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Bruno Lima Rocha ([email protected] / www.estrategiaeanalise.com.be) é jornalista, cientista político e professor de Relações Internacionais; é membro do ICCEP / O Coletivo e participa da luta p...ver mais

Estamos em guerra fria

Neste século 21, são contrapostos modelos de desenvolvimento capitalista, dentro de alguns parâmetros.

Estamos diante de uma nova guerra fria. Não a das fronteiras ideológicas que se confundia com os processos de descolonização e libertação nacional. Neste século 21, são contrapostos modelos de desenvolvimento capitalista, dentro de alguns parâmetros.

Tal como no século 20, os países “centrais”, os que compõem o G7: EUA, Canadá, Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Japão se propõem a modelar o Sistema Internacional, junto com a União Europeia, Austrália, Nova Zelândia e o Estado Sionista. Se o ordenamento é imposto e ilegal, o recurso discursivo é o inverso. A ordem criada pelos vitoriosos na 2ª Guerra Mundial, o mundo pós Conferência de Yalta e Bretton Woods, hoje é pouco mais do que um recurso discursivo reivindicado por Estados do “Sul Global” para disputar em “igualdade de condições jurídicas” a globalização capitalista.

As “democracias ocidentais” ou ocidentalizadas, ao mesmo tempo, operam instrumentos de agressão militar em todo o planeta e não têm pudor algum em organizar uma guerra de provocação na Ucrânia x Rússia e no caso do Oriente Médio (Oeste da Ásia para os povos da região), a ordem mundial pós fraude imobiliária de 2008 e pós pandêmica herda a última guerra colonial do planeta. “Israel” é um país fictício, criado e mantido por fluxo populacional permanente e que se dá ao luxo de ter um financiamento de guerra que é ao mesmo tempo, infinito e a fundo perdido. Por isso bombardeia tudo ao redor, até que….

Duas guerras da Otan em andamento

O primeiro quarto do século 21 amadureceu duas guerras “próximas” do Ocidente: uma, na área core da Europa (quase na fronteira da Polônia e sobre a costa do Mar Negro); outra, com a agressão ao Irã iniciada em 13 de junho, uma sexta-feira treze do imperialismo (segundo o fuso local, madrugada no Irã quando as forças sionistas atacaram sem aviso nem declaração de guerra), atingindo as rotas marítimas mais relevantes do petróleo da Península Arábica e do Golfo Pérsico.

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), através dos fundos do Rearmamento Europeu, pode raspar os cofres da União Europeia e garantir o fluxo logístico para o governo do comediante de Kiev. Já o Estado Sionista, promovendo desde outubro 2023 o primeiro genocídio visto em tempo real do planeta (contra o povo palestino), depende de si pela primeira vez na história. Explico. “Israel” vai sempre ter um fluxo de armamentos e até operadores militares se for preciso.

Em 600 dias de “guerra” de extermínio, a população de Gaza foi bombardeada por uma média de 125 kg para cada um dos 2,1 milhões de habitantes do enclave. Mas os centros de poder administrados pelos genocidas de Tel Aviv não podem aguentar sem os sistemas de defesa antiaéreos. Não adianta receberem 12 F-35 com cinco dias de guerra se o “Domo de Ferro” ou o “Estilingue de David” e os “Sistema das Flechas” não abaterem os mísseis retaliatórios iranianos. Está a aposta, o domo se esfarela e….

Guerra Fria só de um lado por enquanto

Se estamos em uma nova guerra fria – e a convicção de quem escreve é que sim – o bloco “contra hegemônico” ainda não age em bloco – e talvez jamais o chegue a fazer. O “bloco” tem no Brics seu arco mais amplo, como um meio termo entre os agrupamentos econômicos eurasiáticos e intra-asiáticos (Comunidade Econômica Eurasiática e Organização para Cooperação de Xangai) e a maior amplitude dos 120 países Não-Alinhados pós Guerra Fria.

Podemos ver coesão no plano econômico – no sistema de trocas e com progressiva compensação e transação financeira fora do eixo do dólar / swift – e isto vir a provocar mais guerras imperialistas, levando os países não-ocidentais a buscarem mais poder dissuasório militar. Por enquanto é isso, é o que vemos, e não é pouco. Se e caso o Irã sair vitorioso (intacto em todos os níveis) será a sétima derrota de “Israel” neste século (perderam em 2000, 2006, 2009, 2012, 2014 e 2021), e seria a primeira vez que o apartheid colonial perde um conflito convencional. Caso o governo Trump 2 seja insano o bastante para invadir por terra o Irã, estará cavando a segunda derrota estadunidense no médio prazo (a primeira foi no Afeganistão, após 20 anos de guerra de ocupação.

Falando – escrevendo – com a franqueza de sempre. Não está em disputa um mundo socialista (ou das vertentes dos socialismos) contra uma ordem mundial capitalista. O que observamos é uma disputa quase mundial entre uma ordem capitalista ocidental versus a construção de uma ordem econômica asiática, eusariática e africana. Nesta competição e cooperação econômica é onde pode ser a grande oportunidade para o Sul Global. Neste cenário, além do Mundo Árabe e Islâmico, o maior centro de tensões é justamente na América Latina, com a projeção do Império contra a sua “periferia exclusiva”.

Sim, creio que estamos em Guerra Fria.

*Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.

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