Quando você precisa de acolhimento e de escuta, quem você busca? Quando quer ajuda para refletir ou mudar, onde procura? Podemos contar com familiares ou amigos; já outras conversas cabem melhor na terapia. Outras pessoas, no entanto, preferem a Inteligência Artificial (IA). E esse é um debate fundamental a se fazer neste 27 de agosto, Dia do Psicólogo.
As IAs “generativas”, que criam textos ou imagens a partir de prompts, são invenções promissoras, capazes de beneficiar a humanidade de formas ainda imprevisíveis. Naturalmente, há também riscos e necessidade de debate. Por exemplo, faz sentido usar a IA como psicóloga(o) ou psicoterapeuta?

As IAs que conhecemos são modelos computacionais que imitam processos humanos – não são capazes de empatia ou pensamento crítico. E pode haver acolhimento sem empatia? Pode haver reflexão sem pensamento crítico? Se você já bateu papo com uma IA, notou que ela costuma concordar com tudo que é dito e raramente fica em dúvida.
É mais fácil receber uma resposta errada do que um sincero “não sei”. Isso pode fortalecer interpretações distorcidas e inflexíveis da realidade. Além de não ter atenção para sutilezas e nem manejo adequado para situações delicadas, a IA não tem responsabilidade ética ou profissional sobre suas respostas. Em casos raros, porém emblemáticos, a IA já foi observada incentivando suicídio e pensamentos delirantes.
Além desses riscos, pode-se alimentar uma ilusão: “relacionar-se” com a IA significa acreditar que é possível ter os benefícios de uma relação sem os riscos e as imperfeições de uma relação. Pense em uma pessoa com quem você tenha tido conversas importantes. Pode ser um familiar, um professor, um amigo, um amor, um terapeuta… Lembre as pequenas sensações ao longo da conversa: curiosidade? Medo? Impaciência? Compreensão? Esses sentimentos são reações normais e necessárias para as relações humanas.

Sentir-se julgado, por exemplo, é uma experiência praticamente universal entre nós, inclusive quando não estamos sendo julgados. Coragem para se expressar e empatia por quem tenta se expressar são fundamentais para construir relações significativas. É na imperfeição das interações – no silêncio constrangedor, na ambiguidade do olhar, na difícil escolha das palavras – que nos desenvolvemos, inventamos e encontramos. Relações transformadoras, como buscamos em uma boa terapia, são também imperfeitas, e é necessário que assim sejam.
*Roberto Decker é psicólogo e professor da faculdade de Psicologia do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo de Porto Alegre (Cefi).
**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.