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Boletim Ponto

 Faça negócios, não faça guerra

O Ponto é editado por Lauro Allan Almeida e Miguel Enrique Stédile, do Front - Instituto de Estudos Contemporâneos, e é publicado todas as sextas-f...
 Com os adultos fora da sala, em viagens internacionais, o Congresso aproveitou a semana como uma criança sozinha em casa

Olá, o lema da China e do governo brasileiro é paz e prosperidade. Mas a direita brasileira, assim como Trump, prepara-se para a guerra.

.Lula e o dragão. A ida de Lula e grande parte do alto escalão do governo à China desafia o tom belicista de Trump. Ainda mais por ela ter sido precedida pela visita a outro membro dos Brics, a Rússia, na comemoração da vitória soviética sobre as forças nazistas. A atitude mostra que a linha da política externa brasileira é de não aceitar o clima de guerra fria tão desejado por Trump, posição que também foi assumida pela CELAC. O que fica evidente pelos esforços paralelos de manter boas relações com os Estados Unidos. Afinal, Lula sabe que é desnecessário tomar um partido já que, no relógio da história, o tempo está do lado da China. Passados 15 anos da virada que fez o dragão asiático superar os Estados Unidos como nosso principal parceiro comercial, agora são dados passos decisivos para integrar a economia brasileira ao desenvolvimento chinês, através das iniciativas Cinturão e Rota, que devem repercutir nos próximos anos. Os acordos firmados por Lula e Xi, que totalizam R$ 27 bilhões, e uma série de memorandos abrangem áreas muito variadas, que vão da infraestrutura à cultura, passando pela mineração, energia, alimentação, meio ambiente e comunicações. Dentre eles, destacam-se a expansão da montadora GAC, da mineradora Baiyin Nonferrous em Alagoas, da produção de energia renovável (eólica e solar) no Piauí, da construção de um parque industrial para a produção de “combustível verde” para aviação, da produção de semicondutores em São Paulo e no Amazonas, parcerias na área do cinema com a Huaxia Film e a Hotmaxx, além do projeto estratégico para a construção de uma ferrovia interoceânica ligando o Atlântico ao Pacífico. As iniciativas buscam ainda garantir a transferência de tecnologia chinesa para o Brasil. O sucesso da comitiva brasileira pode ser medido pela reação da oposição doméstica. Sem ter argumentos na área econômica para bater no governo, a direita se apegou a assuntos como a fala de Janja sobre o Tik Tok, à suposta conivência de Lula com governos autocráticos e a fala do presidente brasileiro condenando o genocídio palestino.

.Férias do barulho. Com os adultos fora da sala, em viagens internacionais, o Congresso aproveitou a semana como uma criança sozinha em casa. Além de transformar um depoimento na CPI das Bets num espetáculo de constrangimento e vergonha alheia, o Legislativo segue decidido a espezinhar o STF. Para isso, tornou o caso da suspensão do julgamento de Alexandre Ramagem num misto de legislação em causa própria e vingança pelos arrochos do Supremo no episódio das emendas. Mas, como o STF não cedeu, e ainda condenou a 10 anos de prisão outra personagem da turma do barulho, Carla Zambelli, o Congresso pretende retaliar ressuscitando a PEC que limita decisões monocráticas da Corte. Sem discutir nada de relevante na semana, a direita ainda apresentou três projetos de lei estapafúrdios para retirar tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito do código penal, mais uma saída mirabolante para compensar o naufrágio das articulações do PL da Anistia e da tentativa de suspender todos os processos na esteira do caso Ramagem. Outro projeto que voltou à pauta, inclusive em rodinhas de conversa em Nova York, é o que propõe o fim da reeleição. Assim como o semi-presidencialismo, ambas propostas oportunistas que tentam mexer de improviso nas regras do jogo de 2026. Por trás delas está o fato que a direita não sabe o que fazer com ou sem Jair Bolsonaro. Ninguém acredita que Bolsonaro esteja livre em 2026, mas seu ativo eleitoral conta para campanhas parlamentares e, por incrível que pareça, é o único nome que daria alguma unidade para a direita, segundo o próprio centrão, que não vê chances reais na na outra dezena de pré-candidatos. De quebra, o ex-capitão se recusa a dar passagem para Tarcísio de Freitas. Mas até 2026, o olhar do Congresso está mesmo no INSS. A queda na popularidade do governo e a repercussão negativa nas redes sociais atiçou o cheiro de sangue na oposição que parece mesmo decidida a abrir a CPMI. Resta saber se terão controle suficiente para evitar efeitos colaterais, como os rastros do governo Bolsonaro no esquema, inclusive envolvendo personagens das negociações das vacinas, e entidades do agronegócio.

