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Boletim Ponto

 Ar rarefeito

A última pesquisa AtlasIntel trouxe alívio para o governo, mas o retrato ainda não capta efeitos do escândalo do INSS

Olá, o governo respira, mas do INSS à Selic, passando pelo Congresso, a atmosfera está tóxica.


.Na corda bamba. A última pesquisa AtlasIntel trouxe alívio para o governo: a aprovação subiu levemente, depois de três meses em queda, passando de 44,9% para 46,1%, e a desaprovação diminuiu, indo de 53,6% para 50,1%. O problema é que este retrato não capta ainda os efeitos do escândalo do INSS, que levou à demissão do presidente da instituição no dia 23 de abril. Como adiantamos na semana passada, as repercussões do caso poderiam ter sido piores se as atenções não estivessem todas voltadas para o Vaticano. O que favoreceu o governo, dando tempo de esfriar a pauta e delinear uma estratégia de resposta. Pesa a favor de Lula o fato de que os descontos ilegais na conta dos aposentados iniciaram em 2019, coincidindo com a chegada de Bolsonaro à presidência. Porém, houve demora do Ministério da Previdência em investigar as suspeitas conhecidas desde junho de 2023, o que coloca o ministro Carlos Lupi no centro da crise. Além do aumento nos descontos nos últimos anos, pesa sobre o ministro o fato do presidente demitido do INSS, Alessandro Stefanutto, ser uma indicação pessoal e estar vinculado ao PDT. A PF investiga ainda o lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “careca do INSS”, sócio de 21 empresas, a maioria criadas a partir de 2022, que funcionariam como intermediárias financeiras das associações que participavam da fraude. Portanto, é verdade que o tema é espinhoso para a oposição, mas não ao ponto de deixar passar uma oportunidade de ouro para desgastar o governo. Aliás, para a direita, uma possível CPI do INSS no Congresso chegaria em boa hora para substituir a pauta morna da anistia, mantendo as bases mobilizadas e antecipando o clima que se deve esperar para a campanha de 2026. E, para variar, mais uma vez o futuro do governo passa pelas mãos do centrão, na figura de Hugo Motta, que saberá cobrar a fatura para enterrar a CPI. A estratégia de Lula tem sido estancar a crise rapidamente, nomeando um novo presidente para o INSS, o funcionário de carreira com fama de xerife, Gilberto Waller Júnior, e prometendo devolver os descontos indevidos na conta dos aposentados. Quanto a Carlos Lupi, por hora ele fica onde está, garantindo a fidelidade do PDT ao governo, tão preciosa num Congresso a cada dia com mais cara de direita. Mas os riscos existem, e podem ser graves, a depender dos fatos que venham a ser revelados pelas investigações.

.Arenão. Com um pé no governo, o outro na oposição, e os dois em 2026, o PP e o União Brasil anunciaram a superfederação chamada União Progressista. A aliança contará com 109 deputados, superando o PL como maior bancada da Câmara; 14 senadores, dividindo a hegemonia do Senado com o PSD e PL; 4 ministros; 6 governadores; o maior número de prefeituras do país, e R$1 bilhão do Fundo Eleitoral. O DNA da ARENA da ditadura militar, de onde saíram o PP (antigo PDS) e o DEM (antigo PFL), prevalece no campo ideológico, já que a nova federação não tem nada de progressista. Tampouco de unidade. O monstro nasce com muitas cabeças. Conta com a ala governista de Davi Alcolumbre e ministros e uma ala oposicionista disputando a direção, com Antônio Rueda, ACM Neto e Caiado – do Democratas – e Ciro Nogueira do Progressistas. Além das disputas paroquiais e a definição sobre a relação com o governo, a questão central é como a federação que pretende eleger 80% dos governadores vai se localizar nas eleições do próximo ano. Pré-candidato e contrário à aliança, Ronaldo Caiado recebeu a promessa de que será candidato se marcar acima de 10% nas pesquisas. Mas, apesar das sinalizações de fidelidade a Bolsonaro, tanto Ciro Nogueira quanto parte do DEM esperam por Tarcísio de Freitas. Posição semelhante à de outra força esquizofrênica, o PSD, que deve receber nos próximos dias outro pré-candidato, Eduardo Leite. O governador gaúcho pretende desembarcar do PSDB, em fusão com o Podemos, antes do desaparecimento formal da sigla, já que eleitoralmente os tucanos não existem mais. 

