O Tribunal Regional do Trabalho no Rio de Janeiro (TRT-RJ) condenou o Atacadão S.A., empresa do Grupo Carrefour Brasil, a pagar R$5 milhões em indenização por dano moral coletivo em razão de condutas que resultaram no adoecimento mental de trabalhadores, além de assédio moral, sexual e materno. O valor deve ser destinado a entidades de relevância social ou ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A decisão foi emitida no dia 16 de julho e foi motivada pela Ação Civil Pública (ACP), ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ), e também determinou a implementação de medidas para garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável.
Na sentença, a desembargadora Giselle Lopes Ribeiro registra que o Atacadão S.A foi condenada por assédio em 17 ações trabalhistas individuais e que a prática de diversas modalidades de assédio se reflete na alta rotatividade dos funcionários uma vez que 57,82% dos trabalhadores são desligados antes de completar dois anos, a maioria por pedido demissão. Entre os relatos de assédio presentes no processo estão o controle de idas ao banheiro com o relato de uma trabalhadora que sujou a roupa de sangue menstrual porque a rendição não chegou a tempo e assédio sexual recorrente a uma trabalhadora por um supervisor.
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A decisão favorável aos trabalhadores veio após recurso do MPT. A sentença original considerou improcedente a acusação de discriminação contra mulheres por se tratar de um “problema cultural” que ocorre em todos os segmentos da sociedade, e não uma discriminação específica no ambiente de trabalho da empresa. A sentença, conforme argumentou o MPT, ignorou a aplicação da resolução 492 de 2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que torna obrigatória a aplicação da perspectiva de gênero nos julgamentos.
As mulheres foram as mais afetadas pelas condutas abusivas ocorridas dentro da empresa. Em 2022, 70,8% dos afastamentos por transtornos mentais relacionados ao trabalho foram de mulheres, embora elas representassem apenas 44,5% do quadro de funcionários. Em 2023, esse percentual subiu para 79,5%. Muitos desses afastamentos pelo INSS eram subnotificados, ou seja, não havia emissão de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) pela empresa.
Ao Brasil de Fato, o deputado estadual Carlos Minc (PSB-RJ) falou da importância de divulgar essa decisão em nome da luta pelo fim da escala 6×1 e por mais dignidade dos trabalhadores. “A decisão lista todas as formas de assédio sofridas pelos trabalhadores, o que mostra um massacre diário. Uma vergonha total. A gente tem que divulgar essa decisão, porque infelizmente isso acontece em outros lugares também. E por essas e outras que a gente defende o fim da escala 6×1 e do massacre aos trabalhadores. Trabalhador não é robô”, disse.
O presidente do Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro, Márcio Ayer, comemorou a decisão e disse que não se trata de um caso isolado. “Não é novidade que as jornadas exaustivas, as metas inalcançáveis, o assédio moral e sexual constante façam parte da triste realidade de muitas redes do comércio, nem que as mulheres sejam as mais impactadas. Nesse sentido, o TRT acertou em cheio ao aplicar o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero. Saúde mental não é frescura, é direito dos trabalhadores”, disse.
Procurada pelo Brasil de Fato, a assessoria do Atacadão S.A informou em nota que teve decisão favorável em primeira instância, o que demonstra, segundo o comunicado, que os canais internos de denúncia e os treinamentos preventivos realizados são eficazes. A empresa acrescenta que já apresentou embargos à decisão e entrará com recurso.