O Brasil tem hoje 4,2 milhões de estudantes com dois anos ou mais de atraso escolar, o que representa 12,5% das matrículas no país. Os dados, analisados pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) a partir do Censo Escolar 2024, indicam que, apesar da leve redução em relação ao ano anterior (13,4%), a chamada distorção idade-série continua sendo um dos principais desafios da educação brasileira.
Segundo Júlia Ribeiro, especialista em educação do Unicef, a desigualdade é um fator determinante. “Esses números acabam afetando de forma muito mais significativa aqueles estudantes que já se encontram numa situação maior de vulnerabilidade. Afeta, por exemplo, quase o dobro dos estudantes negros em comparação aos brancos, e muito mais meninos do que meninas”, afirmou ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato.
O atraso entre estudantes negros da educação básica era de 15,2% em 2024, enquanto entre brancos, de 8,1%, conforme a pesquisa, que foi divulgada nesta quinta-feira (25). O estudo também aponta que 14,6% dos meninos estavam em distorção idade-série, contra 10,3% das meninas.
A especialista alerta que o atraso escolar pode levar à evasão. “Quando um estudante entra em situação de distorção idade-série significa que ele está com dois ou mais anos de atraso escolar. Essa questão pode representar uma ruptura do vínculo com a escola e contribuir para o abandono. E, somado a isso, temos anualmente cerca de 400 mil estudantes que deixam as escolas”, explicou.
Para enfrentar esse cenário, o Unicef desenvolve desde 2018 a estratégia Trajetória e Sucesso Escolar, em parceria com redes estaduais e com apoio do Instituto Claro. “É importante compreender quem são esses estudantes, os motivos que os levaram ao atraso e, a partir disso, desenvolver práticas pedagógicas e projetos específicos que contribuam para a recuperação da aprendizagem. E, sobretudo, é fundamental promover processos de escuta e participação desses estudantes”, destacou Ribeiro.
Ela defendeu ainda que o processo de diálogo com os alunos esteja no centro do planejamento pedagógico. “Traçar oportunidades efetivas de escuta é fundamental”, orientou. Um levantamento realizado pelo Unicef em parceria com o Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec) em 2022 indicou que 33% dos estudantes disseram que a escola não sabia nada sobre eles ou sobre suas famílias. “Esse dado aponta para a importância de colocar a escuta no cotidiano escolar”, disse.
A especialista reforçou que o combate à cultura do fracasso escolar precisa ser um compromisso coletivo. “Esse é um esforço conjunto de governos, sociedade e comunidade escolar. Não podemos naturalizar o fracasso. Cada criança e adolescente tem a capacidade de aprender, mas é preciso compreender os desafios que enfrentam para que a escola se torne um aliado efetivo no desenvolvimento deles”, concluiu.
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