Com a presença de representantes dos governos do Brasil e de Cuba, foi concluído em Havana o primeiro encontro sobre “Políticas Públicas para a Soberania e a Segurança Alimentar e Nutricional”. Realizada nos dias 23 e 24, a reunião teve como objetivo fortalecer a cooperação bilateral e o intercâmbio de experiências em políticas sociais em diversas áreas.
A abertura contou com a participação do primeiro-ministro cubano, Manuel Marrero, que qualificou o encontro como um espaço “fundamental” para a cooperação Sul-Sul. Marrero destacou que a segurança alimentar constitui um dos pilares dos direitos humanos e da estabilidade social, e assegurou que o evento busca promover mecanismos de cooperação que facilitem sistemas inclusivos com a participação de jovens, mulheres e comunidades rurais.
“A soberania alimentar exige a participação conjunta de todas as forças, recursos e estruturas organizacionais, vinculadas a essa missão estratégica e decisiva para o bem-estar de nossos povos”, afirmou.
Atualmente, Cuba e Brasil mantêm sete projetos bilaterais em áreas como agricultura, pecuária, aquicultura e saúde, com apoio de instituições especializadas e da FAO.
A numerosa delegação brasileira contou com a presença de Paulo Teixeira, ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar; Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome; e Ruy Carlos Pereira, embaixador e diretor da Agência Brasileira de Cooperação.
O encontro também teve a participação do escritor e educador Frei Betto, que mantém há décadas uma estreita relação com a ilha. Durante a abertura, Betto afirmou que Cuba constitui um “paradigma de sociedade pós-capitalista” na América Latina e no Caribe, e ressaltou a “dívida histórica” com a nação caribenha, que manteve “viva a esperança de outro mundo possível”.
“Cuba é o único país da região cuja estrutura política e jurídica garante os três direitos humanos fundamentais: alimentação, saúde e educação”, destacou. Ao mesmo tempo, ressaltou as dificuldades que a ilha enfrenta atualmente, tendo atravessado nos últimos anos uma profunda crise econômica que afetou as condições de vida da população.
Em referência à possibilidade de aprofundar as relações entre os dois países, Betto afirmou que, apesar do “pouco tempo”, o encontro deveria resultar em “compromissos concretos e mecanismos de acompanhamento”.
Aprofundar a relação entre Brasil e Cuba
Em entrevista ao Brasil de Fato, Ana Terra Reis, secretária de Abastecimento, Cooperativismo e Soberania Alimentar do Brasil, destacou que o encontro em Havana permite sistematizar os avanços de cooperação existentes entre os dois países.
Ela ressaltou, ainda, que se trata de uma oportunidade para apresentar os “planos mais urgentes” que estão sendo implementados no Brasil para enfrentar a desigualdade, a fome e a pobreza.
“Existe um conjunto de políticas públicas que estão sendo retomadas no Brasil, em um esforço de reconstrução do Estado após os anos em que a extrema direita esteve no poder. Aqui podemos sistematizar e apresentar nossos planos mais urgentes, entre os quais se destaca, sobretudo, o grande desafio que o Brasil enfrenta: combater a desigualdade, a fome e a pobreza.”
Embora as realidades de Cuba e do Brasil sejam diferentes, esses intercâmbios oferecem aprendizados mútuos e podem servir de inspiração frente aos desafios comuns que ambos os países enfrentam.
“Neste evento, pudemos apresentar a Cuba algumas das iniciativas que desenvolvemos no Brasil, mas, sobretudo, também pudemos colher as importantes contribuições do Estado cubano em proteção social e na organização do abastecimento alimentar”, explicou Ana Terra Reis.
Como exemplo, destacou que uma das contribuições mais relevantes de sua secretaria é a criação de intercâmbios entre cooperativas de Cuba e do Brasil, com o objetivo de otimizar a produção de alimentos, fomentar a agroecologia, aprimorar técnicas e melhorar os modelos de gestão na ilha.
Reis sublinhou que Cuba representa um exemplo de resistência e resiliência desde a Revolução, enquanto o Brasil atualmente conta com condições para contribuir com a ilha a partir dos avanços recentes em políticas públicas.
No contexto internacional atual, a secretária enfatizou a importância da capacidade de resistência na América Latina, que mantém viva a esperança de modelos alternativos de desenvolvimento, valorizando os camponeses, fortalecendo a superação da crise mundial e, sobretudo, enfrentando os impactos da crise climática, que afetam intensamente os trabalhadores rurais da região.
A reunião foi concluída com uma declaração conjunta, na qual ambos os países ratificaram sua vontade de articular um plano de ação comum. Entre as prioridades acordadas, destacam-se: o fortalecimento da agricultura urbana e familiar, o intercâmbio entre movimentos cooperativos, a educação alimentar e nutricional, a luta contra a mudança climática e a cooperação regional.