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Aumento de afastamentos por adoecimentos mentais acendem alerta: algo não vai bem

O APUBHUFMG+ é o sindicato dos professores e das professoras da Universidade Federal de Minas Gerais. A Coluna do APUBHUFMG+ é mantida pela diretor...
Os adoecimentos mentais são a materialização do capitalismo e da exploração de classe

Por Julie Amaral  

O número de afastamentos por questões ligadas à saúde mental aumentou de forma significativa no Brasil. Segundo dados do Ministério da Previdência Social, em 2024, 472 mil solicitações ao INSS foram motivadas por questões ligadas à saúde mental. Enquanto, em 2014, foram 221,7 mil notificações. Ou seja, em 10 anos, as notificações dobraram.

Os quadros mais prevalentes de adoecimentos foram os quadros de transtornos ansiosos e depressivos. Cabe observar, no entanto, que esses números se referem ao quadro de trabalhadores formais. Portanto, essa realidade pode ser ainda mais grave, se considerarmos todo o contexto do mercado de trabalho brasileiro.

De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, em um levantamento histórico de 2019, mais de 1 bilhão de pessoas viviam com algum transtorno mental. Os números tornaram-se ainda mais alarmantes no cenário pandêmico, em que os quadros de depressão e ansiedade cresceram cerca de 25%.

O relatório também aponta que as pessoas acometidas pelos sofrimentos psíquicos têm em média 10 a 20 anos de vida a menos que a população geral. Além disso, os países mais pobres estão mais suscetíveis a taxas mais altas de adoecimentos mentais, seja pelas condições socioeconômicas geradoras de sofrimento psíquico, seja pela dificuldade de estabelecimento de políticas públicas de acompanhamento, acolhimento e tratamento.

Cada sofrimento é contextualmente localizado

Os adoecimentos mentais são a materialização do capitalismo e da exploração de classe, uma vez que nosso corpo, comportamento e subjetividade estão subordinados às condições concretas de vida, incluindo, condições socioeconômicas, políticas, de trabalho e aspectos culturais.

Embora o sofrimento seja inerente à existência humana, a forma como se sofre denuncia um contexto social específico e não é um mero e exclusivo fruto de desiquilíbrios individuais e biológicos. Cada sofrimento é contextualmente localizado e uma grande revelação de que algo não vai bem socialmente.

Os altos índices de adoecimentos mentais prevalecem escancarando uma contradição à grande ordem capitalista: “o sentir-se bem” (a qualquer custo). A venda da ideia de uma vida com realização profissional, pessoal, sucesso e felicidade é uma importante ferramenta, uma espécie de fetiche, que esconde as contradições do capitalismo. Sob essa grande fantasia, a saúde mental de trabalhadores e trabalhadoras padece diante de uma profunda e incessante submissão à uma busca irreal.

Países mais pobres estão mais suscetíveis a taxas mais altas de adoecimentos mentais

Imersos e submetidos à cultura neoliberal, alimentada pela intensificação do trabalho, competitividade, exigência da multifuncionalidade e acúmulo de funções, exigência de proatividade, formas veladas e sofisticadas de coerção e captura da subjetividade, fragilidade de vínculos empregatícios, trabalhadoras e trabalhadores alimentam, com sua força de trabalho e com sua saúde, a grande roda da lucratividade.

Ainda nesse cenário nefasto, constrói-se uma narrativa de individualização do fracasso, na forma de culpa, e a transferência da responsabilidade aos próprios trabalhadores sobre a manutenção de sua própria saúde física e mental.

Além dos custos pessoais e coletivos, os afastamentos por adoecimentos mentais têm altos custos sociais, que são transferidos aos cofres públicos. Estima-se que, em 2024, os custos financeiros desses afastamentos tenham ultrapassado R$ 3 bilhões. Cada trabalhador e trabalhadora tem direito à saúde, especialmente saúde mental no seu ambiente laboral.

Para isso, contudo, são necessárias condições de trabalho salubres e dignas!

Saúde mental no trabalho importa

O Sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte, Montes Claros e Ouro Branco (APUBHUFMG+) compõe a luta por saúde e bem-estar e condições dignas no trabalho, compreendendo os modos singulares de produção de sofrimento da categoria docente.  

Atualmente está em vigor, junto à sua categoria, a campanha “Saúde Mental no Trabalho Importa”, como uma atividade que compõe 13ª Semana de Saúde Mental e Inclusão Social da UFMG, que termina somando com a comunidade externa no grande ato do desfile do 18 de maio, que neste ano acontecendo dia 16. Esse ato acontece em memória e reforço da luta antimanicomial que promove uma abordagem mais humanizada e inclusiva na saúde mental, contribuindo para o bem-estar e a valorização da saúde de todas as pessoas.

Julie Amaral é psicóloga do trabalho e integra o Núcleo de Acolhimento e Diálogo do APUBHUFMG+ (NADi/APUBH)

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Este é um artigo de opinião, a visão da autora não necessariamente reflete a linha editorial do jornal.

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