Milhares de pessoas caminharam, nesse domingo (31), pelas históricas ruas de Viejo San Juan na Marcha pela Independência de Porto Rico. A manifestação relembrou marcos do movimento independentista – como os 40 anos da prisão dos Macheteros em 1985 e os 20 anos do assassinato de Filiberto Ojeda Ríos em 2005. Mais de 3 mil pessoas tomaram as ruas da capital.
“Desperta, borinquenho, que já foi dado o sinal! Desperta desse sonho, que é hora de lutar!”, cantava a cantora iLe minutos antes do início da mobilização, enquanto a multidão se unia em um coro que acompanhava cada verso de La Borinqueña, hino independentista.

Convocada por sindicatos, organizações sociais, ambientalistas e feministas, assim como por diversos setores do independentismo, a marcha contou com a participação de figuras do mundo da cultura, como a atriz Edna Lee Figueroa, que compareceu vestida – junto a um grupo de mulheres – como “Las Lolitas”, em homenagem a Lolita Lebrón (1919 – 2010), líder e ativista defensora da independência de Porto Rico.
A mobilização também se repetiu em cidades dos Estados Unidos, como Nova York, Nova Jersey, Flórida, onde reside grande parte da diáspora porto-riquenha.
Com cartazes com a frase “Yankees go home”, bandeiras, fotografias de figuras emblemáticas do independentismo e tambores que reproduziam os sons característicos da ilha, a marcha partiu do lado sul do Capitólio, percorreu a rua San Francisco e chegou ao Tribunal Federal.

“Controlar nosso próprio destino”
A manifestação refletiu a vitalidade do movimento independentista, que nos últimos anos tem crescido especialmente entre os jovens. A luta em Porto Rico parte da convicção de que é necessário ter controle sobre o próprio destino para construir uma vida digna. O povo porto-riquenho lutou para deixar de ser colônia da Espanha; no entanto, a ilha acabou sob o domínio dos Estados Unidos. Por isso, a busca pela libertação e independência continua vigente, explica Dianne Viera ao Brasil de Fato, integrante do coletivo Jornada Se Acabaron las Promesas.
Após as Guerras de Independência contra o Reino da Espanha – lutas de independência realizadas em conjunto por Cuba e Porto Rico – a tão desejada soberania de ambos os países foi ofuscada pela intervenção dos Estados Unidos em 1898. A partir de então, Cuba alcançou uma independência formal – embora fortemente condicionada a Washington – enquanto Porto Rico passou a ser um “território não incorporado” dos Estados Unidos, eufemismo que encobre uma relação colonial que, já no século 21, Washington mantém com a ilha caribenha.
“A maioria dos porto-riquenhos tem muito claro que nosso país é uma colônia”, afirma Dianne Viera.
“Geralmente nos dizem que, se fôssemos um país independente, cairíamos na pobreza e não conseguiríamos sobreviver como nação soberana. Inclusive, há setores políticos – como a atual governadora – que defendem que o melhor para Porto Rico seria se anexar definitivamente aos Estados Unidos e se tornar o 51º estado. No entanto, a verdade é que, ao longo dessas décadas, o único efeito da presença dos Estados Unidos – além de nos tirar a soberania – tem sido se apropriar das riquezas do nosso país”, acrescenta.
A data da convocação para o ato foi escolhida para coincidir com o 9º aniversário da imposição, por parte de Washington, da Junta de Controle Fiscal em Porto Rico. Esse órgão foi criado em 2016 por meio da Lei Promessa, durante a administração de Barack Obama.
Segundo Viera, sob a justificativa de reestruturar a dívida externa de Porto Rico com os Estados Unidos — considerada pela ilha como “ilegítima” — foi criada a Junta de Controle Fiscal, organismo que, na prática, exerce controle de fato sobre a economia do país.
Composta por sete membros nomeados pelo presidente dos Estados Unidos e um membro designado pelo governador de Porto Rico, a junta tem como objetivo garantir o pagamento da dívida por meio de políticas de austeridade.
Essas medidas provocaram o fechamento de escolas, o corte de aposentadorias e a eliminação de direitos trabalhistas, o que precarizou a saúde, a educação e as condições de trabalho dos porto-riquenhos. “A junta decide em que o dinheiro será gasto e como será gasto. Trata-se de uma entidade cujo objetivo é intensificar o saque”, afirma Viera.
As consequências têm atingido particularmente os jovens, que – segundo Viera – se viram obrigados a migrar nos últimos anos diante da falta de perspectivas de futuro no país.
“Estão nos tirando tudo. Estamos perdendo tudo. Mas também estamos perdendo o medo de lutar. Vemos como representantes da cultura popular dão sua contribuição, como o companheiro Benito (Bad Bunny), enquanto muitas organizações acompanham o povo nas ruas.”