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Andréa Medrado

Maio é laranja e urgente: o corpo das crianças não é público

Esse mês é o momento de conscientizar, informar e exigir do Estado políticas públicas que protejam de verdade a infância

Há poucos dias, estávamos num bar comemorando o aniversário de um parente. Na mesa à frente da nossa, duas mães conversavam enquanto suas filhas brincavam. As crianças, deviam ter por volta dos 7/8 anos. De repente, um casal de idosos e dois homens passaram por ali e, sem pedir permissão, tocaram nas meninas: no cabelo, no pescoço. Sem constrangimento. Sem consentimento. As crianças paralisaram.

Ontem, na fila do supermercado, um homem tentou tocar na minha filha caçula, Maria Flor. Eu disse alto e firme: NÃO! Ele não gostou, claro. Mas minha filha mais velha, Clara, respondeu o que eu também pensei:

“As pessoas são tão sem noção, né mamãe? Como podem tocar no corpo das crianças sem permissão?”

Pois é. Parece que o corpo das crianças — especialmente o das meninas — é visto como público. Mas não é. Nunca foi.

É preciso dizer isso em voz alta. É preciso repetir: o corpo das crianças não é público!

E quando falamos em violação, estamos falando também de violência sexual. Sabiam que a maioria dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes acontece dentro de casa ou é praticada por pessoas conhecidas da vítima? Os dados são do Disque 100 de 2023, do Ministério dos Direitos Humanos.

É por isso que o Maio Laranja é tão importante.

Maio é o mês de combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes. Como mãe de duas meninas, esse tema me atravessa. E ainda mais por uma delas ser uma criança com deficiência e não falante, o que aumenta ainda mais sua vulnerabilidade.

Meninas e mulheres com deficiência estão mais vulneráveis à violência por causa de fatores como a dependência de terceiros, a desigualdade de poder nas relações com familiares e cuidadores, além de barreiras na comunicação e estigmas que as cercam. De acordo com o Atlas da Violência 2023, do Ipea, o número de notificações de violência contra mulheres com deficiência é alto: são 45 casos para cada 10 mil, com destaque para a faixa etária de 10 a 19 anos.

Esse mês é o momento de conscientizar, informar e exigir do Estado políticas públicas que protejam de verdade a infância — especialmente a das meninas. Precisamos falar sobre isso em casa, nas escolas, nos serviços de saúde, nos espaços públicos. Essa conversa precisa incluir todo mundo.

É nesse caminho que iniciativas como o Projeto Eu Me Protejo fazem a diferença. Criado pela jornalista Patrícia Almeida e pela psicóloga Neusa Maria, o projeto ensina, com uma linguagem simples e acessível, que o corpo da criança é dela — e de mais ninguém. Ensina a reconhecer sinais de abuso, a buscar ajuda e, principalmente, a entender que nenhuma violência é culpa da criança.

O material do projeto é gratuito e pode (e deve!) ser usado por escolas, profissionais da saúde, clínicas, instituições e também por nós, mães, pais e cuidadores. Um conteúdo valioso, que respeita as diferenças e inclui crianças com e sem deficiência.

Denunciar é um ato de proteção. Ligue 100 em casos de abuso. A denúncia é anônima e pode salvar uma vida.

E pra conhecer e usar o conteúdo do projeto, acesse: www.eumeprotejo.com e siga nas redes sociais.

Proteger a infância é responsabilidade de todos nós. Não se cale. Não aceite. Não permita.

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*Andréa Medrado é ativista, mãe típica e atípica, membro do grupo Pitt-Hopkins Brasil.

** Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha do editorial  do jornal Brasil de Fato – DF.

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