Baobá do rap e um dos propulsores do hip hop no Brasil, GOG lançou recentemente o single Robô Latrô, que, com poesia, criatividade e melodia, discute a linha tênue entre o avanço das tecnologias e a perda da humanidade.
A nova faixa de conta ainda com parceiros do artista, como AfroRagga e Thabata Lorena, além de trazer novos nomes da cena, como Luan Almeida, revelação da música brasiliense.
Logo no início, com a frase “um robô roubou meu emprego, matou uma flor, tirou meu sossego”, a música já deixa claro qual reflexão quer proporcionar: é possível estabelecer uma convivência harmônica entre o mundo tecnológico e as necessidades sociais?
“Se a tecnologia não for aliada à melhoria da tecnologia humana, ela está fazendo desserviço. Nós precisamos ocupar, habitar as tecnologias e torná-las realmente inventos humanos e não simplesmente nos transformar em máquinas humanas”, discute GOG, em entrevista ao Conversa Bem Viver.
Para o artista, a resposta para esse dilema passa pela cultura, coletividade e cooperação, sempre com olhar atento às demandas das comunidades periféricas. GOG destaca ainda a importância de avançar no debate sobre o uso das tecnologias e da regularização das plataformas digitais.
“Muita gente confunde libertinagem com liberdade de expressão. Então, falam o que querem, machucam como querem e confundem isso com liberdade de expressão. Na realidade, isso é agressão. Falta muitas vezes a percepção da coletividade que o hip hop sempre pregou. Se existe uma revolução de um só, ela é vaidade”, continua.
Com mais de 30 anos de carreira no rap, GOG tem uma dezena de álbuns publicados e também é gestor do espaço sociocultural Casa GOG, inaugurado em 2024 no Distrito Federal.
Confira a entrevista completa:
Brasil de Fato – Qual é a mensagem central da sua nova faixa Robô Latrô?
GOG – É com muita honra que apresentamos esse projeto que também é uma convocação geral. Na mesma hora em que discutimos a inteligência artificial,nós temos também que discutir nossos espaços, os espaços da comunidade, do povo brasileiro, diante dessas novas tecnologias. Robô Latrô traz exatamente esse debate e provocação, começando pelo nome.
Já nas primeiras frases da música, no primeiro compasso, eu falo “um robô roubou meu emprego, matou uma flor, tirou meu sossego”. Isso já traz a ideia do nome. E eu trago gente maravilhosa, como o Luan Almeida, que é o novo talento da música brasiliense, um moleque novo que a gente tem que prestigiar. Tem também o AfroRagga, que é um parceiro que traz muito a ideia do flow, da criatividade e da melodia.
E a Thabata Lorena, representando a mulher negra, que é muito politizada, uma pessoa que incrementa muito e que eu convido sempre que posso. Em Robô Latrô, a parte dela é uma das que eu mais gosto, quando ela fala que “quem nasceu para ser IA, jamais será iaia”. O feminismo negro e a mulher negra são super importantes nesses debates que a gente faz. Robô Latrô resume tudo isso.
Qual é a relação entre o avanço da inteligência artificial e a perda de humanidade?
Vivemos um momento de uma nova guerra fria. Há assuntos que parecem que não são importantes e coisas passando batido. E eu busco chamar a atenção. Não poderia ser diferente, diante de toda a carreira que eu tenho e toda a história que eu construí dentro do rap nacional.
Essa provocação traz exatamente que a evolução para o banco é esfriar a relação. Você chega, não fala com ninguém, é um chat chato que não atende, que não resolve, é uma voz teleguiada.
E o professor Nicolelis, que tanto nos orienta, fala assim “GOG, não existe uma inteligência artificial na realidade. É um nome que foi colocado aleatoriamente, mas a inteligência é orgânica. Nasce da experiência, da subjetividade, ou seja, do abraço, do afeto, do carinho, do jeito de se relacionar”. Por outro lado, a gente já coloca mais uma provocação diante disso: também não existe uma burrice natural.
Essa burrice natural, que colocam para nós como se alguns seres humanos fossem portadoras dela, na realidade não existe. Então, a gente reforça ainda mais a cultura, a coletividade e a colaboração, para que possamos enfrentar os desafios atuais.
O refrão da música traz uma ramificação de estratégias, de pensamentos e de provocações para a comunidade. AfroRagga é quem traz essa ideia do robô. E eu não posso deixar de lembrar também que ele e o nosso parceiro Lucas Pimentel também trouxeram contribuições para a produção musical desse som.
Qual a sua visão sobre a regularização das plataformas digitais?
Esse é um tema que não pode deixar de ser discutido principalmente nas comunidades, nas periferias. Parece uma discussão distante de nós, mas todo dia isso faz parte do nosso cotidiano.
Essa discussão foi imprescindível para que eu tomasse a decisão de, em parceria com o Sindicato dos Bancários de Brasília, trabalhar e discutir a precarização do sistema bancário e as consequências, como o desemprego, o aumento do número de suicídios, o aumento das separações, etc. Não é uma coisa que esteja dissociada da nossa vida.
A gente também tem que dizer que a internet, cada vez mais, deixa de ser um espaço democrático. Mas é onde as pessoas depositam muitas vezes as suas frustrações, porque elas acreditam que ali podem ser quem elas realmente são.
Em relação ao tema da regularização das redes, muita gente confunde libertinagem com liberdade de expressão. Elas pensam que, quando ocupam um espaço, têm o pátrio poder daquele espaço. Então, falam o que querem, machucam como querem e confundem isso com liberdade de expressão. Na realidade, isso é agressão.
