Ouça a Rádio BdF
Aristóteles Cardona é médico de família no sertão pernambucano e professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco

Segurança pública exige mais que bravata

Se por um lado não existem saídas fáceis, por outro não há tempo para esperar soluções distantes

A cada novo pico de violência, a cena se repete: autoridades e comentaristas prometendo respostas rápidas, manchetes exaltando operações policiais e discursos inflamados defendendo mais armas e mais prisões. É a fórmula da facilidade. Funciona bem como slogan, mas não entrega resultado consistente em nenhum lugar onde foi aplicada.

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025 reforça esse ponto. O Brasil já ultrapassa 900 mil pessoas presas, com unidades superlotadas e um perfil majoritário de homens, jovens e negros. Mais de 2,27 milhões de armas de fogo estão registradas no país e os gastos com segurança pública cresceram mais de 6% no último ano. Apesar disso, a violência persiste.

Houve uma queda de 6,2% nos homicídios dolosos entre 2023 e 2024, mas o padrão das vítimas permanece: a violência continua atingindo de forma seletiva os mesmos grupos sociais, com recorte racial e territorial bem definidos.

Ainda em 2018, escrevi para o Brasil de Fato que a segurança pública brasileira é uma questão complexa, que não se resolve com medidas isoladas. A constatação segue atual. Mas, se por um lado não existem saídas fáceis, por outro não há tempo para esperar soluções distantes. É preciso agir agora, com base em evidências e sem medo de enfrentar o que não funciona.

Algumas experiências estaduais recentes mostram que é possível reduzir indicadores de violência combinando policiamento qualificado, mapeamento inteligente de áreas críticas e ações sociais voltadas para prevenção. Quando o Estado se faz presente de forma articulada com educação, saúde, cultura e oportunidades econômicas, os resultados tendem a ser mais sólidos e duradouros.

Além disso, é urgente criar fóruns qualificados capazes de ouvir e envolver diretamente as populações mais afetadas pelas diferentes formas de violência. Esses espaços devem ir além do diagnóstico e se tornar laboratórios de construção coletiva de soluções complexas, levando em conta a realidade de cada território e articulando diferentes áreas do poder público. Não é simples nem rápido, mas é um caminho mais consistente do que a repetição das mesmas medidas ineficazes.

Segurança pública não é palco para bravatas. É um direito e uma urgência. Quanto mais demorarmos para abandonar as soluções de bolso e investir em estratégias de longo prazo, mais caro será o preço que todos pagaremos.

Veja mais