemos isso”, disse, dirigindo-se aos vereadores e ao secretário de Ação Social, Juliano Passini. Ele afirmou que cerca de 100 catadores, com apoio de galpões, recolhem em torno de 200 toneladas de materiais recicláveis por dia e que o trabalho merece reconhecimento.
Para o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), Jair Krischke, o cenário é grave. Ele criticou a postura do poder público: “O governo está fazendo o mesmo que se fez na ditadura. Confundindo problemas sociais com criminalidade, usando a polícia quando deveria usar o aparelho social”. No Dia Nacional dos Direitos Humanos, Krischke reforçou o apoio aos trabalhadores: “Nós do Movimento de Justiça e Direitos Humanos estamos com vocês, estamos ao seu lado nessa luta por seus direitos de trabalhar, de viver. Não desanimem”.
A reunião contou com a participação de representantes da Pastoral do Povo da Rua, Conselho Municipal e Estadual de Direitos Humanos, Defensoria Pública Estadual, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, Ordem dos Advogados do Brasil e outras entidades. Pela prefeitura, estiveram presentes representantes das secretarias de Inclusão e Desenvolvimento Humano, de Governo, da Fundação de Assistência Social e Cidadania, da Defesa Civil, da Guarda Municipal e da Procuradoria Geral do Município.