A Cúpula Nacional Popular encerrou, nesta segunda (29), três dias de debates em Bogotá (Colômbia) com a aprovação de uma declaração final que projeta uma agenda de mobilizações em todo o país a partir de outubro. O encontro também decidiu criar um espaço permanente de convergência dos processos das organizações urbanas colombianas, consolidando um marco de unidade para os próximos anos.
O documento foi elaborado após reuniões com delegações de 15 cidades, entre elas Cartagena, Barranquilla, Cali, Medellín, Cúcuta e a capital Bogotá. As discussões foram realizadas na Universidade Pedagógica Nacional, que recebeu cerca de 1.500 participantes, entre trabalhadoras das economias populares, lideranças sindicais, comunidades negras, juventudes, artistas, coletivos de moradia, guardas populares urbanas e organizações de mulheres.
Um dos principais pontos aprovados na declaração foi a defesa de uma Reforma Urbana Integral e Popular, com acesso à terra, serviços públicos básicos e recuperação dos territórios. Para Juliana Ramírez, uma das porta-vozes da Cúpula, esse é o coração da agenda definida pelos movimentos.
“A conclusão é de uma reforma urbana integral, que garanta terra para viver, acesso universal aos serviços públicos e a recuperação ampla dos territórios urbanos. Sem isso, nossas cidades continuarão reproduzindo exclusão e desigualdade”, explica.
Segundo ela, o modelo neoliberal de cidade “expulsa os pobres para as periferias e privatiza o que deveria ser comum”. Ramírez destacou ainda que a luta urbana não se limita à moradia: envolve transporte, saúde, educação e o direito a permanecer nos bairros populares.

A disputa pelo espaço público foi apresentada como eixo estratégico da Cúpula. Para Julián Díaz, a forma como as cidades são hoje planejadas reforça desigualdades e vulnerabiliza as classes populares.
“As cidades foram configuradas para segregar, e isso aparece em todas as esferas, até na cultura. Por isso, disputar o espaço público é um sentido comum, e as artes e a cultura são ferramentas fundamentais nessa luta”, afirma. Ele acrescenta que as mobilizações de outubro terão o espírito de ocupar as ruas para reafirmar que “as cidades são para todas e todos”.

Como decisão estratégica, as organizações anunciaram a criação de um espaço permanente de convergência dos processos urbanos, com instâncias locais, regionais e nacionais. A ideia é sustentar a Cúpula Nacional Popular (Cunap) como um marco de articulação contínua.
“A partir desta convergência queremos consolidar uma proposta alternativa de cidade e somar forças em um processo de transformação mais amplo para toda a Colômbia”, destaca o documento final.


Contra o paramilitarismo e pela segurança popular
Os debates entre os movimentos ocorreram sob o impacto de um ataque com bombas caseiras no sábado (27), durante a realização da cúpula. Foram registradas ao menos sete explosões ao longo do dia, em áreas próximas às cozinhas coletivas e quadras da universidade.
Embora não tenha deixado feridos, o episódio foi interpretado como uma tentativa de intimidação. A equipe de segurança da cúpula identificou indícios de bombas de cloro improvisadas. A suspeita recai sobre grupos paramilitares com atuação em instituições de ensino.
A organização da Cúpula afirmou que os ataques carregam conteúdo ideológico e político. Em função de episódios como esses de violência política, um dos pontos centrais da declaração foi o enfrentamento ao paramilitarismo, que segue ativo nas cidades e áreas rurais do país.
Laura Ochoa, também porta-voz da Cúpula, explica que a violência política exige respostas organizadas da sociedade. “O paramilitarismo continua assassinando lideranças populares em todo o país. Por isso, em outubro vamos ampliar a luta, com uma mobilização que deve reunir mais de 5.000 pessoas”, projeta.


Ela ressalta que as organizações querem debater um novo modelo de segurança. “Não aceitamos mais a doutrina de segurança nacional que protege acumuladores e criminaliza pobres e lutadores sociais. Estamos construindo mecanismos comunitários de autocuidado, como as Guardas Urbanas Populares, e exigimos a instalação de uma Comissão da Verdade Popular para que haja justiça e reparação.”
Mesmo com a política de paz total do presidente Gustavo Petro, os episódios de violência contra lideranças sociais, indígenas, camponesas e de ex-combatentes seguem em patamares altos.
De 2016 a 2024, o Instituto de Estudios para el Desarrollo y la Paz (Indepaz) registrou quase 2 mil líderes sociais assassinados; somente em 2023 foram 188, em 2024 foram 173 e, até agosto de 2025, já passam de 100 casos.


Feminismos, antirracismo e juventudes
A Cúpula declarou emergência nacional frente ao avanço dos feminicídios no país e reforçou a necessidade de cidades antipatriarcais e antirracistas. A proposta é fortalecer redes comunitárias de cuidado, impulsionar economias populares com enfoque de gênero e consolidar zonas de proteção etnoecológicas.
Na área da educação, a declaração exige uma nova Lei de Educação ao serviço da classe trabalhadora e a criação de um sistema nacional de bem-estar educativo. As organizações também decidiram preparar, para os próximos anos, uma Cúpula Nacional Popular de Juventudes e Estudantes.
A agenda definida pela Cúpula prevê participação nas mobilizações feministas do 25 de novembro (25N) e do 8 de março (8M), além de uma jornada nacional contra a gentrificação e contra o sistema de transporte neoliberal.
Entre os próximos passos também estão a preparação de uma ocupação nacional de terras e infraestruturas urbanas, o apoio ativo às lutas das crianças e adolescentes, e a realização do Festival Nacional de Arte “A la esquina y la vereda”, programado para dezembro de 2025 em Bogotá.
A declaração final encerra afirmando que a Cúpula Nacional Popular “correrá como um rio que antecipa a ruptura com tudo o que oprime nas cidades” e envia uma mensagem de solidariedade internacional ao povo palestino.