.Fora do jogo? Mas não é apenas o governo que está atento aos movimentos da União Progressista. Na prática, a superfederação também sinaliza que a direita não vai esperar por Jair Bolsonaro para definir seu destino. Esse também é o cálculo de Tarcísio de Freitas. O governador paulista não quer deixar o cargo seis meses antes das eleições e correr o risco de não ser ungido como sucessor de Bolsonaro. Neste momento, Tarcísio prefere apostar numa reeleição sem turbulências para o Palácio dos Bandeirantes. Evidentemente, se o movimento da direita em abandonar Bolsonaro se acelerar, o cenário pode mudar, pois há sinais de que o ex-capitão deve ser entregue à própria sorte. A costura entre Davi Alcolumbre, Hugo Motta e o STF para um projeto alternativo ao da anistia reduziria a pena dos peixes pequenos envolvidos no 8 de janeiro, mas não salvaria os integrantes do centro golpista. A aprovação da proposta tiraria o tema da anistia da agenda política, mas principalmente, deixaria Jair Bolsonaro sem um palanque no Congresso. E, como ironiza Leonardo Sakamoto, se for contrário à proposta, Bolsonaro reconheceria que está usando os presos de 8 de janeiro e a discussão da anistia apenas para benefício próprio. O silêncio dos governadores de direita sobre seria outro sinal de que os Bolsonaros serão deixados para trás. Pior também para o PL, este sim completamente atrelado ao destino da familícia, que poderia perder mais deputados para a nova federação, além da liderança que possuía dentro da direita. A preocupação pode ser medida pela gafe do líder do partido na Câmara que, no desespero para barrar a proposta, confessou o esquema de distribuição das emendas de Comissão na Câmara


.Nada a comemorar. Graças a Gabriel Galípolo, os trabalhadores e as centrais sindicais não tiveram muito o que comemorar neste 1º de Maio. Não satisfeito em manter intocado o legado de Campos Neto, o menino dos olhos da Faria Lima já sinaliza com um novo aumento da taxa Selic na próxima semana e comemora que a “a economia já dá sinais de desaceleração”. Evidentemente. Afinal, não há economia que resista a uma taxa de juros beirando os 15%, acompanhada de uma inflação, que não baixou um centímetro com as sucessivas altas da Selic. Ao contrário, além do preço da carne que continua disparando, nos próximos dias, também a conta de luz será mais salgada. Mas não é só do Banco Central que os trabalhadores não podem esperar nada. No STF, enquanto todos os olhares estão voltados para o julgamento dos golpistas, continua em cima da mesa de Gilmar Mendes a derradeira morte das leis trabalhistas com a farra da pejotização que deve jogar por terra os direitos trabalhistas. E se o fato novo na luta política dos últimos meses foi o projeto pelo fim da escala 6 x 1, presente na reivindicação das centrais sindicais no 1º de maio e acolhido no pronunciamento de Lula, a proposta não deve contar com apoio do Congresso, como verbalizou nitidamente Hugo Motta, que definiu a proposta como “sonho”.


.Ponto Final: nossas recomendações.

.EUA: A era da Oligarquia. No Outras Palavras, John Bellamy Foster analisa a decadência estadunidense e o governo dos bilionários sem intermediários.


.Reforma trabalhista aumentou informalidade ao enfraquecer sindicatos, diz estudo inédito. Na BBC, Thaís Carrança apresenta estudo que comprova os impactos da reforma trabalhista.


.Plano de reconstrução do RS avança devagar, sem transparência e não mira em prevenção. Um ano depois das enchentes no Rio Grande do Sul, quase nada mudou ou foi reconstruído. Na Agência Pública.


.‘Igualzinho ao tigrinho’: Paraná inaugura minicassinos chancelados pelo governo Ratinho Jr.. Como funcionam as betshops paranaenses com contratos de dez anos e lucro estimado em mais de R$7 bilhões. Na Carta Capital.


.Uma agenda econômica da esquerda. O Instituto Tricontinental compartilha as principais decisões do encontro de ativistas e economistas para discutir a crise capitalista.


.Brasil de Fato acompanhou primeira exibição de Ainda Estou Aqui na China. Mauro Ramos mostra a reação dos espectadores chineses ao premiado filme brasileiro.


.Elis Regina canta, lê poesia e o horóscopo em programa de rádio. A Folha de São Paulo encontra programa de rádio inédito conduzido pela cantora gaúcha.

Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.

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