Após mais de uma década de reivindicações de organizações da sociedade civil, o Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara) foi finalmente instituído, em junho passado, por um decreto do Presidente Lula. O programa enfrentou um caminho cheio de obstáculos à sua aprovação, especialmente por parte do lobby do agronegócio, o que provocou dúvidas em alguns setores de que o Pronara possa, realmente, sair em breve do papel. Conversamos com integrantes da Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Cnapo), que acompanha a execução do programa, para entender o que falta para a implantação dessa importante política pública e qual a previsão para o início de sua implementação.
O Pronara foi criado para contribuir com a redução dos agrotóxicos, tanto do consumo quanto da produção, por meio do fortalecimento dos bioinsumos, apoio à agricultura familiar e à agroecologia, e é parte fundamental do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo). Suas medidas visam resguardar a saúde da população e do meio ambiente com o incentivo a práticas agrícolas mais sustentáveis do que as que predominam hoje no país. Envolve vários ministérios, coordenados pela Secretaria-Geral da Presidência: Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA); Saúde (MS); Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA); Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) e Agricultura e Pecuária (Mapa).
Segundo Rogério Dias, integrante do Instituto Brasil Orgânico e conselheiro da Cnapo, a implantação do decreto depende da criação do grupo gestor, que é composto pelos seis ministérios que assinam o documento, junto com o presidente da República. O grupo gestor também terá a responsabilidade de apresentar a planilha de ações. “O Pronara já está valendo, só precisa da planilha de ações com a previsão de iniciativas. A Secretaria-Geral da Presidência ficou com a incumbência de ser a coordenadora desse comitê gestor, estamos cobrando a formação do comitê, a planilha de ações e sua publicação no Diário Oficial da União”, afirma Dias.
A Cnapo já apresentou uma proposta para a planilha de ações do Pronara, mas aguarda definições sobre o que será validado, ou não, pelos ministérios. Cada uma das iniciativas tem que ter algum órgão do governo que a assuma, e aí entra a questão financeira. A princípio, quando um órgão assume a iniciativa, já é considerado que tem os recursos para executar. Além disso, a execução do Pronara não está prevista para ocorrer de uma vez. “A gente sabe que, para esse ano, terá o orçamento que for possível, mas estamos cobrando o orçamento na proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) para o ano que vem”, explica Dias.
Jairã Tingui Boto, representante do Grupo de Trabalho (GT) Povos Indígenas da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e integrante da Cnapo, lembra que nenhuma política pública é passível de ser executada sem recursos. “Se o Estado brasileiro quiser mesmo reduzir agrotóxicos na alimentação, poderia, por exemplo, financiar o Pronara a partir da cobrança integral de impostos das empresas produtoras desses venenos, como Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), dos quais, atualmente, os agrotóxicos são isentos”, sugere.
Ele espera que a implementação do Pronara seja imediata, lembrando que algumas das ações já estão em andamento, mas precisam ser integradas ao programa. “Ações como o estímulo ao uso de insumos biológicos já eram praticadas antes mesmo do Pronara, mas precisam ganhar visibilidade como forma de incentivar a redução de agrotóxicos”. Outras iniciativas que constam do Pronara e já estão sendo executadas pertencem, por exemplo, à área da saúde.
O monitoramento do Pronara é feito por uma subcomissão temática da Cnapo, que tem se reunido semanalmente. A subcomissão é formada por um pool de pessoas e entidades.
A realização do Congresso Brasileiro de Agroecologia (CBA), em outubro, em Juazeiro (BA), pode acelerar a definição dos próximos passos do Pronara, acredita Dias. “Para este momento, a gente já tem que ter um bocado dessas respostas mais definidas e organizadas”, diz ele.