Organizações sociais, movimentos populares e entidades diversas têm ampliado a vigilância e a crítica ao processo de revisão do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (PDDUA) da capital gaúcha. A mobilização, reunida na articulação Atua Poa – Todxs Nós, e outras entidades formalizaram um documento (Leia aqui na íntegra), este mês, em que apontam irregularidades na condução da revisão do plano.
A denúncia sustenta que, em vez de uma revisão, está sendo elaborado um novo projeto de ordenamento urbano, conduzido de forma considerada ilegal e sem a devida participação social. Entre os problemas relatados está a composição do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (CMDUA), declarada nula por decisão judicial e sob análise do Tribunal de Contas do Estado, além da paralisação do Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comam) desde 2024, o que contraria normas federais de participação ambiental.
Outro ponto levantado é a limitação da participação popular. Segundo a nota, a audiência pública realizada em 9 de agosto de 2025, dedicada à apresentação da minuta final, concentrou-se em um único encontro sem a realização de etapas regionais, formatos acessíveis ou divulgação da representatividade dos segmentos presentes. “A sessão contou com pouco mais de uma hora e meia de exposição técnica, seguida de falas com tempo restrito a dois minutos, sem espaço para diálogo ou resposta às manifestações.” Além disso, a atividade não foi transmitida ao vivo e as gravações não foram disponibilizadas, o que, segundo as entidades, compromete a transparência.

O documento também registra episódios durante a audiência envolvendo a condução da sessão pelo secretário municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade, Germano Bremm. As organizações afirmam que o tempo de fala do gestor foi desproporcional em relação ao reservado à sociedade civil e que houve situações interpretadas como desrespeitosas a participantes, incluindo incentivo a manifestações hostis contra um conselheiro. A falta de clareza sobre a contagem do tempo de cada fala também foi apontada como fator de cerceamento.
Além das questões procedimentais, houve registro de impedimento de entrada de pessoas previamente inscritas por terem chegado após o horário estabelecido, mesmo com o auditório ocupado por menos da metade da capacidade. Sobre o conteúdo da minuta apresentada, foram listadas omissões como a ausência de zoneamento ambiental e de mapeamento de áreas de risco, a não inclusão de dispositivos previstos na Lei Orgânica do município e a falta de consulta a comunidades indígenas e quilombolas, exigida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Também foi criticada a ênfase em propostas de adensamento e verticalização, sem mecanismos claros para garantir habitação de interesse social.
Diante do conjunto de problemas identificados, as entidades signatárias solicitam a suspensão da tramitação da minuta até que os conselhos municipais sejam recompostos e voltem a funcionar de forma regular, a realização de novas audiências públicas regionais com tempo adequado para análise e debate, a devolução da minuta ao Executivo para ajustes e a anulação da audiência de 9 de agosto de 2025. As organizações defendem que o processo seja retomado em bases democráticas, garantindo espaço de participação qualificada, com devolutiva das contribuições e foco em temas como moradia, prevenção de desastres e preservação ambiental.
A articulação reafirma que o debate sobre o Plano Diretor deve refletir as necessidades da população e considera que o formato atual não assegura a inclusão de diferentes vozes sociais na definição do futuro de Porto Alegre.

Atua Poa
A articulação Atua Poa foi criada em 2019 com o objetivo de reunir diferentes setores da sociedade em defesa do direito à cidade, articulando propostas e buscando garantir que a revisão das regras urbanísticas seja realizada com transparência e participação efetiva. O coletivo reúne mais de 80 entidades que, desde sua fundação, se dedicam à construção de alternativas para a organização da vida urbana.
Em 2020, foi lançada a plataforma Atua Poa, que sistematiza propostas em dez eixos, como a revisão democrática do Plano Diretor, a garantia de moradia, a proteção ambiental, o fortalecimento da participação popular e a preservação do patrimônio comum, entre outros pontos. O documento é público e se apresenta como referência para o debate sobre o futuro da cidade.
Prefeitura de Porto Alegre
O Brasil de Fato RS entrou em contato com a Prefeitura Municipal de Porto Alegre e com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamum) solicitando uma nota sobre as posições apresentadas pelas entidades e aguarda retorno.