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O Ponto é editado por Lauro Allan Almeida e Miguel Enrique Stédile, do Front - Instituto de Estudos Contemporâneos, e é publicado todas as sextas-feiras.

De volta à programação normal

Todo mundo sabe que uma anistia que liberte Bolsonaro ou o torne candidato não sairá do papel

Depois da condenação dos golpistas fardados, avança o golpismo do centrão no Congresso.

.Bilhete premiado. A bancada governista acreditou na promessa do centrão de que se apoiassem a PEC da Blindagem, as pautas do governo andariam e, além disso, enterrariam a proposta da Anistia. Até o próprio presidente Lula tentou avisar da cilada. No fim das contas, deu o óbvio: a base governista entregou o que o centrão queria, mas só o que o conseguiu foi evitar que a MP da energia elétrica caducasse, ficando ainda com parte do desgaste pela PEC da Blindagem nas redes sociais, enquanto a Anistia avançou. Mas o governo também desperdiçou a chance de tomar a iniciativa política no Congresso, aproveitando o momento pós-julgamento de melhora na aprovação e na economia, além de descobrir que os deputados temem mais a CPI do INSS do que o Planalto. Ao contrário, resolveu recolocar Hugo Motta na cadeira de presidente e manter aberta a torneira das emendas. Com tantas dificuldades, o Planalto deve evitar agora abrir novas frentes de atrito e vai engavetar o projeto de regulamentação das big techs. Já o centrão se lambuzou nas emendas e na impunidade e ainda mandou um recado para o Planalto e para o STF aprovando a urgência da Anistia, com a excrescência de ser uma anistia que declara guerra e não a conciliação. Mesmo sendo um projeto marcado para morrer no Senado, na sanção presidencial ou no STF, ele dá fôlego para os bolsonaristas continuarem atravancando a pauta do Congresso com um tema que não está na ordem do dia para ninguém. No fim, além do centrão, ganhou o Senado, que sem precisar fazer nada, pode ser o moralizador da pauta derrubando a PEC e até o salvador do governo, resgatando a isenção do IR das gavetas de Arthur Lira pelas mãos de Renan Calheiros. Ganhou também o STF, porque Flávio Dino não tem medo de Donald Trump, muito menos do centrão, e em resposta à PEC da Blindagem, acelerou o julgamento das emendas. E, sem dúvidas, ganhou a Faria Lima, que conseguiu fazer passar batida a decisão do Banco Central de manter a taxa de juros nos atuais 15% ao ano mesmo com um cenário de deflação.

.Não aprendi dizer adeus. Seja por falta de apoio no Senado, por veto presidencial ou por declaração de inconstitucionalidade no STF, todo mundo sabe que uma anistia que liberte Bolsonaro ou o torne candidato não sairá do papel. Resta ao ex-capitão a sua especialidade: fazer vitimismo com a imagem de idoso enfermo para tentar escapar do presídio e manter a prisão domiciliar. Nada disso seria problema se não afetasse o futuro da direita nas eleições. Talvez Tarcísio tenha acreditado que fazer um mutirão pela Anistia bastaria para receber a bênção do chefe à sua candidatura presidencial. Mas, como a relevância política de Bolsonaro depende dessa indefinição, a demora deve continuar, para desespero do cacique do PL, Valdemar Costa Neto, que sonha com uma chapa Tarcísio – Ciro Nogueira. Outro possível candidato por autodeclaração, Eduardo Bolsonaro, aguarda um julgamento no STF por crime de coação e poderá perder o mandato de deputado e ser inviabilizado, a não ser que uma manobra na Câmara com a mãozinha de Hugo Motta consiga blindá-lo. Aliás, qualquer nova retaliação da Casa Branca sobre os ministros que julgaram o pai poderia prejudicar a defesa do filho, sem contar o avanço da investigação contra o ex-presidente por crimes relacionados à pandemia. Assim, Bolsonaro ficará afastado pelo menos 27 anos da vida política, o que muda o jogo a favor de Tarcísio, que terá tempo de sobra para pensar em um dia ser presidente. Nesse caso, por que não reeleger-se a governador do maior colégio eleitoral do país e consolidar sua base regional? Claro, a escolha poderia não passar de um jogo de cena a la Jânio Quadros para tornar-se candidato pelos braços do povo, mas nesse caso a tragédia poderia ser repetir já que a rejeição a Tarcísio vem aumentado ao invés de diminuir. Mesmo assim, a aproximação de Tarcísio da base bolsonarista e as indefinições sobre seu futuro político contribuem para aumentar as tensões intestinas no governo de São Paulo entre o PL e o PSD de Gilberto Kassab.

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Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.