Nesta semana, a Câmara Municipal de Curitiba foi palco de um verdadeiro “tratoraço”. A escolha das pautas de votação, com sete em regime de urgência, sendo seis de iniciativa do Prefeito e um da Comissão Executiva do Legislativo, chamou a atenção principalmente por anteceder um feriado, levantando questões éticas e de transparência. Tudo a toque de caixa, porque as reais urgências da população podem esperar, mas o cabide de empregos, jamais.
Alguns, em sua pressa incompreensível, fizeram questão de aprovar projetos que, convenientemente, visam o fortalecimento de estruturas administrativas que já ostentam um inchaço. Sim, estamos falando da criação de novos cargos, tanto na Prefeitura quanto na própria Câmara. Afinal, por que atender às necessidades da população quando se pode alimentar a própria máquina, não é mesmo?
Os destaques incluem a criação de 49 cargos comissionados na Prefeitura, sendo 40 na Secretaria de Governo e 9 no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC). O impacto orçamentário? Singelos R$ 7 mi em 2026. Justificativas como a “agilidade e padronização dos processos administrativos” não são suficientes para esconder o que pode soar como um favorecimento político, onde a “meritocracia” é um conceito tão esquecido quanto as promessas de campanha. A centralização de atribuições em uma única secretaria, especialmente em um órgão técnico como o IPPUC, não compromete a qualidade e a autonomia das políticas públicas, ela as joga pela janela. É uma abordagem que, com um sorriso cínico, ignora toda a experiência e credibilidade construídas ao longo dos anos.
A Casa do povo, a fábrica de cargos
Não bastasse a Prefeitura, a própria Câmara Municipal decidiu que era hora de dar o exemplo, aprovando seus próprios cargos comissionados, tanto administrativos quanto parlamentares. A Casa, que deveria ser um farol de responsabilidade e eficiência, preferiu se estender noite adentro discutindo a criação de mais assentos para seus apadrinhados, enquanto temas realmente urgentes continuam na fila de espera. A população, que desesperadamente clama por serviços públicos de qualidade, assiste a essa cena com a certeza de que suas prioridades não são as prioridades de seus “representantes”.
O impacto orçamentário? Aproximadamente R$5,5 milhões ao ano, que, para variar, não serão direcionados à valorização dos servidores, à melhoria das condições de trabalho e à implementação de ações institucionais permanentes, como os programas de capacitação promovidos pela Escola do Legislativo. E no mesmo bolo de departamentos que precisavam sim de mais cargos, colocaram os gabinetes dos vereadores. Seria conveniência?
A crise é nossa, a farra é deles
É preciso discutir direitos básicos como habitação, alimentação, saúde, educação, transporte e segurança. Enquanto famílias estão em situação de vulnerabilidade, crianças aguardam na fila por vagas em creches, milhares de curitibanos esperam por consultas e exames; alguns dos “nobres” vereadores e vereadoras se ocupam em fortalecer uma burocracia já saturada. Precisamos de políticas que, de fato, priorizem o bem-estar da população, e não a proliferação de cargos que servem apenas para perpetuar a ineficiência.
O feriado passa, a luta continua
É fundamental que a sociedade civil organizada, essa que paga a conta, cobre dos governantes uma postura minimamente responsável. A aprovação desses projetos não é um passo rumo ao progresso, mas sim um estrondoso retrocesso nas políticas públicas que realmente importam. Que possamos lembrar, incessantemente, que a verdadeira função da Câmara Municipal é servir ao povo de Curitiba e garantir que os recursos públicos sejam aplicados onde promovam dignidade e qualidade de vida, e não onde alimentem a festa dos apadrinhados.
Após o feriado, a cortina de fumaça da memória, certamente, tentará fazer com que este assunto seja esquecido. Mas nós, da bancada da oposição, não nos esqueceremos. Continuaremos na linha de frente, defendendo as pautas que realmente importam para os curitibanos e provocando as discussões que o poder tenta silenciar. O que mais precisamos aguentar para que a real função da Câmara seja priorizada?
*Camilla Gonda é vereadora de Curitiba pelo PSB, formada em Direito pela PUCPR, mestranda em Ciência Política pela UFPR, pesquisadora, ao lado da juventude e pelas mulheres