Falta muitas vezes a percepção da coletividade que o hip-hop sempre pregou. Se existe uma revolução de um só, ela é vaidade. E a vaidade combina muito com as pessoas que têm um pensamento meio retrógrado, no sentido de pensar que falar o que quer é ser atual, de achar que sentimento é coisa do passado.
É preciso ficar atento ao monitoramento dos nossos dados por meio da tecnologia?
O celular ouve. E tem um dado real: a câmera do celular com a qual você faz a famosa selfie, é uma câmera de espionagem. O microfone faz com que eles escutem tudo o que você conversa.
Não é por acaso que, por exemplo, quando você vai no Instagram e em algumas redes sociais, o que você parar para observar daqui a pouco está no seu celular. Parece que eles adivinham, mas, na realidade, não é adivinhação, é sondagem. Isso já nos assusta bastante e o mais assustador é que isso só tende a aumentar. A tecnologia, sem o afeto, sem o abraço, ela não é tecnologia, é inteligência artificial.
Outro dado que também acho assustador e que a gente não percebe é que quem alimenta essa maldade, muitas vezes colocada como inteligência artificial, é uma pessoa que se sente inteligente naturalmente. O ser humano pode emburrecer a máquina.
A máquina é emburrecida também pela ação humana. A gente não pode deixar de fazer esse contraponto e lavar a roupa suja entre nós que reclamamos muito da máquina. Tem uma parte de nós nesse problema.
Diante desse cenário, como podemos agir?
A contribuição de Fanon na reflexão sobre a utilização do rádio no processo de lutas na Argélia é atual e importante. Eu trago também como contribuição Gil Scott-Heron e seu conhecido poema A revolução não será televisionada. Esses dois mestres tentavam traduzir para nós que, se a tecnologia não for aliada à melhoria da tecnologia humana, ela está fazendo desserviço.
Nós tivemos no Brasil coisas que não nos vêm à mente quando temos um diálogo desse nível. Em 1998 e 1999, por exemplo, o rap nacional visitava as periferias de São Paulo, principalmente nas zonas sul e leste, onde continham mais de 4 mil rádios comunitárias, que eram chamadas de “piratas” mas que prestavam um serviço comunitário na sua essência.
Quando teve a primeira Conferência Nacional de Comunicação dentro de um governo dito progressista, o que ficou acertado por meio do Plano de Comunicação definido no encontro foi a diminuição dos watts dessas rádios para 25 watts, e, assim, acabou as rádios comunitárias de São Paulo e do Brasil, foram caladas.
É uma estratégia muito louca. Quando o Estado, mesmo com um governo progressista, não tem sensibilidade e percepção do perigo que ronda, ele se transforma em algo que não é saudável para a comunidade.
Hoje, nós temos dificuldade de comunicação. Hoje, como você não trabalha organicamente, você não não enxerga as pessoas, as pessoas têm aquela facilidade de falar e de serem, muitas vezes, não verdadeiras nos seus relatos.
Isso traz uma provocação de que erramos em algum momento. É preciso lavar essa roupa suja. Mas, a todo momento, surgem oportunidades. Isso é da vida, é da estrada, é parte do caminho revolucionário perceber que a todo momento a gente tem oportunidades de trabalhar. Hoje eu vejo, por exemplo, como novos meios de comunicação e tecnologias o freestyle e o próprio slam.
As batalhas são muito importantes. Elas agregam juventude e é na juventude que se dá essa ebulição. É preciso dizer que, num país como o Brasil ou como os países africanos que também passam por momentos muito parecidos com o nosso, porque periferias e periféricos são periferias em qualquer lugar, os problemas são parecidos, mas a linguagem revolucionária tem que trazer também as soluções e elas são próximas.
Nós precisamos ocupar, habitar as tecnologias e torná-las realmente inventos humanos e não simplesmente nos transformar em máquinas humanas. Eu fico muito feliz de poder estar falando de um veículo de comunicação tão importante e falando de coisas tão sérias para a sociedade brasileira e mundial.
Com a Casa GOG, você homenageou Lydia Garcia. Quem é essa mulher e quais são seus ensinamentos?
Que oportunidade única e maravilhosa. “Dê minhas rosas em vida para que eu sinta o perfume das rosas”. É muito importante falar de Lydia Garcia, uma senhora hoje, um baobá, completando seus 88 anos de idade, com toda vitalidade, com toda estrutura ancestral, preparada para nos transmitir e para reforçar as trincheiras da transformação brasileira.
Nós tivemos em Brasília a Conferência Nacional pela Igualdade Racial e eis quem está lá, quem não falta nenhuma demanda. Já vem a primeira aula: se você quer mudar, faça parte da mudança, entra no caminhão, entra no bonde, no vagão da mudança. A professora Lydia Garcia nos passa essa aula a cada momento.
Ela tem sua sala e seu nome já referenciados na Casa GOG. Outra cena que eu tenho muito orgulho de falar da professora Lydia Garcia, é que todos os seus filhos e todos os seus netos, são da arte e da cultura.
Ela conseguiu envolver a comunidade familiar com sua luz negra eterna. Outro ponto é que todos os filhos e todos os netos têm nomes de revolucionários de países que foram libertados durante a fase de lutas contra o colonialismo em solo africano.
Nós temos o Kwame e a variedade de todos os revolucionários de todos os países que conseguiram a sua liberdade. E Lydia me traz muita força, muita estrutura para continuar caminhando e continuar dizendo “nós somos o que podemos, mas podemos ser também o que queremos”.
É muito importante a gente falar dessa caminhada dos ancestrais, porque o GOG, queira ou não, tenho que admitir, já sou um baobá, já faço parte da história, já sou um griô. E é muito bom poder falar e trocar ideias com vocês que florescem a nossa estrada revolucionária.
Conversa Bem Viver

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