A venda dos dados dos paranaenses via privatização da empresa de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (Celepar) segue levantando questionamentos. O Governo do Paraná disse que está garantida a segurança dos dados. Por outro lado, Oposição e funcionários da estatal dizem que o debate não tem sido transparente e que há risco de exposição da privacidade dos paranaenses. Após a audiência pública promovida pelo governo Ratinho Junior (PSD) para possíveis compradores, devem ocorrer duas outras audiências. Uma na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), marcada para o dia 15 de setembro, e outra na Câmara dos Deputados, agendada para 23 de setembro.
A audiência foi conduzida pelo Conselho de Controle das Empresas Estaduais (CCEE), ligado à Casa Civil, e contou com a participação do secretário de Inovação e Inteligência Artificial, Alex Canziani, do diretor Administrativo, Financeiro e Jurídico da Celepar, Guilherme de Abreu e Silva.
Segundo a Agência do Governo, Canziani apresentou os objetivos da gestão estadual, que passam, entre outros, por acompanhar tendências globais no mercado de tecnologia, promover serviços digitais mais rápidos e modernos. “A maioria dos países, especialmente os mais desenvolvidos, conta com empresas privadas de tecnologia para desenvolver sistemas de tecnologia e similares para seus governos e entidades estatais. O mercado privado produz tecnologias de maneira mais ágil porque tem mais recursos e menos burocracia. Na era da Inteligência Artificial”, disse Canziani.
Para o Comitê de Funcionários, por outro lado, a presença da Ernest Young na mesa acendeu outro alerta. A consultoria foi contratada sem licitação para “assessoria, estudos e operacionalização” da venda. O valor do Contrato 288/2025, com 18 meses de vigência, é de R$ 8.776.412,53, conforme publicado no Diário Oficial do Estado.
“No papel, a audiência serviria para “garantir publicidade” e “colher contribuições”. Na prática, soou como apresentação protocolar com plateia pequena, microfone sob controle e respostas enlatadas e pouco argumento convincente”, diz nota dos funcionários.
Questionamento e proteção de dados
A venda da Celepar tem sido alvo de questionamentos, inclusive de órgãos reguladores. O conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR), Fábio Camargo, denunciou a falta de seriedade na audiência pública convocada pelo Conselho de Controle das Empresas Estaduais.
“Nós vamos esperar uma audiência pública fajuta (para se posicionar). O Tribunal de Contas, como um órgão social, tem o poder e o dever de, cautelarmente, de proteger a sociedade”, disse Camargo antes da audiência.
Já o advogado Dorival Assi Junior, que representa o PT-PR, disse que não foi realizado um debate efetivo sobre a venda da Celepar. Ele citou o Programa Parcerias do Paraná e estabelece transparência e disponibilidade de informações como princípios fundamentais — algo que, segundo ele, não está ocorrendo no processo.
“Existe um plano de publicização de informações sobre o procedimento para a desestatização? Se haverá uma discussão efetiva. Dois minutos para questionamentos e meia hora de intervalo, acabou sendo meramente pro forma, sem garantir o debate necessário”, disse Assi Junior.
::. Confira a fala do advogado
Ainda antes da audiência, a Oposição levou ao TCE-PR questionamentos acerca do processo. Eles se reuniram com o presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR), conselheiro Ivens Linhares, e com o coordenador-geral de Fiscalização do TCE, Rafael Morais Gonçalves Ayres.
De acordo com a Oposição, se privatizada, alertam os parlamentares, o controle desses dados pode ficar nas mãos de fundos e empresas que não têm compromisso público, o que abre risco de mau uso, vazamentos ou até comercialização indevida de informações sensíveis da população.
“Nós não podemos aceitar que a venda de uma empresa estratégica como a Celepar aconteça, principalmente desta forma, sem transparência e sem ouvir a sociedade. O TCE precisa garantir que não haja omissão de informações e que esse processo não avance de forma apressada e sem debate público. Aliás, precisamos que esse processo seja parado”, afirmou o Líder da Oposição, deputado Arilson Chiorato.
Já o deputado Requião Filho (PDT-PR), em suas redes sociais, alertou que a venda da Celepar pode fazer com que as empresas invadam ainda mais a privacidade das pessoas.
“Percebeu que anúncios sobre coisas que acabaram de falar aparecem nas redes sociais do nada? Essa sensação de estarmos sendo vigiados pode piorar. Uma empresa de plano de saúde saberá quais remédios você toma e classificar o preço do plano a partir dessa informação”, exemplifica o post do deputado.

Audiência pública
A Oposição marcou uma audiência pública para o próximo dia 15 de setembro. O evento deve apresentar questionamentos sobre a venda. Entre eles, de que a privatização desses ativos não é apenas uma questão administrativa, mas envolve dados constitucionalmente protegidos, cuja gestão por empresas privadas pode configurar violação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e à própria Constituição Federal.
Já no dia 23 de setembro, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados deve realizar encontro sobre este tema. A audiência pública foi solicitada pelo deputado federal Tadeu Veneri (PT-PR).
“Queremos ouvir especialistas, entidades da sociedade civil, representantes dos trabalhadores da empresa, movimentos sociais e representantes do governo do Paraná. Esta empresa, cujo leilão está marcado para ocorrer em novembro, não pode ser liquidada”, disse o deputado federal.