.O inferno é o limite. Depois de entregar para o mercado o valor correspondente ao investimento chinês no Brasil com a última alta da Selic, o BC divulgou a ata da reunião do Copom onde sinaliza que, por enquanto, vai parar onde está. A Faria Lima parece ter se conformado que a Selic fique nos 14,75%, um índice do qual rentista nenhum pode se queixar. O problema fica para o trabalhador. Como o próprio BC “comemorou”, a economia dá sinais de desaceleração e deve diminuir o crescimento do emprego. Já a inflação, apesar das sucessivas altas dos juros, não cai. Os alimentos continuam puxando a inflação, junto com os medicamentos, duas coisas que as famílias não têm como cortar. Pior também para os inadimplentes, que hoje somam 70 milhões de brasileiros. Aliás, o próprio BC e o mercado concordam que, se houver redução da inflação, se deverá muito mais ao freio na guerra tarifária entre China e Estados Unidos do que ao trabalho da entidade monetária. Pior para o governo, que a cada afago de Galípolo na Faria Lima compromete mais o orçamento com a dívida pública. Com o estrangulamento à vista, o governo já prepara um contingenciamento de despesas, mirando aquelas que não são obrigatórias, mas que podem significar até R$40 bilhões em recursos congelados nos ministérios e programas. O mesmo caminho da austeridade deve ser trilhado pela proposta da reforma do Imposto de Renda no Congresso, que o presidente da Câmara, Hugo Motta, pretende tornar “mais abrangente” e “estruturante”. Entenda-se: usá-la como desculpa para fazer o ajuste fiscal.

.Ponto Final: nossas recomendações.

.China: Notas sobre um sistema singular. No Outras Palavras, Ladislau Dowbor mostra como o controle das finanças foi estratégico para o desenvolvimento chinês.
 

.Como a direita católica brasileira tem reagido ao novo Papa Leão XIV. As expectativas da direita por um Papa menos político e mais doutrinal, menos pastoral e mais litúrgico. No Diplô Brasil.
 

.O Império Invisível de Silas Malafaia. Reportagem especial do ICL detalha a trajetória e as redes de poder do mais bolsonarista dos pastores.
 

.Mais de 97% do desmatamento no Brasil nos últimos anos é resultado de pressão do agronegócio, aponta estudo. A queda no desmatamento não significa que a destruição do agronegócio terminou. No Brasil de Fato.
 

.Congresso se empenhou para agravar a crise climática de 2019 a 2022, mostra estudo. Estudo do INCT-ReDem, da Universidade Federal do Paraná, mostra o negacionismo climático do legislativo brasileiro.

.‘Queremos o INSS fora das páginas policiais’, diz Gilberto Waller. Entrevista exclusiva do Brasil de Fato com o novo presidente do INSS.

.Máquinas chinesas, terras camponesas. Documentário do Brasil de Fato mostra a parceria entre a China e o MST e a agricultura familiar.


.Pepe Mujica na UERJ. Relembre o histórico discurso do Presidente uruguaio para a juventude brasileira. No YouTube.

Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.

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