A campanha MC Não é Bandido celebrou, neste mês, uma vitória simbólica e política: a realização de uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, que reuniu artistas do rap e do funk, juristas, parlamentares e defensores dos direitos humanos para endossar a denúncia da crescente criminalização da arte periférica. Foi um passo importante para dar voz a quem há décadas é silenciado e perseguido pelo simples ato de cantar a realidade das favelas.
Mas, amigo leitor, não podemos deixar de passar uma data importante para essa discussão: nesta sexta-feira, o rapper Oruam completa um mês preso. A prisão, marcada por lacunas jurídicas e questionamentos sobre sua legalidade, acende um alerta. Você não precisa gostar do Oruam, tampouco de sua música, para compreender a gravidade deste caso e os precedentes abertos. O que está em jogo é algo muito maior: as garantias legais e penais de qualquer cidadão em um Estado Democrático de Direito.
É preciso lembrar: nenhum artista pode ser tratado como culpado antes de julgamento, sem provas consistentes, sem devido processo legal. Não se trata de defender a conduta individual de um músico, mas de rejeitar uma seletividade penal que recai, quase sempre, sobre jovens pretos e favelados. Não podemos esquecer de Rennan da Penha, Smith, Ticão, Frank, Iasmin Turbininha e, mais recentemente, Poze do Rodo.
:: Quer receber notícias do Brasil de Fato RJ no seu WhatsApp? ::
É necessário fazer esse paralelo com um caso bem fresco na mente de todos. O contraste é gritante quando comparamos o tratamento dado a Oruam com casos como o do ex-deputado federal Roberto Jefferson, que disparou tiros e lançou granadas contra policiais federais que tentavam cumprir ordem judicial em sua residência. Um ato explícito de violência armada contra agentes do Estado. Ainda assim, foi conduzido com direitos respeitados, preso em casa, autorizado a receber visitas, com garantias de saúde e integridade física resguardadas. Já artistas sofrem prisões preventivas questionáveis, baseadas mais no que julgo ser preconceito cultural.
Esse abismo de tratamento judicial escancara a desigualdade que marca o sistema penal brasileiro. A seletividade não é apenas individual. É racial, territorial e cultural, meus amigos. E, se por um lado, políticos e empresários brancos têm direito ao benefício da dúvida e a todo tipo de recurso jurídico, por outro, artistas negros e favelados são tratados como bandidos antes mesmo de qualquer julgamento. Não é novidade, mas claramente há um recrudescimento em curso.
Foi diante dessa realidade que nasceu a campanha MC Não é Bandido. O movimento surgiu para denunciar não só a perseguição ao funk e ao rap, mas também a manipulação do sistema penal para censurar expressões culturais que incomodam. Quando o Estado chama de “narcocultura” aquilo que é, na verdade, cultura popular, ele não só criminaliza a arte, mas também todo um povo que vive, resiste e se expressa a partir das favelas. Nossa cultura foi construída em cima de censuras e proibições, basta saber o mínimo de história do Brasil. Basta lembrar do samba, da capoeira, do jongo, da black music.
O sucesso da audiência pública na Alerj mostra que não estamos sozinhos nessa luta, a população já entendeu o verdadeiro problema. Há cada vez mais vozes dispostas a defender a liberdade de expressão, a legalidade e a dignidade humana. Mas é preciso ir além: mobilizar a sociedade para que assine a campanha, pressione as instituições e diga não à criminalização da cultura periférica.
Repito: não é questão de gosto musical. É questão de direitos humanos, garantias constitucionais e justiça social. Assine nossa campanha e siga nossas redes sociais. Sigo com o deputado federal Pastor Henrique Vieira nessa jornada, apresentando esse PL que visa garantir a liberdade de expressão, impedir a censura a artistas de periferias e assegurar incentivo público à cultura negra e popular, sem discriminação a quem retrata a realidade das favelas. Para nos apoiar e colocar esse projeto pra frente, basta ir em https://leimcnaoebandido.com.br/. Conto com você!
*Dani Monteiro é deputada estadual (Psol/RJ) e presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj.
** Este é um artigo de opinião enão necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.