A cientista política Priscila Lapa avalia que a proposta de anistia em debate no Congresso tem força política, mas enfrenta entraves estratégicos que explicam a cautela dos presidentes da Câmara e do Senado, Hugo Motta (Republicanos-PB) e Davi Alcolumbre (União-AP), em não colocá-la em votação. Segundo ela, a pauta funciona como barganha e como instrumento de disputa entre poderes.
“De forma geral, essa pauta encontra uma certa unanimidade suprapartidária porque ela não deixa de ser um recado do Legislativo para impor limites à atuação do Judiciário”, afirma, em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato. No entanto, para Priscila, tanto Motta quanto Alcolumbre sabem que levar o projeto ao plenário pode trazer mais desgaste que benefícios. “Seria mais uma desmoralização congressual, primeiro do levante da opinião pública, mas também disso ser derrubado em uma outra instância”, explica.
Ela lembra que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PT) já estava inelegível antes do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que o condenou à prisão, e que a anistia interessa também a outros setores políticos, não apenas à direita bolsonarista. “Mais de uma parte da classe política mira nesse fortalecimento de Bolsonaro para manter aceso todo esse processo do bolsonarismo, que pode embalar candidaturas, inclusive proporcionais”, analisa.
Segundo a cientista, a pauta se tornou também moeda de troca nas negociações. “Para que a anistia não vingue, ela precisa entrar em termos de negociações. Nada na política é só de uma via. Outras pautas que interessam aos bolsonaristas também poderão ser retiradas”, indica.
Lapa destaca que o debate ocorre em meio a uma disputa maior sobre os limites da atuação do Supremo. “Não é à toa que tem também no paralelo essa PEC [Proposta de Emenda à Constituição] da Blindagem. É todo um contexto em que a classe política tenta responder ao que chama de ativismo do Judiciário”, completa. A proposta prevê que a abertura de inquéritos ou de processos contra deputados e senadores só possa ocorrer com a autorização do Legislativo.
Por trás desse embate, lembra a especialista, está também a disputa em torno das emendas Pix, bloqueadas pelo STF. Para ela, o tema ajuda a explicar a resistência do Congresso em aceitar limitações à sua atuação. “Por trás dessa pauta da anistia está algo muito mais caro para a classe política, que é garantir o uso desses recursos sem maiores restrições”, aponta.
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