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Jornalista, trabalhou, entre outros, em veículos como Estadão, Veja, Jornal da Tarde e Agência Estado. Documentarista da questão da terra, autor de livros, entre os quais "Os Vencedores" (Geração E...ver mais

Perguntas para um trabalhador que votou contra si mesmo

Alguns elementos para meditar e considerar antes do próximo encontro com a urna

Quarenta e sete milhões de brasileiros e brasileiras votaram em Jair Bolsonaro. Qual teria sido a razão de tal escolha? 

Afinal, estes eleitores, na sua maioria, não são empresários, banqueiros, especuladores da Bolsa de Valores, grandes latifundiários e executivos de multinacionais.

Se assim fosse, as perguntas a seguir não fariam qualquer sentido. As declarações do candidato do PSL e do seu guru econômico, Paulo Guedes, revelam que é para os muitos ricos, a alta classe média e a caserna que, caso eleito, pretende governar. 

Sua votação no primeiro turno, porém, foi alimentada pelos votos de trabalhadores e trabalhadoras que dependem do salário, muitas vezes curto demais para enfrentar o mês, garantir o pão na mesa, o aluguel, a roupa, a prestação, o transporte.  

Com o maior respeito do mundo, entendo que, na hora de apertar o botão da urna eletrônica, pode ter fugido à lembrança deste eleitor, aquilo que o candidato fez ou deixou de fazer ao longo de 27 anos de vida pública. Tentando tirar esta dúvida, faria algumas perguntas a este eleitor ou eleitora que, quem sabe, inadvertidamente decidiu contra seus próprios interesses, sua vida, seu futuro e o futuro de seus filhos.

Por exemplo, o deputado Bolsonaro votou a favor da reforma trabalhista de Temer em 26 de abril de 2017. Com sua postura, fragilizou o emprego, o salário e os direitos trabalhistas. E limitou o acesso gratuito à Justiça do Trabalho. Sobre o assunto, ele e Temer pensam da mesma forma. 

Bolsonaro também é favorável à reforma de previdência de Temer. Novamente, está no mesmo barco de Temer. É aquela reforma que cria imensas dificuldades para o trabalhador se aposentar. Vai trabalhar até morrer.

Lembra do Projeto de Emenda Constitucional 241, conhecida como a PEC da Morte? Ela congelou por 20 anos os gastos em Saúde, Educação e Assistência Social. Adivinhe de que lado a corda vai rebentar? Do lado de quem precisa do posto de saúde, do SUS, da escola gratuita, do apoio social na hora mais difícil. Do lado do trabalhador, é claro. De quem partiu a proposta não é preciso nem perguntar: Temer, de novo. E Bolsonaro votou pela sua aprovação…

Por falar nisso, Saúde e Educação receberiam os recursos gerados pelo Pré-Sal. Temer, porém, está leiloando o futuro das próximas gerações. Em outubro de 2016, a Câmara dos Deputados aprovou a desobrigação da Petrobras operar sozinha a exploração do Pré-Sal. Em junho passado, a companhia foi autorizada a vender até 70% da exploração do Pré-Sal. E quem votou com Temer nas duas vezes? Ele mesmo: Bolsonaro. 

Em março de 2017, mais um avanço de Temer contra as garantias do trabalho: a aprovação da terceirização de mão de obra em todas as áreas, sendo atividade fim ou atividade-meio. Como votou o deputado? Absteve-se. O que, na prática, representou voto favorável. Voto favorável a mais uma proposta de Temer, é claro.

Mais de seis milhões de mulheres trabalham como empregadas domésticas no país. Em 2013, quando passaram a ter direitos como jornada de oito horas de trabalho, horas extras, FGTS obrigatório e seguro-desemprego, quem votou contra a chamada PEC das Domésticas, que retirava uma categoria inteira de condições aparentadas com a escravidão? Fácil. Ele, Bolsonaro.

Isto tudo sem falar no 13º. Salário? É bom não esquecer que o general Mourão, vice de Bolsonaro, deseja extinguí-lo. Você também acha que seria bom acabar com o 13º?

Mas seria injusto afirmar que Bolsonaro vota sempre contra aumentos de salário. Do seu, por exemplo, ele vota a favor. Foi assim, por exemplo, em 15 de dezembro de 2010, quando aprovou elevação dos próprios vencimentos. Afinal, ninguém é de ferro… 

Aliás, sobre os ganhos dos parlamentares, Bolsonaro deu uma resposta áspera a um de seus apoiadores. Em vídeo que circula pelo Youtube, quando o homem sugere que os deputados dêem o exemplo, reduzindo os próprios salários, o candidato do PSL retruca: “Quem vai votar isso?” A seguir, enumera as vantagens de que desfrutam os deputados e seu salário de R$ 33 mil mensais. “Eu não abro mão disso”, enfatiza. Faria melhor se defendesse com a força igual os ganhos dos trabalhadores, não é mesmo?  

São apenas alguns elementos para o eleitor e a eleitora assalariados meditarem e considerarem antes do próximo encontro com a urna. Pensem nisso.

*Ayrton Centeno é jornalista. Trabalhou, entre outros, em veículos como Estadão, Veja, Jornal da Tarde e Agência Estado. Documentarista da questão da terra, autor de livros, entre os quais "Os Vencedores" (Geração Editorial, 2014) e “O Pais da Suruba” (Libretos, 2017)

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