Por Leleco Pimentel, Padre João e Vanessa Gaudereto
Em 12 de agosto de 2025, a Comissão de Minas e Energia da Câmara Federal promoveu uma audiência pública que marcou um importante ponto de inflexão na discussão sobre a Contribuição Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM).
O encontro contou com a participação ativa dos movimentos sociais, Judiciário, Legislativo, Executivo, academia, entre outros e evidenciou a urgência de repensar a forma como os recursos oriundos da exploração mineral são aplicados e distribuídos, sobretudo em regiões marcadas por desafios socioambientais e pela necessidade de justiça social. Sobretudo nos estados onde a mineração é mais robusta, exploratória e degradante como em Minas Gerais e Pará.
A CFEM tem suas raízes na Constituição Federal de 1988, nas Leis 7.990/89 e 8.001/90, e passou por importantes atualizações com as Leis 13.540/2017 e 13.575/2017. Esta evolução legislativa trouxe à tona a complexidade de um mecanismo que, embora concebido para compensar a utilização de recursos naturais — patrimônio do povo brasileiro —, enfrenta o desafio de transformar arrecadação em benefícios concretos para as comunidades que vivem às margens da mineração.
Durante a audiência, especialistas e ativistas enfatizaram que a CFEM não deve ser vista como um instrumento de reparação, mas sim como uma compensação pelo uso do patrimônio mineral, que cabe, por direito, ao povo.
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A responsabilidade pelas eventuais reparações deve ser das empresas mineradoras, enquanto os recursos da CFEM devem ser canalizados para investir em infraestrutura, saúde, educação e, sobretudo, em ações que promovam a sustentabilidade socioambiental, com investimentos em pesquisa e desenvolvimento e principalmente na diversificação produtiva e social.
Os debates abordaram a intricada relação entre os conceitos de “bem mineral”, “beneficiamento” e “consumo”, destacando que a cobrança deve incidir sobre o valor original do produto, com sua devida valorização do bem minerário. Essa distinção, embora técnica, possui amplas implicações práticas, pois define os parâmetros para a incidência da contribuição e influencia na forma de cálculo e as alíquotas aplicadas. Atualmente, a diversidade de bases de cálculo e a complexidade dos critérios utilizados acabam por criar distorções e desafios para uma arrecadação transparente e justa.
Outro aspecto central discutido foi a distribuição dos recursos arrecadados pela CFEM. Embora haja uma participação das esferas federais, estaduais e municipais, o repasse muitas vezes não se traduz em investimentos que revertam em melhorias efetivas para as comunidades mineradas, principalmente nas áreas de preservação ambiental e no desenvolvimento regional.
Críticas também foram direcionadas aos mecanismos de fiscalização, que atualmente não permitem um acompanhamento rigoroso e em tempo real da aplicação dos recursos, abrindo margem para desvios e uma gestão ineficiente, além do descumprimento e judicialização, por parte das empresas mineradoras para se esquivarem do pagamento correto da referida compensação.
Mais controle e transparência
Nesse cenário, a audiência pública serviu para impulsionar propostas de revisão legislativa e o fortalecimento dos sistemas de controle e transparência, com participação social. A necessidade de estabelecer um percentual mínimo da CFEM para projetos socioambientais e de diversificação produtiva foi destacada, bem como a implementação de portais de dados abertos, auditorias participativas e conselhos regionais de acompanhamento.
A ideia é que, por meio de um controle social efetivo, os recursos possam, de fato, contribuir para a restauração ambiental e a sustentabilidade, para o fortalecimento das comunidades afetadas e para a promoção de um desenvolvimento econômico que valorize a diversidade, como o turismo, cultura e a agricultura familiar, setores que já demonstram ser vitais para a economia local, com forte participação no Produto Interno Bruto (PIB).
O debate, com um forte tom humanista, reafirmou o compromisso de que os recursos minerários devem, acima de tudo, beneficiar o povo, refletindo não apenas uma compensação financeira, mas o reconhecimento dos direitos fundamentais dos cidadãos atingidos pela atividade mineradora.
A transformação na gestão da CFEM passa, inevitavelmente, por uma reforma estrutural que garanta a equidade na distribuição, transparência, fiscalização e participação social.
À medida que o Brasil busca caminhar para um modelo de desenvolvimento mais justo e sustentável, as discussões abertas nesta audiência pública apontam para a importância de se reimaginar a mineração como uma atividade que, administrada com transparência e responsabilidade, pode contribuir para um futuro onde os benefícios econômicos se traduzam em melhorias reais na qualidade de vida das comunidades e na preservação do meio ambiente e não, somente na perspectiva econômica, exploratória e degradante.
É neste espírito que a sociedade clama por mudanças que assegurem a participação ativa de todos os envolvidos. Somente assim o país poderá transformar o legado da CFEM em um instrumento efetivo de justiça social e desenvolvimento sustentável.
A discussão do tema é essencial para que, todos, “de olho na CFEM” possamos usufruir, de alguma forma, da compensação pela retirada de nossos valiosos bens minerários, com todos os seus, inevitáveis, danos socioambientais, e com a consequente perda de nossas riquezas, que, apesar de potente, são finitas.
Leleco Pimentel é deputado estadual pelo PT (MG), Padre João é deputado federal pelo PT (MG) e Vanessa Gaudereto é mestre em Pesca e Aquicultura.
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Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.