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Em defesa da escola pública; contra a militarização das escolas em MG!

Escolas Cívico-Militares atendem a interesses antidemocráticos e elitistas já que imprimem a cultura do medo e da ação autoritária.

Por Leonardo Machado e Luciano Mendes

Quem não deseja que as crianças da sua família frequentem as melhores escolas? Quem não quer ter tranquilidade quanto à segurança das crianças nas escolas? Todas as pessoas desejam isso, claro. Mas se desejamos que nossas crianças e adolescentes tenham acesso a uma escola da melhor qualidade, é preciso também que essa escola seja democrática e inclusiva.  No entanto, essa busca pela “melhor qualidade” tem sido ameaçada pela proposta da Escola Cívico-Militar, que não se alinha com os pilares de uma educação verdadeiramente transformadora, emancipadora, inclusiva e democrática. 

É por isso que acompanhamos com preocupação as ações para ampliação do modelo de gestão das escolas em São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Paraná, Rio de Janeiro, Pará, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul e no Distrito Federal, apesar da descontinuação da proposta pelo MEC em 2023 (Decreto nº 11.611/2023). 

Essas ações  não se alinham à construção  de escolas democráticas e inclusivas. Entendemos que premissas básicas, como a qualidade da educação, a relação interpessoal e geracional e a cultura da diversidade e da democracia são desrespeitadas por esse modelo de escola.

Não há evidência científica de que o modelo cívico-militar reduza a violência ou melhore a aprendizagem, conforme aponta o Fórum Permanente de Educação do Estado de Minas Gerais (FEPE-MG). Pelo contrário, as experiências educacionais exitosas não adotam esse formato. Então, a quem realmente interessa a militarização das escolas? Entendemos que esse projeto cívico-militar atende a interesses antidemocráticos e elitistas já que imprimem às escolas a cultura do medo e da ação autoritária.

Escolas são relações

As escolas não são apenas prédios, mas a relação constituída por pessoas em ambiente saudável de aprendizagem. Um encontro entre gerações marcado pelo estímulo ao desenvolvimento das capacidades críticas e criativas das crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Afinal, aprendemos em comunhão, por meio das trocas solidárias. A questão central, aqui, é que  aprendemos em colaboração e solidariedade, e não sob o estímulo do medo, da delação e da violência institucionalizada.

O processo de construção de conhecimentos é marcado por trocas solidárias e não apáticas, assim, as reflexões coletivas fazem parte do processo de ensino-aprendizagem. Essa é  outra premissa importante: educação é espaço de reflexões coletivas, respeitosas e criativas.

Contudo, a militarização das escolas mineiras já impacta negativamente nas relações solidárias e colaborativas nas escolas. Conforme documentado pelo FEPE-MG, há relatos preocupantes de tratamento agressivo por parte dos militares a alunos com transtornos mentais, o que contradiz frontalmente os princípios de uma escola democrática e inclusiva que busca a colaboração e o acolhimento. 

Nesse sentido, a qualificação inadequada dos militares, que não receberam formação pedagógica consistente, levanta sérias dúvidas sobre sua capacidade de contribuir para um ambiente de “trocas solidárias” e desenvolvimento educacional. 

Seleção social

Além disso, a seleção social do alunado, sempre pretendida pela corporação militar quando se apodera da escola pública, visando atrair estudantes de camadas sociais com maior renda mesmo em regiões de alta vulnerabilidade e estigmatizar ainda mais as pessoas já estigmatizadas pela pobreza e pelas violências, mina a própria ideia de uma comunidade escolar diversificada e inclusiva.

Lamentavelmente, a implementação das escolas cívico-militares em Minas Gerais parece caminhar na contramão de todas as premissas que embasam a existência de uma escola pública democrática e inclusiva. 

A visão punitivista das Escolas Cívico-Militares, que aborda problemas sociais como “casos de polícia” e não de políticas sociais abrangentes, dificulta a emergência de conflitos respeitosos e criativos, essenciais para a formação crítica e a autonomia. A motivação ideológica e partidária por trás da implementação dessas estruturas militarizadas de escolas, aliada à falta de debate democrático na adesão e à ausência de mudanças pedagógicas formais, demonstra uma imposição que restringe o espaço para o diálogo e a construção coletiva. 

Convidamos todas as pessoas a participarem ativamente da campanha contra a militarização das escolas mineiras, defendendo a escola como lugar de formação crítica para autonomia e liberdade, exatamente o oposto do que representa uma corporação militar. Consideramos que é urgente a revogação das resoluções estaduais que amparam a intervenção militar na gestão das escolas públicas.

Leonardo Machado Palhares é mestre em Educação (UFMG) e doutorando em Educação (PUC-MG),  professor EBTT no IFMG, e professor convidado no curso de Pós-Graduação em Alternativas para uma Nova Educação (UFPR). É também membro da Rede Brasileira de Educação em Direitos Humanos – Coordenação Minas Gerais, e  do Movimento de Alternativas para uma Nova Educação (MoANE).

Luciano Mendes  é doutor em Educação, professor titular aposentado da UFMG e membro da Rede Brasileira de Educação em Direitos Humanos – Coordenação Minas Gerais. 

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— Este é um artigo de opinião, a visão dos autores não necessariamente reflete a linha editorial do jornal.

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